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segunda-feira, 27 de maio de 2019

Espaço reduzido

Com menos conforto e bilhetes mais caros, brasileiros agora precisam utilizar bagagem de bordo menor. Franquia gratuita recém-aprovada atenua, mas não resolve os problemas do consumidor

Crédito: GABRIEL REIS
BARRADA Ao fazer conexão no Brasil, Glaucia Roganti teve de despachar a mala de mão e pagar R$ 120 (Crédito: GABRIEL REIS)
A volta da franquia gratuita para bagagens em voos nacionais, aprovada no Congresso na quarta dia 22, pode não ser suficiente para melhorar a vida dos passageiros. Além dos já conhecidos problemas enfrentados pelos usuários das companhias aéreas brasileiras, como atrasos e cancelamentos de voos, um novo contratempo surgiu no caminho de quem só deseja viajar com tranquilidade – e já paga caro por isso. Desde o mês passado, companhias brasileiras como Avianca, Gol e Latam, por meio da Associação Brasileira de Empresas Aéreas (ABEAR), padronizaram o tamanho da mala que pode ser levada a bordo, para 55 centímetros de altura, 35 de largura e 25 de profundidade. Sozinhos, esses números não dizem nada, mas basta circular pelos aeroportos para perceber que se traduzem em bastante transtorno para os passageiros.
Segunda-feira 20, às 11h30, o aeroporto de Congonhas (SP) estava cheio e a estudante Glaucia Roganti tinha acabado de pousar no Brasil, vinda da Califórnia. Ela se deparou com uma surpresa em sua conexão para Florianópolis: a mala cheia de presentes, ao seu alcance durante todo o trajeto internacional, teve de ser despachada por estar um pouco fora das especificações brasileiras. “Gastei R$ 1.700 nesta passagem e ainda tive de pagar R$ 120 para despachar a bagagem”, diz. A mala que ela levava custou R$ 400. Glaucia tem motivos para reclamar – ela e os demais brasileiros. O padrão de bagagem de mão adotado pelas companhias nacionais é menor que o estabelecido por diversas companhias internacionais (veja quadro).
CAMPANHA Funcionários da associação que representa as companhias áreas brasileiras orientam passageiros nos aeroportos (Crédito:GABRIEL REIS)
Problemas no desembarque
A professora universitária Luciana Badin quase perdeu o voo para o Rio de Janeiro. Ao chegar no embarque de Congonhas, que fica no andar superior ao despacho de malas, os dois agentes da ABEAR mediram sua bagagem de mão e verificaram que estava um pouco acima dos novos padrões. Luciana teve de sair correndo para despachá-la em outro andar. “Viajo direto com essa mala e nunca fui barrada. A qualidade dos voos piorou muito, não temos comodidade e a passagem está muito mais cara”, diz Luciana.
A publicidade tem de ser ostensiva, clara e adequada, para que nenhum passageiro seja surpreendido no momento da esteira do Raio-x”, diz Fernando Capez, diretor executivo do Procon-SP. Apesar dos sites das empresas aéreas registrarem a informação e a ABEAR manter alguns agentes no embarque dos aeroportos, a orientação aos passageiros ainda deixa a desejar. Na área de autoatendimento e balcões de check-in do aeroporto de Congonhas, por exemplo, os poucos modelos de papelão com as novas medidas estavam jogados em cantos, devido à falta de funcionários das companhias aéreas em quantidade suficiente para atender e medir as malas dos passageiros.
Lei a provada
Além da volta da franquia gratuita de bagagens em voos nacionais, a medida provisória recém-aprovada amplia a possibilidade de capital estrangeiro nas empresas aéreas no País. O objetivo é facilitar a concorrência e permitir que companhias estrangeiras passem a operar por aqui, inclusive as de baixo custo. A Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA) protestou contra a volta da franquia gratuita (companhias tinham a expectativa que o presidente Jair Bolsonaro vetasse esse item), dizendo que a nova norma vai encarecer as passagens, já que passariam a embutir os custos de despacho. Mas a promessa de que o preço das passagens aéreas diminuiria após a Resolução 400 da Agência Nacional de Avião Civil (Anac), que passou a valer em março de 2017, não foi cumprida. A norma deixou as companhias livres para cobrarem pelas bagagens despachadas, conforme regras de mercado. De acordo com a Anac, em 2018 o valor da passagem subiu em média 1% em relação ao ano anterior, já descontada a inflação. Dados do portal Consumidor.gov, o canal utilizado pela Anac para receber reclamação dos consumidores, mostram que em 2018 o registro de clientes com problemas com as malas cresceu 157%.

segunda-feira, 20 de maio de 2019

Todos pela educação

Milhões de estudantes, professores e pais lotam as ruas em todo o País, protestam contra o corte nas verbas na área da Educação e fazem balançar a estabilidade do governo

Crédito: WILTON JUNIOR
SÃO PAULO Mais de 250 mil pessoas ocuparam a avenida Paulista, do Masp à Fiesp, para protestar contra a redução de 30% nos recursos para a educação. No início da noite, saíram em passeata até a Assembleia Legislativa (Crédito:Mais de 250 mil pessoas ocuparam a avenida Paulista, do Masp à Fiesp, para protestar contra a redução de 30% nos recursos para a educação. No início da noite, saíram em passeata até a Assembleia Legislativa)
O governo teve na semana passada a dimensão da força social, política e numérica da moçada que o seu ministro da Educação, Abraham Weintraub, chamou de turma da “balbúrdia” – estudantes e professores universitários, primeiramente da Bahia, do Rio de Janeiro e de São Paulo, depois estendendo a qualificação mau educada, descabida e altamente ofensiva a todas as faculdades do País. Pois é, presidente Bolsonaro e ministro Weintraub, é notório que os senhores querem de toda forma transformar os órgãos de ensino em instituições de doutrinação ideológica, fazer delas o elogio do atraso e do reacionarismo de direita. Quem arrisca pagar para ver acaba vendo, e os senhores viram que os adeptos da “balbúrdia” lotaram ruas e avenidas de mais de duzentas e cinquenta cidades brasileiras, juntaram nelas milhões de pessoas entre estudantes, professores e pais, e tudo se deu pacificamente conforme requer a urbanidade e a cidadania – foi, de fato, a “balbúrdia” mais pacífica da história republicana brasileira, talvez só comparável ao momento em que os alunos do tradicionalíssimo Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, foram às ruas em 1956, na gestão de Juscelino Kubitschek, para apoiar a greve dos condutores de bonde e instalaram mesas de pingue-pongue sobre os trilhos – eles passavam o tempo todo jogando tranquilamente. Podemos também lembrar a calma e o pacifismo dos caras pintadas, que ajudaram a apear do poder o então presidente e hoje senador Fernando Collor, acusado à época de corrupção.
A praça é do povo
Bolsonaro e Weintraub, há outro ponto que merece destaque: a juventude e seus mestres seguiram o princípio de que a praça é do povo porque eles têm o mínimo de bom senso para se mostrarem completamente contrários, e com razão, ao corte de verbas na área do ensino, tesourada no dinheiro público hipocritamente chamada pelos senhores de contingenciamento. E, repita-se, tudo de forma ordeira, porque um tumulto aqui, outro ali, são fatos isolados, comuns em quaisquer aglomerações de gente – não acontece isso até com torcedores de futebol, presidente? Finalmente, podemos concluir que as manifestações que tomaram o dia e a noite da quarta-feira 15 traduzem a crença que os jovens ainda depositam no Brasil e, mais que isso, a vontade que possuem de estudar e de se apossarem de um universo cultural – talvez, quem sabe (não é ministro Weintraub?!), para nunca julgarem que um dos principais escritores da humanidade, o alemão Franz Kafka, chamava-se Franz Kafta, nome de uma iguaria árabe.
O governo não quer, é óbvio, que a rapaziada estude em faculdades com bons recursos (o que faz tempo que o País não possui), até porque isso leva a pensar – e quem pensa jamais apoiará atos como o tal “contigenciamento” e outros desmandos inconstitucionais e autoritários (que caminham para o patamar mais elevado do totalitarismo, na teoria política). “Bendito aquele que semeia/ livros, livros a mão cheia/ e faz o povo pensar/ o livro caindo na alma/ é germe que faz a palma/ é gota que faz o mar”, escreveu o poeta Castro Alves, justamente o que também ocupava as ruas com universitários baianos defendendo o ensino. Mas, se formarmos uma geração pensante, adeus bolsonarismo e sua ideologia que teima em apavorar o Brasil. “Ele, o presidente da República, Jair Bolsonaro, e também o ministro da Educação, Abraham Weintraub, só chegaram onde chegaram devido à ignorância e a falta de cultura no País”, muito bem disse Hugo Monteiro, professor titular de Bioquímica e Biologia Molecular da Unifesp. “Tudo o que consegui até aqui foi graças à educação pública. É um absurdo o que está acontecendo”, declarou Erika Vanoni, estudante de Design da USP. “A participação na manifestação é importante para a consciência política de milha filha”, afirmou Ana Gláucia Turco, que engrossou os protestos acompanhando a sua filha Luana, de onze anos. Como se vê, eis uma excelente e emblemática amostra, em três falas, do que foi o recente mar de gente contra a lipoaspiração feita nas verbas da Educação.
Jair Bolsonaro previra um “tsunami” para a semana passada, e o nosso presidente, que se julga enfronhado na previsão da meteorologia política, acertou: o tal vendaval veio contra a sua gestão e o arremedo de ministro que é Weintraub. O que se viu foi a união de todos pela Educação, o que se viu foi a estabilidade do governo ser profundamente desgastada, o que se viu foi a tal estabilidade balançar. Veio o “tsunami” da Educação, e ele vai continuar, precisa continuar, deve continuar: até porque, chamar os manifestantes de “imbecis” e de “idiotas”, chamar quem lotou as cidades de “massa de manobra”, como o fez Jair Bolsonaro nos EUA, é coisa de ditador, não de democrata – são palavras que ofendem toda uma Nação.
A continuação do movimento, cada vez mais, tenderá a aumentar. Com estudante na rua não se brinca, e atualmente o Planalto não mais é senhorio da possibilidade de recorrer à arbitrariedade e à exceção como vimos ao longo da ditadura militar. Tente-se jogar a cavalaria contra um único estudante hoje! É fazer isso e ser tocado imediatamente do Palácio. Se antes tínhamos que São Paulo e Rio de Janeiro capitaneavam os movimentos estudantis, dessa vez o crescimento ocorrerá, pelo que se viu na semana passada, proporcionalmente em todos os estados – ou seja, os 30% que o Ministério “Kaftiano” cortou deu azo à grande indigestão cultural em todo o território estudantil nacional. Somente em São Paulo mais de cinquenta cidades se mobilizaram, número similar se contabilizou no Rio de Janeiro. A região nordeste foi um espetáculo à parte tal a sua paralisação em faculdades e escolas. Nas demais regiões do País, o “tsumani” foi relativamente menos forte, mas, se pensarmos em pontuar o mapa do Brasil em todos os locais em que se deram protestos, o mapa inteiro ficará bem colorido. Claro que organizações sindicais (as oportunistas de sempre) e partidos políticos de oposição (hoje anêmicos) pegaram carona, mas isso não invalida e nem desclassifica em nada a onda de protestos. O governo vai usar esse discurso requentado e pronto, e nem vale a pena perder tempo comentando isso, deixemos essa bobagem para lá.
Importante, isso sim, é registrar que na mesma quarta-feira o ministro Weintraub esteve em audiência na Câmara dos Deputados, obedecendo (é dever, não favor) a convocação para explicar as razões que o levaram a promover o bloqueio de verbas em universidades – a sua intimação foi aprovada por trezentos e sete deputados, e também esse fato balança a estabilidade do governo. O começo de seu depoimento foi de chorar (se quiser, vale rir) com a presença do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que claramente se portou como quem esteve na Casa para dar uma força a Weintraub – embora, atualmente, seja do conhecimento geral que a força que ele tem se mostre tão firme como um prego enfiado na areia. O irmão de Abraham Weintraub, Arthur, correu a emprestar presencialmente solidariedade consanguínea. E, graça da graça, foi o deputado Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, ativo, atuante e aplaudindo freneticamente tudo que o ministro falava.
Os 30% que o Ministério da Educação “Kaftiano” cortou deu azo à grande indigestão cultural em todo o universo estudantil brasileiro
Foram seis horas de sabatina e arguição, nas quais Weintraub mostrou vontade de partir para o confronto logo nas primeiras rodadas de perguntas, num claro desrespeito ao Poder Legislativo, poder constituído por mandatos populares, enquanto o seu cargo é tão somente oriundo de nomeação e opção ideológica. Ele irritou-se quando lembraram que o seu rendimento escolar fora sempre medíocre (média de notas no patamar de 2,5), fato que, naturalmente, não o qualifica a ocupar o cargo que ocupa. Pode-se argumentar que Albert Einstein foi aluno péssimo e tornou-se um gênio, mas, convenhamos, nosso ministro está a léguas de distância de criar uma Teoria da Relatividade. Ele é absoluto! Isso sim, absoluto em todas as tolas e agressivas provocações que faz: “Fui bancário. Carteira assinada. Viu, azulzinha, não sei se vocês conhecem”, disparou Weintraub contra parlamentares. Não pegou nada bem. E a coisa piorou quando ele se gabou: “Não tenho passagem pela polícia” – isso, ministro, é obrigação de qualquer cidadão de bem, não é mérito algum. Falando em polícia, bem que Bolsonaro e Weintraub, que acham que até as suas sombras são esquerdistas, poderiam ler o antropólogo Darcy Ribeiro (não é difícil, ele escrevia claro). A tese de Darcy era a de que se não investíssemos na Educação, um dia faltaria dinheiro no País para construir cadeias, faltariam empregos e teríamos uma sociedade inculta. Pois bem, a turma da “balbúrdia” não quer ser bandida, não quer ficar desempregada e não quer ser burra.
Palavras erradas
As frases ofensivas e estapafúrdias que Jair Bolsonaro e Abraham Weintraub disseram nos últimos dias
Jair Bolsonaro
Marcos Corrêa/PR
“São uns idiotas úteis e imbecis que estão sendo usados como massa de manobra de uma minoria espertalhona que compõe o núcleo de muitas universidades federais”
“A maioria ali é militante, não tem nada na cabeça”
“Se perguntar quanto é sete vezes oito, não sabe”
“Se você perguntar a fórmula da água, não sabe, não sabe nada”
“O que foi feito no Brasil ontem: uma passeata ‘Lula Livre’, um bandido que está preso, condenado, cumprindo pena. Só vi faixa de ‘Lula livre’, mais nada”
Abraham Weintraub
Dida Sampaio
“Universidades que, em vez de procurar melhorar o desempenho acadêmico, estiverem fazendo balbúrdia, terão verbas reduzidas”
“Eu sofri um processo inquisitorial. Que eu saiba só a Gestapo fazia isso. Ou no livro do Kafta (sic) ou a Gestapo”, afirmou, trocando o nome do escritor Franz Kafka
“A gente está pedindo, simplesmente, três chocolatinhos e meio desses cem chocolates”, disse para explicar o contingenciamento de verbas para a Educação
“Fui bancário. Carteira assinada. Viu, azulzinha, não sei se vocês conhecem”, afirmou na Câmara dos Deputados,
quarta-feira 15. Um coro se formou com deputados gritando “demissão”
O ministro tuitou: “há uma série de fake news envolvendo meu nome, algumas calúnias nas quais eu insitaria (sic) a violência”. O certo é incitaria
Os três maiores protestos estudantis no Brasil
De 1968 até hoje, movimentos começaram espontâneos e apartidários

Colaborou Vicente Vilardaga

sexta-feira, 17 de maio de 2019

Presidente do Inep é demitido antes de completar um mês no cargo

Presidente do Inep é demitido antes de completar um mês no cargo
José Cruz/Agencia Brasil
O presidente do Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais (Inep), Elmer Vicenzi, foi demitido nesta quinta-feira, 16. Ele estava no cargo desde 29 de abril.
Vicenzi é ex-delegado da Polícia Federal e assumiu após a demissão de Marcus Vinicius Rodrigues, que foi o primeiro a assumir o posto na gestão de Jair Bolsonaro e caiu porque resolveu acabar com a avaliação de alfabetização.
O órgão é responsável pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Vicenzi estava em meio a uma disputa com integrantes da procuradoria do Ministério da Educação (MEC), órgão ao qual o Inep é ligado. Ele defendia a transparência dos dados produzidos pelo Inep, como avaliações e indicadores educacionais. havia divergências também em relação ao Enem.
Vicenzi é a primeira baixa do MEC na gestão de Abraham Weintraub. A pasta ficou marcada pelas dezenas de demissões quando Ricardo Vélez Rodríguez era o ministro.
O ex-presidente elogiava da forma como o Enem é atualmente e inutilizou o relatório de uma comissão que foi formada na gestão anterior para analisar a “adequação” das questões. A ideia era a de que o grupo identificasse questões que tivessem “teor ofensivo”. Ele chegou a declarar que os itens (como são chamadas as perguntas da prova) são bens públicos e não poderiam ser jogados fora.

quarta-feira, 15 de maio de 2019

Fachin decide levar ao plenário pedido para suspender inquérito das fake news

Crédito: Agência Brasil
O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu nesta terça-feira, 14, levar ao plenário da Corte um pedido de medida liminar do partido Rede Sustentabilidade para suspender o inquérito das fake news, instaurado pelo próprio Supremo para apurar ameaças e ofensas disparadas contra integrantes da Corte e seus familiares.
O inquérito foi aberto por iniciativa do presidente do STF, ministro Dias Toffoli, a quem cabe definir o que será julgado pelos 11 ministros nas sessões plenárias. Ainda não há previsão de quando o pedido da Rede será analisado pelos integrantes do Supremo.
As investigações são contestadas não só pela Rede, mas também pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que já pediu o arquivamento da apuração e teme que procuradores entrem na mira do inquérito. O inquérito das “fake news” já levou à censura da revista digital “Crusoé” e do site “O Antagonista”, além da realização de ações de busca e apreensão em endereços de pessoas que usaram as redes sociais para atacar as instituições.
“A instrução cabível para a apreciação da medida cautelar desta ADPF realizou-se. A presente matéria demanda julgamento colegiado por razões que lhe são inerentes, cabendo, pois, indicar à pauta de julgamento do Tribunal Pleno. Assim, peço dia para julgamento da medida cautelar desta ADPF”, escreveu Fachin.
O inquérito abalou a imagem do tribunal e levantou críticas dentro e fora do próprio STF. O ministro Marco Aurélio já afirmou que o inquérito é “insubsistente” e “se mostrou natimorto”. Um outro integrante da Corte disse reservadamente à reportagem que não tem a mínima ideia das decisões tomadas pelo relator do inquérito, ministro Alexandre de Moraes, já que o caso tramita sob sigilo.

terça-feira, 14 de maio de 2019

Justiça autoriza quebra de sigilo de Flávio Bolsonaro e Queiroz

Crédito: Wilson Dias/Agência Brasil
O juiz Flávio Nicolau, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, aceitou um pedido do Ministério Público do estado, e autorizou a quebra dos sigilos bancário e fiscal do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro, e de seu ex-assessor Fabrício Queiroz.
A informação foi revelada nesta segunda-feira (13) pelo jornal “O Globo”. Segundo o TJ-RJ, não serão divulgados mais detalhes porque o processo corre sob sigilo de justiça.
A quebra de sigilo bancário diz respeito ao período entre janeiro de 2007 e dezembro de 2018, enquanto que o fiscal será de 2008 a 2018. De acordo com Nicolau, a medida é “importante para a instrução do procedimento investigatório criminal” instaurado contra Flávio e Queiroz.
Além dos dois, o TJ-RJ autorizou a quebra de sigilo bancário de Fernanda Bolsonaro, esposa de Flávio, da mulher de Queiroz, Marcia, e de suas duas filhas, Nathalia e Evelyn. A decisão também inclui a empresa Bolsotini Chocolates e Café, do casal Bolsonaro. Em nota, o advogado de Queiroz, Paulo Klein, afirmou que a “família recebe a notícia com tranquilidade uma vez que seu sigilo bancário já havia sido quebrado e exposto por todos os meios de comunicação”. Já a assessoria de Flávio ainda não se pronunciou. O nome de Queiroz consta em um relatório do Coaf que aponta uma movimentação atípica de R$ 1,2 milhão em uma conta em nome do ex-assessor. O relatório integrou a investigação da Operação Furna da Onça, desdobramento da Lava Jato no Rio de Janeiro, que prendeu deputados estaduais no início de novembro de 2018.
O relatório também identificou um depósito de Queiroz no valor de R$ 24 mil na conta bancária da primeira-dama Michelle Bolsonaro. Na ocasião, o presidente Bolsonaro afirmou que o valor se referia a um empréstimo feito a Queiroz.
O ex-assessor trabalhou no gabinete do deputado estadual Flávio Bolsonaro (PSL), senador eleito pelo Rio de Janeiro. (ANSA)

segunda-feira, 13 de maio de 2019

Generais sob ataque

Da Virgínia, Olavo de Carvalho age como o imbecil, que ele mesmo consagrou em sua obra: desprovido de qualquer freio moral, o filósofo parte para uma briga pública contra os militares e atrapalha o País

Crédito:  Vivi Zanatta/Folhapress
CUIDADO Que ninguém se engane: Olavo, apesar de aparentemente louco, tem método (Crédito: Vivi Zanatta/Folhapress)
No livro “O imbecil coletivo”, escrito pelo filósofo Olavo de Carvalho há mais de 20 anos, ele acusa os intelectuais brasileiros de terem se corrompido pela “intoxicação ideológica” com a qual “imbecilizaram” seus leitores. Nos últimos dias, ao ultrapassar todos os limites do radicalismo e da insanidade na escalada de ataques sórdidos aos militares, o escritor e guru do governo Bolsonaro demonstra que o imbecil é outro. Ele mesmo. Engana-se quem pensa, no entanto, que o Eremita da Virgínia (EUA), onde reside e dispara seus tuítes desaforados, recheados de desrespeitos, chutes abaixo da linha da cintura e palavras de baixo calão, não age com método. Contraditório na essência, como quem veio para confundir, mas firme em seus propósitos, o ex-astrólogo comanda como um maestro distante, ao menos desde a campanha eleitoral, a ala ideológica do bolsonarismo. Com a ascensão de Jair Bolsonaro ao Planalto, seu séquito passou a ocupar postos estratégicos na Esplanada dos Ministérios, mas dois de seus apóstolos em especial justificam a astronômica influência que o ex-astrólogo exerce sobre o presidente da República: os filhos “02” e “03” do mandatário, Carlos e Eduardo Bolsonaro, respectivamente. Por intermédio deles, numa espécie de atalho afetivo, Olavo ocupa a mente e o coração daquele que foi eleito para comandar os destinos do País por 57 milhões de pessoas, com forte apoio do Exército, mas que, ao que parece, resolveu se deixar governar pelo exército de um homem só – o próprio Olavo.
Foi aliado ao mais aguerrido dos rebentos do presidente, o proverbial Carluxo, que o guru radicado em Richmond superou, na semana passada, as fronteiras da própria petulância – como se as diatribes perpetradas por ele até então já não fossem o bastante. Imbuído de uma volúpia devastadora, Olavo agiu sofregamente na clara tentativa de desmoralizar o núcleo de generais da Esplanada — e, o pior, livre e solto, desprovido de qualquer freio moral. Num dos mais baixos ataques já presenciados na história recente da República, classificou o general Santos Cruz, ministro da Secretaria de Governo, de “bosta engomada” e referiu-se ao ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas como um “doente preso em cadeira de rodas”, numa alusão à doença degenerativa sofrida pelo general, hoje assessor do GSI. O ideólogo do governo parte do pressuposto — e por isso se movimenta com método — de que a defesa das instituições desempenhada pelos militares os transforma num “inimigo” a ser eliminado no decorrer de um processo – ou de uma “cruzada” – que o olavismo chama de “revolução cultural conservadora”. Ocorre que as consequências para o governo das, ao mesmo tempo, indigentes e desenfreadas agressões que visam a atingir o seu objetivo final são imprevisíveis.
A crucificação de Cruz
Senão vejamos. Santos Cruz foi alçado a alvo preferencial nos últimos dias. Tudo começou com uma operação típica de criação de fake news para alvejá-lo: uma frase do ministro sobre o uso das redes sociais por grupos ideologicamente extremados foi tirada de contexto. Espalhou-se então que ele desejaria censurá-los. Não era verdade. Foi quando Olavo entrou em cena sentando o dedo no teclado contra o general: “Controlar a internet, Santos Cruz? Controle a sua boca, seu merda”, disse Olavo por meio do twitter no domingo 5. “A internet ‘livre’ foi o que trouxe Bolsonaro até à Presidência e graças a ela podemos divulgar o trabalho que o governo vem fazendo! Numa democracia, respeitar as liberdades não significa ficar de quatro para a imprensa, mas sempre permitir que exista a liberdade das mídias!”, emendou Carlos Bolsonaro. Quando o general retrucou, Olavo desceu ainda mais baixo. “Santos Cruz, não me meça por você mesmo. Você, sem seu cargo e sua farda, é um nada. Eu, pelado e esmagado sob uma jamanta, sou ainda o autor de livros que serão lidos por muito tempo após a minha morte”.
ALTO COMANDO As Forças Armadas querem que Bolsonaro feche a boca do ideólogo-guru e filhos (Crédito:Twitter Gen. Villas Boas)
Sob fogo cerrado, na noite de domingo, o próprio general foi tirar satisfação com o presidente. A conversa com Bolsonaro foi tensa e durou 1h30. Santos Cruz, conhecido por não medir as palavras, ameaçou deixar o governo. As ofensas ao colega de farda irritaram de tal maneira a caserna, que provocou uma reação em cadeia de comandantes de todas as armas. Indignado, um integrante militar admitiu em caráter reservado à ISTOÉ que, se não estivesse pensando no País, “pois somos o ponto de moderação disso tudo”, ele “já teria largado essa confusão e ido embora”. ISTOÉ apurou que o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), foi outro que cogitou desertar caso os petardos não cessassem. A ira dos militares contra Olavo ficou explícita também em dois instantes distintos. O Clube Militar, entidade representativa das Forças Armadas, promoveu um ato de desagravo aos generais, afirmando que eles foram atingidos pela “incontinência verbal que, impune, prospera inexplicavelmente em distintas esferas de poder”. Se isso não fosse suficiente, o ex-comandante geral do Exército, general Eduardo Villas Bôas, também saiu em sua defesa. Nas redes sociais, Villas Bôas afirmou: “Mais uma vez o sr.
Olavo de Carvalho, a partir de seu vazio existencial, derrama seus ataques aos militares e às Forças Armadas, demonstrando total falta de princípios básicos de educação. Verdadeiro Trotski de direita”. Foi nesse momento que Olavo o classificou “de um doente preso a uma cadeira de rodas”. Não havia como se rebaixar ainda mais na escala da degradação moral.
ORDEM UNIDA O coronel Sergio Paulo Muniz Costa, do Clube Militar: revolta contra a coação aos militares (Crédito:Divulgação)
Em meio à nova crise desnecessária, entre inúmeras em menos de seis meses de governo, restaria saber de que lado da trincheira estaria o presidente da República. A decisão jamais deveria representar uma escolha de Sofia para Bolsonaro. Afinal, de um lado está quem hoje faz a diferença no governo — os militares. Do outro, a vanguarda do atraso. É Olavo quem está por trás da maioria das políticas equivocadas, para não dizer destrambelhadas, da atual gestão. Como, por exemplo, a doutrina da alienação do MEC — baseada em cortes injustificáveis de recursos de universidades, no sufocamento do livre pensar e nos ataques às ciências humanas —, e a própria deletéria agenda internacional, levada a cabo pelo chanceler Ernesto Araújo, ancorada no fantasma do marxismo cultural, tese mais do que presente nas aulas online de Olavo. Para não falar também dos insultos cotidianos à diversidade, sustentados por uma ideologia carola que remonta há quase dois séculos.
Leo Correa

“Praticamente todas as crises que nós vivemos desde que o presidente Bolsonaro assumiu têm a participação do Olavo de Carvalho” General Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército
Infelizmente, porém, o presidente parece ter pego o bonde errado da história. Por mais que tente escamotear, não é difícil descobrir por quem o coração de Jair Bolsonaro bate mais forte e acelerado. As recentes atitudes do presidente consagram o olavismo como o cânone principal do governo. Por exemplo, o mandatário não moveu uma palha para defender seus auxiliares tratados piores do que esterco humano pelo filósofo. Ao contrário, em almoço com militares, quando muitos esperavam algum sinal de admoestação, Bolsonaro sugeriu que todos permanecessem em obsequioso silêncio. “Olavo é dono do seu nariz”, limitou-se a dizer. As razões do alinhamento quase que automático, pelo jeito, decorrem da gratidão do presidente pelo que considera uma primordial contribuição de Olavo na campanha eleitoral de 2018. Em mensagem postada no twitter na terça-feira 7, Bolsonaro atribuiu ao escritor o “trabalho contra a ideologia insana” dos governos anteriores. “Olavo tornou-se um ícone. Sua obra em muito contribuiu para que eu chegasse ao governo, sem o qual o PT teria retornado ao poder”. Assim, sem cargo ou estrelas no peito, o imbecil da Virgínia reina quase que soberano sobre todos os escalões do poder – e atrapalha o País. Até quando?

segunda-feira, 6 de maio de 2019

Licença para matar

Ao propor que produtores rurais atirem em invasores de terra e não sejam punidos, Jair Bolsonaro incentiva a formação de milícias no campo e a eleição de xerifes com poderes paramilitares

Crédito: Divulgação
TIRO, TIRO, TIRO Pelo projeto de Bolsonaro, se esse senhor matar um invasor ele não será punido: lei dos xerifes e dos milicianos (Crédito: Divulgação)
Movido por convicções pessoais, pela obsessão por armas de fogo e necessidade de agradar a bancada parlamentar ruralista, que tanto o apoiou para chegar ao poder, o presidente Jair Bolsonaro, em um espetáculo de populismo, conseguiu na segunda-feira 29 ultrapassar a fronteira do inimaginável no arcabouço jurídico do País. Na abertura da Agrishow, feira anual do agronegócio, na cidade paulista de Ribeirão Preto, Bolsonaro anunciou que enviará ao Congresso um projeto de lei isentando de punição penal o agricultor que atirar e matar invasor de terras, incluindo o crime no rol daquilo que tecnicamente se chama “excludente de ilicitude”. O presidente, por ignorância ou oportunismo, rasgou assim o Código Penal Brasileiro e a Constituição Federal. Mais: demonstrou total desprezo com as regras do Estado de Direito.
CONFRONTO Cena comum no meio rural: conflitos, mortes e impunidade (Crédito:Jorge Araújo/Folhapress)
É claro que ninguém e nenhum movimento social pode invadir propriedades particulares, isso é ponto pacífico e está previsto em lei. Da mesma forma, a lei também já assegura o direito à legítima defesa e à defesa da propriedade privada, estabelecendo regras claras para que tais atos sejam assim caracterizados. Já o salvo conduto que Bolsonaro está propondo é uma verdadeira licença para matar, dando às pessoas, individualmente, a prerrogativa que é do Estado quanto ao monopólio da repressão. Em palavras cruas, o presidente quer isentar de culpa o proprietário que meter bala em qualquer estranho que ele veja em sua propriedade.
O menino só queria uma fruta
Bolsonaro corroborou essa tese na terça-feira 30, afirmando que “tem de atirar e ponto final” em quem invadir, no meio rural ou urbano, território que não seja seu. Disse mais: “o cara entrou na sua casa à noite, você tem de descarregar quinze tiros nele”. Bolsonaro parece ter se esquecido de que “descarregar quinze tiros” deixa de ser, pela lei, legítima defesa, devido ao excesso de fúria e violência. Reforça-se, então, que a proposta bolsonarista é de fato a criação de uma licença para assassinar, loucura que o Congresso Nacional jamais aprovará. De volta ao meio rural, em relação ao qual nasceu a absurda ideia do presidente, esse revide desproporcional e brutal fulminaria desde invasores de terras, ainda que desarmados, até um moleque que se aventurasse a apanhar uma manga numa árvore alheia.
“Vamos então matar um imigrante, que cansado, faminto, doente e desnorteado acabe entrando numa propriedade para pedir auxílio”
Roberto Parentoni, Criminalista e presidente do Instituto Brasileiro do Direito de Defesa (Crédito:Divulgação)
“Vamos então matar um imigrante, que cansado, faminto, doente e desnorteado acabe entrando numa propriedade para pedir auxílio”, espanta-se Roberto Parentoni, um dos mais conceituados criminalistas do País e presidente do Instituto Brasileiro do Direito de Defesa (Ibradd). “Acho que o presidente deu essa declaração para causar controvérsia”. Tanto é assim que o próprio Bolsonaro avisou que seu projeto iria “dar o que falar”. Detalhe: colocar a vida humana em risco só para manter o nome na berlinda das polêmicas é, no mínimo, irresponsabilidade incompatível com a função de primeiro mandatário do País.
Nos EUA, diversos estados possuem condados, que nada mais são do que o agrupamento, na área civil e administrativa, de pelo menos três cidades. O condado elege um xerife que ficará responsável pela sua segurança, entre outras atribuições, e que tem permissão para matar em legítima defesa de si ou de terceiros. Claro que há abusos e xerifes fora da lei. O projeto idealizado por Bolsonaro, inevitavelmente, daria azo à formação de milícias rurais que também escolheriam o seu xerife e passariam a executar desafetos pessoais, protegidas pela não punibilidade — tudo seria camuflado como defesa da propriedade. Além disso, tais milícias estariam armadas e prontas para defender o presidente, podendo até funcionar como uma uma guarda paramilitar. Para o bem da república brasileira, o que falta de bom senso e discernimento a Bolsonaro sobra a Luiz Roberto Barcelos, presidente da Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados. “O presidente falou de algo que já está previsto em lei. Por mais que seja errado cometer invasões de terra, também não é certo o proprietário que reprimi-la de forma indevida não responder por isso. Não pode haver abusos, nem de um lado nem de outro”.
Colaborou André Vargas