Depois de identificar os quatro hackers que invadiram os celulares dos ministros Sergio Moro, Paulo Guedes e até do presidente Bolsonaro, para violar conversas sigilosas divulgadas pelo site The Intercept, a PF investiga agora quem possa tê-los financiado – ou seja, o mandante do crime
O chefe da quadrilha, Walter Delgatti Neto, o “Vermelho”, confessou à polícia ter hackeado os celulares de Moro e dos procuradores. Não só. Ele admitiu ter repassado os dados para o jornalista Glenn Greenwald, do site The Intercept Brasil. Um de seus comparsas, Gustavo Henrique Elias Santos, também preso, afirmou em depoimento à PF que Walter desejava vender os dados para o PT. O partido nega. A PF ainda não sabe dizer se a comercialização foi efetivada ou se era apenas a intenção do criminoso. O fato é que os hackers movimentaram mais de R$ 700 mil nos últimos meses, exatamente no período dos vazamentos. Os policiais querem agora ter provas cabais de quem efetivamente desembolsou o dinheiro. “Vermelho”, que virou colaborador da PF, é um dos que podem ajudar a esclarecer, mas os agentes não seguem apenas esse rastro.
Por ora, as conclusões das investigações são por si só alarmantes. A PF confirma que há fortes indícios de que Walter Delgatti Neto queria mesmo obter vantagens financeiras com a venda do produto dos vazamentos dos telefones de Moro. Essa é hoje a principal linha de investigação. Se ele comercializou, logo alguém bancou. Outros detalhes da organização criminosa desmantelada na “Operação Spoofing” em São Paulo, Araraquara e Ribeirão Preto, onde foram presos os hackers, reforçaram as suspeitas dos agentes federais. Com o casal Gustavo Santos e Suellem Priscila de Oliveira a PF apreendeu R$ 100 mil em dinheiro vivo. Além disso, o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) constatou que circulou R$ 627 mil em suas contas entre abril e junho, exatamente o período que corresponde às invasões. Ocorre que Gustavo, um DJ, e sua mulher não poderiam apresentar uma movimentação dessa magnitude. Somadas, suas rendas mensais não chegam a R$ 5 mil.
Os suspeitos justificaram a fortuna movimentada alegando, por meio de seus advogados, que trabalhavam com o mercado de bitcoin, onde obtiveram elevados lucros. Mesmo assim os ganhos financeiros são considerados atípicos, segundo a PF. A defesa de Gustavo Santos seguiu na mesma toada: assegurou que ele amealhou dinheiro com jogos de vídeo game e investiu os recursos em moedas virtuais. A versão sincronizada não colou. Pesa contra eles ainda o fato de todos, sem exceção, já terem experimentado dissabores na polícia. O mais encrencado deles, “Vermelho” foi preso em 2015 sob a acusação de falsidade ideológica, por utilizar documentos falsos e portar remédios controlados e receitas em nome de pacientes. Também responde por crime de estelionato. Isso reforça a tese da PF de que os hackers presos seriam apenas os executores do crime e não os mentores intelectuais da violação dos aparelhos das autoridades.
Golpe primário
Os criminosos pareciam bem instruídos. Ao todo, os investigadores detectaram que o grupo realizou 5,6 mil ligações dos aparelhos das vítimas. Foi o caso de Sergio Moro que recebeu telefonemas do seu próprio celular. O erro dos hackers, segundo os agentes da PF, foi terem cometido um “golpe primário”: usaram os computadores nos endereços de IPs registrados nas companhias de celular deles mesmos. “O Brasil não é para amadores”, disse um policial. A forma como os criminosos conseguiram entrar nos celulares das autoridades acendeu a luz de alerta. Em todos os casos, eles capturaram o código de acesso do Telegram Web para conseguir acessar as mensagens nos celulares dos hackeados, com a clonagem pura e simples dos aparelhos. Uma tática relativamente simples, mas que possibilitou aos hackers alcançarem os dados das autoridades. A dúvida é: como eles conseguiram os números dos telefones de Sergio Moro, de Paulo Guedes e até do presidente Bolsonaro? A resposta para essa pergunta pode ser o ponto-chave dos próximos passos da investigação. A uma conclusão os agentes já chegaram: houve um mandante.
Nenhum comentário:
Postar um comentário