Lula transforma ordem para se entregar num espetáculo deprimente de afronta à Justiça, ao refugiar-se num QG sindical em São Bernardo do Campo e montar um cordão humano para impedir o acesso da PF ao local. Tudo para adiar o inevitável: a ida para trás das grades
em fevereiro do ano passado. O evento religioso foi realizado na própria sede do sindicato. Só depois da missa, mais de 48h depois o petista cumpriria a determinação judicial – um acinte, por óbvio. O ex-presidente também se recusava a ir para Curitiba, onde a PF havia preparado uma sala especial, com todas as regalias, para que ele pudesse começar a cumprir a pena de 12,1 anos de prisão. Batia o pé para permanecer em São Paulo, numa cela especial do Estado Maior da PF. Um espetáculo deprimente e inconcebível.
Suéter à Morales
Aproveitava também para abraçar efusivamente os amigos, como o ex-chefe de gabinete de seu governo, Gilberto Carvalho, que também o estimulou a resistência. Em dado momento, sugeriu que os trabalhadores cercassem o sindicato para impedir a entrada dos policiais. Petistas mais radicais, como a senadora Gleisi Hoffmann, presidente do PT, e o senador Lindbergh Farias, pediam para ele não se render. Gleisi chegou a dizer que a PF teria que prender todos os trabalhadores, se quisesse enviar Lula para trás das grades. Mais um teatro de absurdos, com a conivência da Justiça, que até aquele momento parecia contemporizar.
Teatro dantesco
A tropa de choque
Violência petista
A ousadia petista chegou a sugerir a paralisação do País em protesto contra a prisão de seu maior líder. No Paraná, mais de 360 trechos de rodovias estaduais e federais foram bloqueados por militantes da CUT e do MST. Mas ficou por isso mesmo. As ações não prosperaram em outras regiões. O atentado mais insolente ocorreu na tarde de sexta-feira 6. Três ônibus da CUT pararam em frente ao prédio onde reside a presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, em Belo Horizonte, e jogaram tinta vermelha nas paredes externas, manchando a fachada. Conforme o coordenador do MST em Minas, Silvio Netto, o protesto foi uma forma de mostrar que os trabalhadores estavam dispostos a lutar. “Cármen Lúcia se tornou a inimiga número um dos mineiros”, disse. Segundo o movimento, cerca de 450 sem-terra participaram da manifestação.
Santificado por quê?
AFETO
Lula queria uma estátua em sua homenagem em São Bernardo. Enquanto
protelava o momento de sua prisão, recebeu apoio de admiradores
Cela especialSe as exigências de Lula forem frustradas e ele for levado para Curitiba, na sede da PF, o petista será acomodado numa sala especial com 15 metros quadrados e banheiro privativo, normalmente utilizada por agentes da PF de outros estados em missões no Paraná. No local, um beliche foi retirado para a colocação de uma mesa e cadeiras. Uma cama simples foi mantida. O cômodo não possui grades, tem janela voltada para o corredor e dispõe de câmeras internas, com monitoramento e guardas na porta por 24h.
Em Curitiba, Lula ficará completamente separado dos demais presos, que ocupam a carceragem no segundo andar. Na sede da PF, estão outros sete investigados da Lava Jato, entre eles o ex-ministro Antonio Palocci e o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro. Lá, o petista terá direito a duas horas diárias de banho de sol, em momento distinto dos demais presos. A intenção é realmente evitar que o ex-presidente tenha contato com outros detentos. Outra regalia: o presidiário não precisará usar uniforme, como é usual no sistema prisional, e comerá a mesma marmita servida na carceragem. As visitas dos advogados são autorizadas quase que diariamente. Eles poderão levar livros, roupas, cobertores e alguns alimentos. Tudo será inspecionado por policiais federais antes da entrada na sala especial. As visitas de parentes acontecerão às quartas-feiras. De acordo com o chefe da equipe de custódia e escolta da PF de Curitiba, Jorge Chastalo: “A sala é simples, mas tranquila e agradável, bastante humanizada”. Lula começa a experimentar uma vida de detento, mas com um tratamento bem melhor do que o dispensado aos demais. Uma tradição à brasileira.
A primeira prisão de Lula
Em 19 de abril de 1980, há exatos 38 anos , Lula, então líder sindical à frente de uma greve de metalúrgicos na região do ABC, foi preso e levado ao Dops, em São Paulo, onde ficou 31 dias detido por ter sido enquadrado na Lei de Segurança Nacional. Era o auge do regime militar. A greve organizada por ele, que presidia o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, onde desta vez se entrincheirou, tinha como objetivo a reposição salarial e redução de jornada. Ao desafiar os militares, o ex-presidente estava ciente de que poderia ir para prisão a qualquer momento. Chegou a ser orientado a deixar o País, mas não quis. Foi preso no 17º dia da paralisação. Na época, outras 12 pessoas do movimento sindical também foram presas. Lula chegou a ser condenado por “incitação à desobediência coletiva das leis”, mas, pouco tempo depois, o Superior Tribunal Militar (STM) anulou todo o processo. Em depoimento na Comissão Nacional da Verdade, em 2014, Lula afirmou que sua prisão foi uma motivação para a greve continuar. Na cadeia, Lula ficou sob a vigilância do então delegado Romeu Tuma, que nunca maltratou o ex-presidente no cárcere. Pelo contrário, o petista foi liberado até para ir ao enterro da mãe, Eurídice Ferreira de Mello, a dona Lindu.
O sexto presidente brasileiro preso
Na história do País, quatro ex-presidentes da República foram presos após deixar o cargo. Apenas Washington Luís foi detido em pleno exercício do mandato
Lula é o sexto ex-presidente brasileiro a ser preso e o primeiro a cumprir pena por um crime comum. Ao longo da história do País, quatro ex-presidentes foram condenados após deixar o cargo. O marechal Hermes da Fonseca (1855-1923) permaneceu encarcerado por seis meses por decisão do então presidente Epitácio Pessoa. Em 1932, durante a Revolução Constitucionalista, Arthur Bernardes (1875-1955) ficou detido por dois meses. Outras duas prisões de ex-presidentes aconteceram no período de exceção do regime militar. Juscelino Kubitschek (1902-1976) foi detido em 13 de dezembro de 1968, dia de emissão do Ato Institucional Número 5 (AI-5). Passou nove dias em um quartel e um mês em prisão domiciliar.
Jânio Quadros (1917-1992) também foi detido em 1968. Passou 120 dias encarcerado em Corumbá (MS). Apenas Washington Luís (1869-1957), da foto ao lado, foi detido ainda no exercício da função. Deposto pela Revolução de 1930 e forçado a abandonar o Palácio Guanabara, no Rio de Janeiro. Viveu anos no exílio antes de retornar ao País.
Nenhum comentário:
Postar um comentário