SELVA

SELVA

PÁTRIA

PÁTRIA

segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Que país é esse?

"Houve um momento em que a maioria de nós acreditou que a esperança tinha vencido o medo. Depois descobrimos que o cinismo tinha vencido a esperança. Agora o escárnio venceu o cinismo. Mas o crime não vencerá a Justiça." Cármen Lúcia, ministra do Supremo

Sérgio Pardellas e Marcelo Rocha

Assim como a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, o político abolicionista Joaquim Nabuco se notabilizou por ser uma figura pública à frente de seu tempo. Personificou a vanguarda, quando muitos ainda insistiam no atraso. Separados por mais de um século, eles se entrelaçaram na última semana pelos seus ideais. Como agora, no Império o Senado também se constituía numa Casa revisora cujas decisões e propósitos já eram alvo de sérios questionamentos. Dizia Nabuco: “Para o Senado, a política é uma distração. A função é outra. Os lutadores desinteressados que ele contém influem tanto no jogo da instituição como a bandeira de um navio nos movimentos da máquina”. Na manhã de quarta-feira 25, Carmen, numa de suas mais brilhantes intervenções na corte, encarnou Nabuco ao puxar o primeiro voto, na sequência do relatório do colega Teori Zavascki, pela manutenção na cadeia do senador Delcídio do Amaral (PT-MS). Num recado direto aos senadores, em especial parlamentares que se escoram no foro privilegiado para perpetrar crimes de toda a sorte, disparou: “Um aviso aos navegantes dessas águas turvas de corrupção e iniquidades: criminosos não passarão a navalha da desfaçatez e da confusão entre imunidade e impunidade e corrupção. Em nenhuma passagem, a Constituição Federal permite a impunidade de quem quer que seja. O crime não vencerá a Justiça”. A ministra foi além: “Houve um momento em que a maioria de nós brasileiros acreditou que a esperança tinha vencido o medo. Depois, nos deparamos com a ação penal 470 (do mensalão) e descobrimos que o cinismo venceu a esperança. E agora o escárnio venceu o cinismo”.
01.jpg
Na semana passada, a política brasileira produziu tal desfaçatez. Num País em que sempre achamos que já vimos de tudo ainda é possível se deparar com situações das mais implausíveis graças à ousadia ilimitada dos nossos políticos. Como poderíamos imaginar que um senador da República, líder do governo, em pleno exercício do mandado, iria tramar a fuga pelo ar ou pelo mar de um criminoso confesso preso na Lava Jato? E que um banqueiro seria acusado de financiar a operação? E que, na mesma semana, um pecuarista – amigo e dono de acesso livre a um ex-presidente da República – seria preso sob a suspeita de ser o laranja deste mesmo ex-presidente? E, para completar, o presidente da Câmara faria articulações em plena luz do dia para escolher como, quando e quem deveria conduzir uma investigação contra ele próprio? Realmente, e é triste constatar, vivemos em meio à esculhambação geral.
02.jpg
O senador e líder do governo Delcídio do Amaral foi preso na quarta-feira 25 depois de flagrado em tratativas para tirar do País Nestor Cerveró, que firmou na semana passada um acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal. Há suspeitas de que Delcídio seja destinatário de repasses ilegais. Seria ao menos US$ 1,5 milhão, segundo o ex-diretor da Pertrobras adiantou aos procuradores da República. Isso explicaria a articulação para tentar barrar a delação. A estratégia discutida por Delcídio envolvia pressionar o Supremo a libertar Cerveró da prisão. O senador teria procurado vários ministros. Disse a interlocutores que recorreria até ao vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP), autoridade com trânsito no tribunal. Nas horas seguintes, foram empreendidos movimentos para tornar a situação ainda mais inacreditável. O Senado teria de analisar em até 24 horas a decisão do Supremo. As provas, naquele momento, já se mostravam definitivas. Cabais. Mesmo assim, o Senado se comportou como uma autêntica casa de tolerância. Também envolvido na Lava Jato, o presidente Renan Calheiros (PMDB-AL) articulou para que a votação em plenário fosse secreta, o que aumentaria em muito as chances de Delcídio ser libertado no mesmo dia.
03.jpg
Durante a sessão, foi desfiado um rosário de impropérios. Em sua catilinária, o senador Jader Barbalho (PMDB-PA), político outrora afastado da Presidência da Casa por corrupção na Sudam e que aparece citado no áudio em que Delcídio articula a fuga de Cerveró, entabulou a defesa pelo voto fechado. No plenário do Senado, disse que “nenhum senador precisa ser fiscalizado pela opinião pública”. Outros o acompanharam. Mas, sob forte pressão da população, em sessão transmitida ao vivo pela TV Senado para todo o País, Renan foi derrotado duas vezes: na maneira como seriam proferidos os votos e no mérito da questão. Ao fim, numa votação aberta, os senadores evitaram o suicídio institucional. Mais uma vez de olho nos próprios umbigos, afinal estamos às vésperas de mais um ano eleitoral, eles mantiveram a prisão de Delcídio por 59 votos favoráveis, 13 contra e uma abstenção. Claro que não poderia faltar outra situação indigna do Parlamento. Apesar de o PT ter abandonado Delcídio à própria sorte em nota e da existência de provas irrefutáveis contra ele, o líder do partido no Senado, Humberto Costa (PE), orientou a bancada a votar pela soltura do senador petista. A orientação, embora na contramão dos interesses da sociedade, é mais coerente do que a nota emitida pela cúpula do PT. O partido faz de tudo para tentar se desvincular de Delcídio. Nos próximos dias, a Executiva Nacional da sigla pretende se reunir para deliberar sobre o caso. A tendência é a de que a expulsão do senador seja discutida. A tentativa de dissociá-lo do PT constitui-se, mais uma vez, de puro jogo de cena político. O senador, indiscutivelmente, era um dos principais quadros do PT. Não por acaso, era líder do governo no Senado e um dos parlamentares mais próximos da presidente Dilma Rousseff e de Lula. Às vésperas de sua prisão, Delcídio se reunia semanalmente com o ex-presidente e teria agendado um encontro com ele no dia seguinte à detencão. Por isso, sua prisão representa mais uma mácula, entre tantas outras acumuladas até aqui, na legenda da estrela rubra.
04.jpg
Quando o Senado discutia se endossava ou não a decisão do STF, o País ainda repercutia a 21ª fase da Lava-Jato, que, na véspera, levara para a cadeia o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Lula. Assim como Marcos Valério no Mensalão, Bumlai é apontado pelos procuradores da República como um operador do PT no Petrolão. Há indícios de que o pecuarista possa ter se tornado um laranja do próprio Lula. A questão é ainda mais grave. A cada operação da PF, os procuradores reforçam a constatação de que o ex-presidente petista possa ter sido o elo entre todos os escândalos. Por exemplo, Delcídio foi quem, ao lado do ex-governador do Mato Grosso do Sul, Zeca do PT, apresentou o ex-presidente a Bumlai.
De acordo com as investigações da Lava Jato, Bumlai teria articulado em 2004 um empréstimo, no valor de R$ 12 milhões, junto ao Banco Schahin para ajudar o PT financeiramente, então com dívidas de campanha. O empréstimo foi citado na delação premiada de Eduardo Musa, ex-gerente da Petrobras. Em contrapartida, o grupo Schahin teria sido compensado com um contrato com a Petrobras, no valor de US$ 1,6 bilhão, para operar o navio sonda Vitoria 10000. Musa disse ter ouvido essa versão do próprio Cerveró. A defesa do empresário alega que o emprestimo junto ao Schahin foi contraído para ser usado em negócios pecuários. Não é o que entendem as autoridades brasileiras. Em fevereiro deste ano, ISTOÉ teve acesso com exclusividade a relatório do Banco Central demonstrando que a versão de Bumlai não pára em pé. O documento afirma que o pecuarista foi beneficiado com uma operação liberada de forma irregular “sem a utilização de critérios consistentes e verificáveis”. Para liberar a bolada, o Schahin burlou normas e incorreu em seis tipos de infrações diferentes. O documento está anexado ao inquérito da Operação Passe Livre e reforça denúncia do empresário Marcos Valério, o operador do mensalão, feita em 2012 ao MPF. Valério afirmou que o pecuarista intermediou operação para comprar o silêncio do empresário de transportes Ronan Maria Pinto. O empresário estaria ameaçando envolver o ex-presidente Lula, e os ex-ministros José Dirceu e Gilberto Carvalho no assassinato do então prefeito de Santo André Celso Daniel.
05.jpg
Na ocasião, Valério tentava um acordo de delação premiada. Não obteve. Porém, nos últimos dias, a Receita Federal colheu indícios de que parte dos valores do empréstimo do Schahin a Bumlai pode mesmo ter sido direcionada a Ronan. Ele teria adquirido, em 2004, 60% das ações do Diário do Grande ABC S/A no valor de R$ 6,9 milhões. Para isso, recorreu a empréstimos e assumiu dívidas de terceiros junto às empresas das quais era sócio, a Rotedali Serviços e Limpeza Urbana Ltda. e a Expresso Nova Santo André. Tais dívidas ficaram sem quitação durante nove anos, conforme revelaram suas declarações. “No contexto, a suspeita levantada pela Receita é a de que esses empréstimos não teriam sido reais, mas apenas “teriam servido, em tese, para dissimular a real origem de recursos utilizados na aquisição das ações”, descreveu o juiz Sérgio Moro no decreto de prisão de Bumlai. Ao discorrer sobre esta nova fase da Lava Jato, o procurador Carlos Fernando Lima, da Lava Jato, afirmou que há indícios de que o ex-ministro José Dirceu e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares atuaram para ajudar na liberação do empréstimo do Schahin a Bumlai. Em comum, entre estes três personagens, há o fato de todos terem sido ou serem de alguma forma muito próximos ao ex-presidente Lula.
Na quinta-feira 26, o petista, cujos amigos tombaram um a um (leia quadro na pág. 42), foi instado, durante o almoço na sede da CUT, em São Paulo, a comentar a prisão de Delcídio. Ao que ele respondeu: “Foi uma grande burrada. Uma coisa de imbecil”. O ex-presidente disse ainda ter ficado surpreso quando soube dos detalhes da gravação que levou o senador à cadeia. Para Lula, o senador é um político experiente, sofisticado, e não poderia ter se deixado gravar por um smartphone de forma simples, como feito por Bernardo Cerveró, filho do ex-diretor da Petrobras. Na avaliação do ex-presidente, no momento em que o governo parecia ter ganhado um bom fôlego, o episódio faz com que a base aliada a Dilma no Congresso volte a ficar combalida. Ao tomar conhecimento das críticas de Lula, enquanto prestava depoimento à PF, Delcídio ficou descontrolado a ponto de interromper a oitiva. Em seguida, passou a negociar uma delação com a Polícia Federal.
Foi nesse clima surreal que a construtora Andrade Gutierrez resolveu na quinta-feira 26 também assinar um acordo. Após aceitar pagar a maior multa da Lava Jato, cerca de R$ 1 bilhão, admitiu o repasse de propinas em obras da Copa do Mundo, da Petrobras, da usina de Angra 3, Belo Monte e da Ferrovia Norte-Sul.
O temor do Planalto, agora, é o retorno à baila da agenda do impeachment. Se aqui estivesse, Joaquim Nabuco certamente repetiria suas palavras proferidas há pouco mais de um século, em meio às discussões sobre a abolição da escravatura e o fim da monarquia. Num ambiente de total esculhambação, “necessitamos de uma reforma de nós mesmos, do nosso caráter, do nosso patriotismo e do sentimento de responsabilidade cívica”.
Fotos: Paulo Lisboa/Folhapress; Alan Marques/Folhapress; Luis Macedo/Câmara dos Deputados

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

PT abandona Delcídio. Renan chama decisão de 'covarde'

Por: Felipe Frazão, de Brasília
O senador Delcídio Amaral (PT), em 2005
O senador Delcídio Amaral (PT), em 2005(Ueslei Marcelino/Reuters)
O Partido dos Trabalhadores apressou-se nesta quarta-feira a abandonar o senador Delcídio Amaral (PT-MS), líder da presidente Dilma Rousseff no Senado preso por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Em nota assinada pelo presidente da legenda, Rui Falcão, a sigla afirma que "não deve solidariedade" ao senador. O presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), classificou o documento como "oportunista e covarde".
A postura do PT em relação a Delcídio contrasta com a histórica proteção do partido a seus próceres envolvidos em esquemas de corrupção: a sigla aclama mensaleiros condenados como "guerreiros do povo brasileiro" e trata seus quadros envolvidos no petrolão como "vítimas".
Renan criticou a postura da direção nacional do PT durante a votação sobre manter ou revogar a prisão do senador. "A nota do Partido dos Trabalhadores é intempestiva, oportunista e covarde", disse, sob aplausos, no plenário. Para o presidente do Senado, o partido se precipitou e pré-julgou Delcídio.
O presidente nacional do PT divulgou um posicionamento em que indica a possibilidade de punição contra o senador, além de dizer que os atos dele não tem relação com atividades partidárias. "O PT não deve solidariedade a Delcídio", diz o texto. O líder do PT, Humberto Costa (PE), reagiu ao comentário de Renan. "A nota divulgada pelo presidente do nosso partido não foi objeto de discussão com a bancada. Ela não reflete necessariamente a posição da bancada", disse.
Parlamentares da base de Dilma e da oposição também criticaram a nota da cúpula petista. "O tesoureiro do PT está preso e ele nunca abriu a boca para falar. O presidente do PT é um covarde. Rui Falcão, você é um covarde.", disse Omar Aziz (PSD-AM), em referência a João Vaccari Neto, já condenado a quinze anos de prisão pelo juiz Sergio Moro. "O PT foi incapaz de perceber o valor parlamentar de Delcídio. Ele teve coragem de assumir a liderança de governo que os colegas não quiseram", disse o senador Aloísio Nunes Ferreira (PSDB-SP).

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Janot fala em ‘componente diabólico’ para travar Lava Jato

Procurador-geral da República destacou a atuação do chefe de gabinete de Delcídio do Amaral, que tentou destruir as gravações feitas por Bernardo Cerveró, filho do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró

Por: Laryssa Borges, de Brasília
Procurador-geral da República, Rodrigo Janot em sessão plenária
Procurador-geral da República, Rodrigo Janot(Fellipe Sampaio/SCO/STF/Divulgação)
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse, ao pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) a prisão cautelar do líder do governo no Senado Delcídio Amaral (PT-MS), que a atuação do parlamentar, do banqueiro André Esteves, do BTG Pactual, e do advogado Edson Ribeiro para inviabilizar o acordo de delação premiada do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró revela um "componente diabólico" para tentar travar as investigações da Operação Lava Jato. Sucessivas reuniões gravadas pelo filho de Cerveró, Bernardo, mostram a atuação de Delcídio, do chefe de gabinete Diogo Ferreira, do advogado Edson Ribeiro e a invocação do nome de Esteves para impedir a delação de Cerveró.
Em troca do silêncio do ex-dirigente da Petrobras, a família de Cerveró receberia uma mesada de 50.000 reais. Se a delação fosse assinada, como acabou ocorrendo, a negociação era para que os nomes de Delcídio Amaral e André Esteves não fossem citados pelo delator. "Há aí componente diabólico de embaraço à investigação: ultimado o acordo financeiro, Nestor Cerveró passaria a enfrentar dificuldades praticamente intransponíveis para conciliar-se com a verdade. Seu silêncio compraria o sustento de sua família, em evocação eloquente de práticas tipicamente mafiosas", disse Janot. "Ficaria preservado, assim, à guisa de chantagem continuada, o silêncio de Nestor Cerveró, que passaria a enfrentar dificuldades praticamente intransponíveis para conciliar-se com a verdade. Seu silêncio compraria o sustento de sua família, em evocação eloquente de práticas tipicamente mafiosas", completou ele.

O chefe do Ministério Público detalha ainda a atuação de Diogo Ferreira, chefe de gabinete de Delcídio, que chegou a desconfiar de um "chaveiro-gravador" usado pelo filho de Cerveró para monitorar as rodadas de negociatas e, por precaução, tomou a iniciativa para evitar que fossem produzidas provas contra o senador. Quando suspeitou da presença do "chaveiro-gravador" em uma das reuniões que discutiam como embarreirar a delação de Cerveró, Diogo aumentou o volume de uma televisão próxima. Gravadores reservas, porém, estavam acionados para registrar a atuação do grupo.
"É induvidoso que Diogo Ferreira agiu para tentar neutralizar a possibilidade de Bernardo Cerveró gravar a conversa. Esse padrão de conduta mostra com clareza, por sua vez, que Diogo Ferreira está disposto a proteger o Senador Delcídio Amaral independentemente da coloração de sua conduta, inclusive tomando a iniciativa de evitar a produção de provas em desfavor do congressista", relatou Janot. "É um comportamento - digno de um integrante de máfia - de Diogo Ferreira", disse.
Na avaliação do Ministério Público, Delcídio Amaral atuou de forma "espúria" por ter interesse pessoal e específico em embaraçar a Operação Lava Jato. "Isso sinaliza, por sua vez, que o senador Delcídio Amaral, atual líder do governo no Senado, não medirá esforços para embaraçar o desenvolvimento das investigações encartadas na Operação Lava Jato. Ele deixa transparecer que explorará o prestígio do cargo que ocupa para exercer influência sobre altas autoridades da República", disse Rodrigo Janot, que ainda condena a atuação de Delcídio como um dos mentores de uma possível fuga de Cerveró.
O líder do governo no Senado, preso cautelarmente na manhã desta quarta-feira por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), prometeu atuar junto à Corte e aos peemedebistas Michel Temer e Renan Calheiros para que o ex-diretor da Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró fosse colocado em liberdade. Cerveró, que foi indicado pelo próprio Delcídio para o cargo de cúpula na petroleira, está preso desde o início do ano por suspeitas de receber propina e atuar em fraudes em contratos na estatal.
Segundo conversa gravada por Bernardo Cerveró, filho do ex-dirigente da Petrobras, Delcídio disse que ministros do STF poderiam ser influenciados em prol da soltura de Cerveró. Entre eles estariam os ministros Edson Fachin, José Antonio Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Teori Zavascki. Na conversa, o senador também prometeu influência do vice Michel Temer e de Renan Calheiros em benefício do ex-diretor da Petrobras.

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Lava Jato mira empréstimos do BNDES a Bumlai. E não descarta investigar Lula

Força-tarefa apura contratos operados pelo amigo do ex-presidente com instituições financeiras. Investigadores querem saber se houve interferência do Planalto

Por: Laryssa Borges, de Brasília
DINHEIRO SUJO - O empreiteiro apresentou extratos de movimentação de uma conta criada na Suíça para pagar propina. De lá, segundo ele, saíram 2,4 milhões de reais para a campanha de Lula
Ex-presidente Lula pode ser investigado pela força-tarefa da Lava Jato por ter beneficiado o amigo e pecuarista José Carlos Bumlai em contratos com a administração pública(Cristiano Mariz/VEJA)
A Polícia Federal e a força-tarefa da Lava Jato devem investigar se o governo do ex-presidente Lula beneficiou o pecuarista José Carlos Bumlai em contratos com a administração pública. Embora Lula não seja formalmente alvo de investigação, ele foi frequentemente citado pelo próprio Bumlai como a autoridade que poderia destravar impasses - desde a manutenção do ex-diretor Nestor Cerveró na Petrobras até a confirmação de um contrato de sondas pelo grupo Schahin. Por ora, a ofensiva dos investigadores deve se focar em empréstimos de instituições financeiras, como o BNDES, utilizados para o esquema de corrupção, mas a PF não descarta apurar se o Palácio do Planalto, sob a gestão Lula, interferiu em contratos operados por Bumlai.
A São Fernando Açúcar e Álcool Ltda. recebeu, em 2005, empréstimo de 64,66 milhões de reais do BNDES. Em 2008, novo repasse. Desta vez de 388 milhões de reais. A companhia entrou em recuperação judicial em 2013 com uma dívida de 1,2 bilhão de reais, incluindo débito de 300 milhões de reais resultado de empréstimos do banco de fomento. Em julho de 2012, a São Fernando Energia I Ltda., também de Bumlai, recebeu empréstimo de mais de 100 milhões de reais do BNDES, mesmo que na época a empresa contasse com apenas sete funcionários.
Em sua delação premiada, o lobista Fernando Baiano disse que, na tentativa de emplacar um contrato entre a empresa OSX, do ex-bilionário Eike Batista, com a Sete Brasil, empresa gestada no governo Lula para construir as sondas de exploração do petróleo do pré-sal, o empresário José Carlos Bumlai foi acionado para interceder junto a Lula. Em troca, o pecuarista teria recebido comissão de 2 milhões de reais, que acabaram repassados a uma nora do ex-presidente para a quitação da dívida de um imóvel.
"Em relação ao ex-presidente Lula, são citações ainda sem qualquer conteúdo de prova efetiva. É muito comum que o nome seja usado sem autorização. Pode ser esse o caso, mas tem que apurar, ver se houve realmente alguma interferência do Palácio do Planalto nesses contratos", defendeu hoje o delegado Igor Romário de Paula, que atua na Lava Jato.
Segundo o procurador Diogo Castor de Mattos, a força-tarefa da Lava Jato já está investigando "dezenas de milhões de reais" em contratos suspeitos, incluindo documentos envolvendo as empresas São Fernando Açúcar e Álcool e São Fernando Energia, administradas pelos filhos de José Carlos Bumlai, e do frigorífico Bertin. De acordo com depoimento do ex-presidente do Banco Schahin, Sandro Tordin, os petistas Delúbio Soares e José Dirceu, condenados no julgamento do mensalão, intercederam para que a instituição financeira liberasse um empréstimo de cerca de 12 milhões de reais a Bumlai. Esse empréstimo, dizem os investigadores, teria sido fraudado para dar ares de veracidade ao repasse de recursos que quitariam dívidas de campanha do ex-presidente Lula em 2002. Ao final, com o dinheiro na conta de Bumlai, os valores foram transferidos para contas do Frigorífico Bertin.
"Existem outros empréstimos de instituições financeiras que estão sob investigação e somam quantias de dezenas de milhões de reais. Há suspeita de outros empréstimos. Caso haja realmente esse vínculo [com esquema de corrupção na Petrobras], tomaremos as medidas cabíveis em relação aos investigados", disse Mattos.

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Dilma corta até salário, mas não o helicóptero

Presidente gasta cerca de 1.000 reais toda vez que usa o veículo aéreo para fazer um percurso que, de carro, duraria menos de 25 minutos sem trânsito

A presidente Dilma Rousseff no helicóptero com o neto Gabriel, após deixar o Palácio da Alvorada, com destino à base aérea de Brasília, de onde segue para a Base Naval de Aratu, na Bahia, onde dencansa por alguns dias
A presidente Dilma Rousseff no helicóptero com o neto Gabriel(Sérgio Lima/Folhapress)
Apesar de ter proibido a viagem em primeira classe para ministros e determinado que eles compartilhem voos para economizar, além de reduzir os salários do primeiro escalão do governo como sinal de "corte na própria carne" em tempos de ajuste fiscal, a presidente Dilma Rousseff não dispensou o uso do helicóptero VH-35 para se deslocar entre a Base Aérea de Brasília e o Palácio da Alvorada, residência oficial da chefe do Executivo.
Segundo o Google Maps, os 21,6 quilômetros entre os dois pontos podem ser percorridos de carro em 23 minutos, quando não há engarrafamentos. De helicóptero, são 5 minutos de ida e 5 de volta.
O Planalto não divulga o gasto da operação, alegando questões de "segurança" da presidente da República. Mas, segundo consulta feita às empresas de táxi aéreo, tomando por base a versão civil do helicóptero presidencial - o EC-135, semelhante ao VH-35 -, a hora voada custa de 12.000 a 13.000 reais. Ou seja, proporcionalmente, cada viagem de cinco minutos feita pela presidente entre o Alvorada e a Base Aérea custaria cerca de 1.000 reais.
O uso frequente do helicóptero por Dilma, em tempos de verbas contingenciadas, está incomodando militares da Força Aérea, porque o desembolso dos gastos dos voos é feito na conta da FAB, que, a exemplo de todas as demais pastas, sofreu drástico corte de verbas. É fato que os pilotos dos helicópteros precisam cumprir as horas de voos mínimas previstas para se capacitar. Mas a queixa é que o uso intenso do helicóptero está consumindo recursos que poderiam ser distribuídos para treinamento dos pilotos nos demais equipamentos da Aeronáutica, e não só nesse modelo.
O ajuste fiscal foi anunciado em 14 de setembro. De lá para cá, a presidente usou o helicóptero 28 vezes para ir ou voltar da base. Como cada trecho custaria em torno de 1.000 reais, nos últimos dois meses teriam sido gastos 28.000 reais para percorrer um trajeto que poderia ser feito de carro, dado que Dilma tem batedores à disposição.
Na madrugada de segunda para terça da semana passada, por exemplo, quando desembarcou na Base Aérea de Brasília, por volta das duas horas da madrugada, chegando da viagem à Turquia, mesmo sem o menor trânsito ou qualquer problema que impedisse o seu rápido deslocamento até o Palácio da Alvorada, a presidente fez o curto trajeto de helicóptero.
Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso, antecessores de Dilma, também usaram os helicópteros da FAB entre o Alvorada e a Base Aérea, mas em menor frequência. Em 2004, um ano depois de deixar o poder, FHC, em entrevista, disse que sentia falta de duas coisas de quando era presidente: "do helicóptero, um instrumento de trabalho extraordinário" e "da piscina do Alvorada".
Procurada, a assessoria de imprensa do Planalto informou que não se manifestaria, já que o assunto envolve a segurança da presidente.

(Com Estadão Conteúdo)

sábado, 21 de novembro de 2015

Conselho de Segurança da ONU autoriza 'todas as medidas necessárias' contra EI

Estado Islâmico "constitui uma ameaça global e sem precedentes à paz e à segurança internacional", diz o texto, endossado 15 membros do conselho

Soldados preparam um avião-caça Rafale no porta-aviões Charles de Gaulle, em Toulon, sul da França
Soldados preparam um avião-caça Rafale no porta-aviões Charles de Gaulle, em Toulon, sul da França(Anne-Christine Poujoulat/AFP)
O Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas aprovou nesta sexta-feira uma resolução que autoriza "todas as medidas necessárias" no combate ao grupo Estado Islâmico (EI), uma semana após os atentados que deixaram 130 mortos em Paris. O texto pede aos governos que "tomem todas as medidas necessárias, de acordo com as leis internacionais, e em particular com a Carta da ONU" e os insta a "redobrar esforços e coordenar suas iniciativas a fim de prevenir e de frear os atos terroristas cometidos especificamente pelo EI, assim como por outros grupos extremistas associados à Al Qaeda".
Os 15 membros do Conselho de Segurança endossaram de forma unânime o texto. Segundo a resolução do Conselho de Segurança, o Estado Islâmico "constitui uma ameaça global e sem precedentes à paz e à segurança internacional".
Esboçada pela França, a resolução não concede uma autorização expressa para a ação militar contra o EI nem invoca o capítulo sétimo da carta da ONU, que prevê o uso da força. Entretanto, o documento pode ser entendido como um apoio político à campanha contra os jihadistas na Síria e no Iraque, que foi intensificada após os atentados de Paris, reivindicados pelo EI. Os ataques franceses aéreos na Síria têm como base legal o direito de um Estado à legítima defesa, o que está previsto na carta da ONU.
O ministro francês das Relações Exteriores, Laurent Fabius, saudou em comunicado o texto que "pede a amplificação da luta contra o Daech", acrônimo do EI em árabe. "Agora o que importa é que todos os Estados se envolvam concretamente neste combate, seja pela ação militar, pela busca de soluções políticas ou pela luta contra o financiamento ao terrorismo."
(Com AFP e Reuters)

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Congresso derruba dois vetos presidenciais e mantém outros 12

Vetos a reajuste do Judiciário e de aposentadorias foram mantidos.
Congresso derrubou veto a emissão de recibo de papel em urna eletrônica.

Nathalia Passarinho e Laís Alegretti Do G1, em Brasília
Deputados e senadores participam de sesssão do Congresso Nacional para votar vetos (Foto: Ananda Borges/Câmara dos Deputados)Deputados e senadores participam de sesssão do Congresso Nacional para votar vetos (Foto: Ananda Borges/Câmara dos Deputados)
Após mais de 10 horas de sessão, o Congresso Nacional concluiu nesta quarta-feira (18) a votação, iniciada nesta terça (17), dos vetos da presidente Dilma Rousseff a pautas-bomba. Os parlamentares mantiveram 12 vetos e derrubaram dois. Os vetos atingiam 13 projetos, entre os quais o da reforma política, que tinha dois vetos a trechos diferentes – um foi mantido e o outro derrubado pelos parlamentares.

Entre os vetos que foram mantidos na sessão desta quarta está o que excluiu a extensão da política de reajuste real do salário mínimo para todos os aposentados e pensionistas. Essa proposta geraria, segundo o Ministério do Planejamento, gasto de R$ 11 bilhões, nos próximos quatro anos.
Os deputados e senadores derrubaram, porém, veto ao trecho da reforma política que previa a impressão, pela urna eletrônica, do registro do voto do eleitor. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a impressão vai gerar um gasto anual de R$ 1,8 bilhão.

A análise e manutenção dos vetos que trancavam a pauta do Congresso era reivindicada pelo governo para que o país pudesse dar um “recado positivo” ao mercado, diante da crise política e econômica. Vários dispositivos excluídos pela presidente Dilma gerariam gastos ao país.
Vetos mantidos
Entre esta terça (17) e quarta (18), o Congresso Nacional analisou 13 vetos, sendo que sete deles não eram alvo de polêmica e foram mantidos em votação conjunta. O que gerou mais discussão foi o que derrubava reajuste de até 73% para servidores do Judiciário.

O custo da correção salarial seria de R$ 5,3 bilhões no ano que vem, de acordo com cálculo do Ministério do Planejamento. Em quatro anos, até 2019, o custo total seria de R$ 36,2 bilhões.

Na sessão desta quarta (18), o Congresso manteve veto que excluiu a extensão da política de reajuste real do salário mínimo para todos os aposentados e pensionistas. A regra de aumento do mínimo consiste na variação do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos anteriores, mais a inflação.
O governo batalhava para manter o veto com o argumento de que a extensão das correções para aposentadorias geraria um gasto adicional de R$ 300 milhões em 2016. Nos próximos quatro anos, a despesa somaria R$ 11 bilhões, de acordo com dados do Ministério do Planejamento.
Outro veto preservado impede a aplicação de alíquota diferenciada sobre a folha de pagamento do setor de vestuário. O projeto aprovado pelos deputados previa alíquota de 1,5% sobre o faturamento. Com o veto, a alíquota passa a ser de 2,5%. Os deputados mantiveram esse veto, por entender que reduziria a arrecadação do governo.

Também foi mantido veto da presidente a trecho da reforma política que permitia a doação de empresas a partidos políticos. O veto de Dilma atendeu a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), do dia 17 de setembro, de declarar inconstitucional o financiamento empresarial de campanha.
A doação de pessoas físicas continua permitida, num limite de até 10% de seu rendimento no ano anterior à eleição. O artigo do projeto de reforma política que trata de doação de empresas e que teve o veto mantido diz o seguinte: "Doações e contribuições de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais poderão ser feitas para os partidos políticos a partir do registro dos comitês financeiros dos partidos ou coligações". Ao justificar o veto, a presidente Dilma Rousseff se baseou na decisão Supremo. "A possibilidade de doações e contribuições por pessoas jurídicas a partidos políticos e campanhas eleitorais, que seriam regulamentadas por esses dispositivos, confrontaria a igualdade política e os princípios republicano e democrático, como decidiu o Supremo Tribunal Federal - STF", diz a justificativa.

Os parlamentares preservaram ainda veto ao trecho de um projeto que isentava empreendimentos localizados no Nordeste e da Amazônia do Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante (AFRMM).

Vetos derrubados
O primeiro veto a ser derrubado pelo Congresso na sessão desta quarta extinguia o prazo de 15 dias para que os bancos repassem 70% dos valores de depósitos judiciais aos estados, municípios e ao Distrito Federal.

Esse prazo de 15 dias constava da proposta inicial aprovada pelo Legislativo, mas acabou vetado pelo governo sob o argumento de que a nova lei não previa um período para que as instituições financeiras desenvolvessem a tecnologia necessária para implementar as regras, “o que levaria a severa dificuldade de sua concretização”.

Os deputados depois rejeitaram veto de Dilma a trecho do projeto da reforma política que previa a impressão, pela urna eletrônica, do registro do voto do eleitor. Segundo o projeto, esse comprovante seria depositado em um local lacrado após a confirmação pelo eleitor de que a impressão estava correta. Ao justificar o veto, Dilma argumentou que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) manifestou-se contrariamente à sanção do item porque isso geria "altos custos", com impacto de R$ 1,8 bilhão.

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Lava Jato chega à 20ª fase e mira fraudes em Pasadena e Abreu e Lima

O foco das investigações agora são ex-funcionários da Petrobras que embolsaram propina em contratos das refinarias

Por: Laryssa Borges, de Brasília
Movimentação em frente a sede da Polícia Federal no Recife, Pernambuco, onde ocorrem mandatos de busca e apreensão da Operação Lava Jato
Sede da Polícia Federal no Recife, em Pernambuco(Sérgio Bernardo/JC Imagem/Folhapress)
A Polícia Federal deu início na manhã desta segunda-feira à 20ª fase da Operação Lava Jato e cumpre dois mandados de prisão temporária, cinco de condução coercitiva e 11 mandados de busca e apreensão. O foco desta fase das investigações sobre o escândalo do petrolão são ex-funcionários da Petrobras que embolsaram propina em contratos da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e na refinaria de Pasadena, no Texas.
As medidas de investigação da 20ª fase, batizada de Operação Corrosão, nevolvem um novo operador financeiro responsável por facilitar a movimentação de propina pagos à diretoria de Abastecimento da estatal. Os investigados responderão pelos crimes de corrupção, evasão de divisas, fraude em licitações e lavagem de dinheiro.
(Da redação)

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Governo deixa dívida explodir e condena Brasil à mediocridade

Salto de quase 20 pontos porcentuais - de 2013 para 2016 - ocorre após três anos de baixo crescimento e deixa governo mais dependente de ajuste fiscal

presidente Dilma Rousseff recebe governador de Pernambuco, Eduardo Campos, em 2011
Aumento da dívida deixa governo mais dependente de um ajuste fiscal para evitar uma crise mais grave(Beto Barata/Agência Estado/VEJA/VEJA)
Após três anos seguidos de baixo crescimento, com aumento de desemprego, a dívida pública bruta saltará fortemente, deixando o governo mais dependente de um ajuste fiscal para evitar uma crise mais grave. O próprio governo admitiu ao Congresso que a dívida pública bruta chegará a quase 72% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2016. Haverá, portanto, um salto de quase 20 pontos porcentuais da dívida pública em apenas três anos - em dezembro de 2013, ela representava 53,2% do PIB.
A combinação entre recessão e debilidade fiscal pode ser explosiva. Para o economista Luis Eduardo Assis, ex-diretor do Banco Central, o risco para o país é se aproximar da realidade de alguns países europeus, como Itália, Espanha e Portugal, que viram sua dívida pública subir muito em poucos anos e hoje convivem com baixo crescimento econômico. "A diferença é que eles já enriqueceram, nós não. O grande risco aqui não é mesmo o de uma explosão, como na Grécia, mas de uma mediocridade de crescimento por muitos anos."
Para Nelson Marconi, coordenador do curso de Economia da Fundação Getulio Vargas em São Paulo (FGV-SP), o quadro de baixo crescimento e alta do endividamento é semelhante ao de países europeus, mas, no limite, o Brasil "se salva" pelo fato de a dívida ser predominantemente lastreada em moeda nacional. "Os europeus estão presos ao euro, uma moeda comum, mas que não é controlada por cada país. Nós, no limite, desvalorizamos muito a moeda para pagar a dívida. Seria uma opção dramática, mas é uma saída limite."
Para o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central, o governo precisa, urgentemente, "arrumar sua casa". Isto é, reduzir gastos com despesas obrigatórias, em especial na Previdência Social. "O governo precisa fazer um ajuste fiscal que possa, no mais curto espaço de tempo possível, sinalizar que voltará a produzir um superávit fiscal. Isso permitirá ao menos uma estabilização do endividamento público e também a redução dos juros, o que ajuda no crescimento econômico", disse ele.
Para Schwartsman, a saída preconizada por economistas que defendem mais gastos e mais estímulo ao crédito (como sugeriu o ex-presidente Lula), não faz o menor sentido. "Se gastar fosse a saída, não haveria pobreza no mundo. Bastaria que todos os governos imprimissem dinheiro e entregassem para todas as pessoas."
Os analistas concordam que nenhuma reforma estrutural, como mudanças em aposentadorias e pensões e ajustes nas contas públicas, sairá do papel no atual contexto de crise política. "A sociedade brasileira precisa discutir o Estado que ela quer, e isso terá impacto no futuro da dívida pública. Mas esse debate hoje é absolutamente impossível. Só depois de resolvida a crise política", disse Assis.
(Com Estadão Conteúdo)

sábado, 7 de novembro de 2015

"O custo ministro" do TCU

Manuscrito encontrado na casa do ex-presidente do Carf indica, segundo a PF, que Augusto Nardes pode ter recebido R$ 2,5 milhões de quadrilha que operava na Receita

Marcelo Rocha
Assim que teve seu nome associado à Operação Zelotes, que apura fraudes no conselho encarregado de julgar recursos contra multas tributárias, o Carf, o ministro Augusto Nardes, do Tribunal de Contas da União (TCU), correu para se defender. Rechaçou qualquer ligação com as irregularidades e informou que, em maio de 2005, portanto antes de assumir o cargo na corte de contas, desfizera a sociedade que mantinha com um sobrinho na empresa de consultoria investigada pela Polícia Federal por suspeitas de participar da quadrilha acusada de fraudar o Carf. A empresa em questão, denominada Planalto Soluções e Negócios, segundo as investigações, recebeu valores da SGR Empresarial, pertencente ao advogado José Ricardo da Silva e contratada por contribuintes para derrubar multas do Fisco.
NARDEZ-01-IE.jpg
COMPLICOU
Para a PF, justificativas do ministro do TCU, Augusto Nardes, não se sustentam
Apesar do discurso do ministro, os procuradores da Zelotes enviaram o caso ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, após autorização da Justiça Federal. Para eles, Nardes está envolvido. Entre os documentos em poder de Janot, há um papel manuscrito, obtido com exclusividade por ISTOÉ, que reforça as convicções entre os investigadores sobre o possível participação do ministro do TCU. Trata-se de uma anotação avulsa recolhida em São Paulo, na casa do advogado Edison Pereira Rodrigues, ex-presidente do Carf e ligado à SGR Empresarial. O documento mostra que seu autor incluiu o que chamou de “custo ministro” ao fazer cálculos sobre uma prestação de serviço cujo resultado final é “R$ 2.556.974”. Para os investigadores é uma referência a Nardes.
Eles chegaram a essa conclusão ao cruzar o documento com outros achados da Operação Zelotes. Em mensagem enviada a pedido do advogado José Ricardo, da SGR, em 24 de fevereiro de 2012, a secretária Gegliane Bessa apresentou ao patrão um balanço sobre pagamentos feitos a pessoas identificadas como “Ju” e “Tio”. Para a PF e para a procuradoria, a secretária fazia alusão a Augusto Nardes e ao sobrinho Carlos Juliano, sócio do ministro na Planalto Soluções e Negócios. Gegliane disse no e-mail que repassou ao “Tio” R$ 1.650.000 entre 2011 e 2012, e outros R$ 906.974 a “Ju” no mesmo período. Os valores somam os exatos R$ 2.556.974 identificados no manuscrito como “custo ministro”.
01.jpg
Anotação que diz que 'custo ministro' é de R$ 2.556.974 faz referência
a Augusto Nardes, de acordo com a PF. Valor é idêntico ao revelado
em email pela secretária da SGR Empresarial, contratada
por contribuintes para derrubar multas do Fisco
Em depoimento à CPI do Carf, instalada no Senado, Gegliane confirmou a existência da planilha com as inscrições “Tio” e “Ju”, mas desconversou ao ser questionada sobre quem seria o “Tio”. A secretária contou aos senadores que entregou “duas ou três vezes” valores a Juliano e que, numa dessas ocasiões, ao abrir o envelope e contar o dinheiro, o rapaz teria reclamado: “Está faltando”. Lidar com dinheiro em espécie parecia ser uma prática recorrente, segundo revelaram os autos da Zelotes. Numa mensagem do dia 17 de janeiro de 2012, identificada como “Notícia e pedido”, José Ricardo recomendou a Gegliane que separasse R$ 100 mil em dois envelopes: “Coloque em dois envelopes brancos grandes, com 50 em cada um”. No mesmo e-mail, José Ricardo expôs um desentendimento com Juliano. “Eu disse a ele que se tivessem insatisfeitos que viessem brigar comigo e não destratassem meus funcionários!”. Num outro e-mail apreendido, Edison Rodrigues, dono do imóvel onde a anotação foi encontrada pela PF e parceiro de negócios de José Ricardo, disse a um interlocutor que garantiria a uma empresa “95%” de chances de sair vitoriosa em processo para reduzir ou anular multas da Receita. 
Agora, a PF e a Procuradoria dedicam-se a decifrar toda a rede de facilitadores que assegurava ao grupo taxa de sucesso tão expressiva. Investigadores acreditam que a contabilidade informal listada no manuscrito esteja relacionada a serviços prestados pelo escritório SGR a um grupo de comunicação. As contas partem sempre de R$ 12,8 milhões, montante próximo ao que ao que foi repassado pelo grupo de comunicação à SGR por sua atuação junto ao Carf. A referida empresa conseguiu reduzir multas aplicadas pela Receita.
Como integrantes do TCU têm a prerrogativa de foro, o caso envolvendo Nardes tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), sob a responsabilidade da ministra Carmén Lúcia. Procurado pela reportagem, o ministro do TCU informou que ainda não teve acesso aos autos do processo no Supremo. Autor do parecer que resultou na rejeição das contas do governo federal de 2014, Nardes reafirmou que “abriu mão dos direitos de acionista da empresa Planalto Soluções e Negócios S.A ao se desligar dela em 2 de maio de 2005, antes mesmo de assumir a vaga no Tribunal de Contas da União. Dessa forma, por nunca ter ocupado cargo de direção na empresa, não pode responder por seus atos.” Ele enviou cópia da ata que registrou seu desligamento da empresa em que foi sócio com o sobrinho Juliano. Para os investigadores, o ministro do TCU tem muito mais a explicar.
A ZELOTES E O TRIBUNAL DE CONTAS
*A Operação Zelotes, da Polícia Federal, apura um esquema de venda de sentenças no Carf, o conselho encarregado de julgar recursos contra multas aplicadas pela Receita Federal. O caso envolve lobistas, políticos, escritórios de advocacia e grandes empresas
*A PF identificou ligação de um escritório investigado com a Planalto Soluções e Negócios, da qual o ministro Augusto Nardes, do Tribunal de Contas da União (TCU), foi sócio até 2005. Um sobrinho de Nardes, Carlos Juliano, tem ligação com a empresa
*A Planalto Soluções e Negócios recebeu valores da SGR, que tem entre seus sócios o advogado José Ricardo da Silva, acusado pela polícia e pela procuradoria de participar do esquema ilegal. As transferências ocorreram entre 2011 e 2012 e somam, de acordo com o inquérito, R$ 2,5 milhões
*Existem nos autos referências ao ministro Nardes e, numa avaliação dos policiais federais e procuradores, são necessárias novas diligências para que elas sejam esclarecidas. Essa parte da apuração está sob a responsabilidade do Supremo Tribunal Federal

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Filho de Lula confirma à PF que recebeu de firma investigada

Luís Cláudio prestou depoimento em Brasília e declarou que sua empresa 'prestou serviços' à Marcondes e Mautoni, suspeita de comprar MP para beneficiar o setor automotivo

Luiz Claudio Lula da Silva, filho do presidente Luiz Inácio Lula da Silva
Luiz Claudio Lula da Silva, filho do presidente Luiz Inácio Lula da Silva(Ernesto Rodrigues/Estadão Conteúdo)
Luís Cláudio Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula, prestou depoimento à Polícia Federal nesta quarta-feira, em Brasília, e confirmou que sua empresa de marketing esportivo, a LFT, recebeu dinheiro do escritório Marcondes e Mautoni, suspeito de pagar propina a políticos para conseguir vantagens fiscais para montadoras. Segundo nota da defesa de Luís Cláudio, o filho de Lula declarou ao delegado da PF Marlon Cajado que a LFT "prestou serviços" à Marcondes e Mautoni em 2014 e 2015 e, por isso, recebeu "os valores que foram contratados".
O comunicado da defesa de Luís Cláudio não esclarece quais seriam esses serviços, mas destaca que o filho de Lula "reafirmou ao delegado o seu 'know how' na área esportiva", citando suas passagens pelos quatro grandes clubes de São Paulo - Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo.
A firma de lobby Marcondes e Mautoni é suspeita de ter atuado na "compra" da Medida Provisória 471, que prorrogou benefícios fiscais de empresas do setor automotivo. De acordo com as investigações, a Marcondes e Mautoni repassou à empresa do filho de Lula 2,4 milhões de reais. A LFT foi aberta em 2011, ano em que a MP começou a vigorar.
Zelotes - Na semana passada, o escritório da empresa de Luís Cláudio em São Paulo foi alvo de buscas na Operação Zelotes. Na ocasião, a Polícia Federal recolheu documentos para tentar entender por que uma empresa de marketing esportivo recebeu mais de 2 milhões de reais de uma firma de lobby.
As buscas foram ordenadas pela juíza substituta Célia Regina Ody Bernardes, da 10ª Vara da Justiça Federal, que nesta quarta deixou de conduzir a Zelotes com o retorno do titular Vallisney de Souza Oliveira.
Investigadores responsáveis pelo caso veem a saída de Célia Regina com preocupação, já que ela adotou uma linha distinta da usada pelos juízes que a antecederam no caso ao deferir medidas mais duras contra os suspeitos. Por isso, teria imprimido um "padrão Moro" na investigação, uma referência ao juiz Sérgio Moro, que conduz a Lava Jato.
(Com Estadão Conteúdo)

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Eduardo Cunha diz que provará ao Conselho de Ética que falou a verdade

Conselho apura se ele quebrou decoro ao negar que possui contas no exterior.
Documentos do MP da Suíça mostram existência de contas no país europeu.

Fernanda Calgaro Do G1, em Brasília
O deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) em entrevista na Câmara (Foto: Gustavo Garcia/G1)O deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) em entrevista na Câmara (Foto: Gustavo Garcia/G1)
O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), disse nesta terça-feira (3) que irá provar no Conselho de Ética que não faltou com a verdade.

A declaração foi dada horas após o conselho instaurar processo para investigar se Cunha cometeu quebra de decoro parlamentar por não ter declarado à Justiça Eleitoral ter contas bancárias na Suíça atribuídas a ele e a parentes. Segundo a Procuradoria Geral da República, documentos enviados pelo Ministério Público suíço confirmam a existência dessas contas. Em depoimento à CPI da Petrobras, em março, Cunha negou ter qualquer conta no exterior.
As investigações do Conselho de Ética poderão resultar em absolvição, censura verbal ou escrita, suspensão ou cassação do mandato. “Vou provar que não faltei com a verdade”, afirmou o deputado. Ao ser perguntado sobre a representação contra ele, Cunha disse que ainda não havia lido o documento nem pensado sobre a estratégia de defesa.
“Não tomei nenhuma decisão a respeito, deixa primeiro definir o relator. Depois de definido, vou avaliar. Ainda nem pensei sobre isso”, afirmou. "Nem sequer li a representação", completou.  Cunha relatou que quer encontrar seu advogado ainda nesta terça-feira para definir os próximos passos. "Vou apresentar a defesa com base no fato em si. Vou pegar o meu advogado, discutir com ele", declarou.

Para Cunha, o processo no Conselho de Ética é diferente dos inquéritos a que ele responde no Supremo Tribunal Federal (STF). "São duas coisas distintas", disse, acrescentando que o processo no Supremo já tem como consequência, no caso de condenação, a perda de mandato, o que dispensaria a necessidade do Conselho de Ética.
 
"É diferente porque, se todo mundo que tivesse um processo fosse para o Conselho de Ética por quebra de decoro, teria que ter uns 150 no Conselho de Ética, porque é mais ou menos uns 150 que respondem a processo no Supremo", disse. O presidente da Câmara negou, ainda, haver qualquer constrangimento em responder a um processo no colegiado. Ele não quis comentar os nomes dos deputados sorteados para relatar o processo.

O presidente do Conselho de Ética, José Carlos de Araújo (PSD-BA), precisa escolher dentre três nomes sorteados nesta terça qual será o relator do caso, a quem caberá fazer um relatório preliminar em até 10 dias. Foram sorteados os deputados José Geraldo (PT-PA), Vinicius Gurgel (PR-AP) e Fausto Pinato (PRB-SP).

José Geraldo e Vinicius Gurgel já afirmaram que há indícios “fortes” contra o peemedebista. Já o terceiro sorteado, Fausto Pinato, não quis emitir opinião sobre as provas apresentadas até agora. “Não posso falar, porque podem me considerar impedido de relator depois”, disse. Assim como os demais, ele afirmou que aceitará ser relator, se for nomeado pelo presidente do Conselho de Ética.