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terça-feira, 30 de abril de 2013

Secretaria alvo de operação da PF era 'prêmio' para aliados

Pasta do Meio Ambiente no Rio Grande do Sul teve três titulares do PCdoB nos últimos dois anos e, apesar do escândalo, deve continuar na cota do partido

Jean-Philip Struck
O secretário do Meio Ambiente do RS, Carlos Niedersberg, o secretário municipal do Meio Ambiente de Porto Alegre, Luiz Fernando Záchia, e o ex-secretário estadual do Meio Ambiente, Berfran Rosado foram presos na madrugada desta segunda-feira durante Operação Concutare, no Rio Grande do Sul
Agentes da Polícia Federal durante operação que prendeu 18 pessoas no RS, entre elas um secretario da cota PC do B (Ronaldo Bernardi/Agência RBS)
Alvo de uma operação da Polícia Federal que prendeu dezoito pessoas envolvidas em um esquema de corrupção na liberação de licenças ambientais, a Secretaria de Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (Sema-RS) é um tradicional espaço de loteamento partidário de governadores gaúchos - o estouro de um escândalo era apenas questão de tempo.  
Desde a sua criação, em 1999, no governo do petista Olívio Dutra (1998-2002), a secretaria já teve no comando treze titulares, vários filiados a PT, PPS, PSDB e o PMDB, dependendo da conjuntura política. No governo Tarso Genro (PT), a pasta entrou na cota do PCdoB, partido que integra a base de apoio do governo e que também comanda a Secretaria do Turismo.
No início do governo Tarso Genro, o PCdoB chegou a pedir pastas mais importantes, mas acabou se contentado. Mesmo sem o orçamento de outras secretarias, a de Meio Ambiente possui um atrativo político: a subordinação da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), que libera as licenças ambientais no estado.
Divulgação/Sema
O ex-secretário Niedersberg
O ex-secretário Niedersberg
Secretário - O PCdoB ecolheu para preencher o cargo entre 2011 e abril deste ano três diferentes filiados. O último deles, Carlos Fernando Niedersberg, foi preso nesta segunda. Técnico e professor licenciado de química, ele usou a sua formação para justificar a nomeação para o posto mais alto na secretaria, quando na realidade sua credencial era política – ele já comandou a presidência do diretório municipal do PCdoB em Porto Alegre e a vice-presidência do diretório estadual da sigla.
Niedersberg também é um debatedor do programa do partido. O site do PCdoB reúne alguns dos seus textos, onde ele afirma que a “construção do socialismo” no Brasil não será feita por meio de uma “guerra popular prolongada” e sim “pelo conceito gramsciano de luta pela hegemonia”.
Hegemonia foi o que PCdoB teve na Sema e na Fepam. Antes de assumir a secretaria, no início de abril, Niedersberg comandou justamente a Fepam, o epicentro dos casos de corrupção e onde a PF aponta que foi montado um sistema de cobrança de propina para liberar licenças ambientais. A PF ainda não divulgou quais são exatamente as acusações contra o comunista, mas os dezoito suspeitos presos são acusados de crimes ambientais, crimes contra a administração e lavagem de dinheiro.
Na Fepam, Niedersberg colecionou acusações públicas de negligência por parte do Tribunal de Contas do Estado, que chegou a afirmar em fevereiro que havia deficiências na concessão de licenças para operações de extração de areia no estado. Mesmo assim, foi "promovido" quando o antecessor na chefia da secretaria, também um quadro do PC do B, deixou o cargo por "motivos de saúde".
Nesse arranjo, para o lugar de Niedersberg na Fepam, foi nomeada Gabriele Gottlieb, outro quadro do PCdoB.
Tradição - No loteamento, Tarso seguiu o exemplo da sua antecessora, a tucana Yeda Crusius (2007-2011), que em quatro anos teve seis secretários diferentes comandando a pasta (um deles ficou só cinco meses no cargo) e também entregou seu comando para um partido aliado. Entre seus secretários, se destaca Berfran Rosado, do PPS, que também foi preso na operação desta segunda, o que pode demonstrar que o suposto sistema de propinas é antigo.  
“A troca entre secretários, infelizmente, é comum. Alguns usam como trampolim para outros cargos, e os nomeados não são ligados à área ambiental. A única coisa que permanece estável ali é a corrupção”, diz Francisco Milanez, presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan).
Na tarde desta segunda-feira, o governador Tarso determinou o afastamento do comunista Niedersberg e a nomeação de Mari Perusso, que ocupava  o cargo de secretária-adjunta da Casa Civil, no seu lugar – também filiada a um partido político, o PPL. A iniciativa foi tomada depois de Tarso conversar com líderes do PCdoB. A mudança, no entanto será apenas temporária, e os comunistas, que já vivenciaram escândalos similares no Ministério do Esporte, não devem perder sua cota no governo Tarso.
De acordo com o secretário-chefe da Casa Civil, Carlos Pestana, não existe nenhum “juízo de valor” no momento. “O PCdoB manifestou a convicção de que é inocente, que não fez nada de errado (...) Nossa ideia é que o espaço do partido no governo esteja preservado”, disse Pestana.

Dilma é vaiada em solenidade em MS e minimiza: 'é democracia'

Cerca de 3 mil produtores rurais protestaram contra demarcação de terras.
Enquanto discursava, presidente disse não ver problema no manifesto.

Fabiano Arruda Do G1 MS
Presidente Dilma Rousseff em Campo Grande (Foto: Fernando da Mata/G1 MS)Produtores rurais entraram em área destinada ao público (Foto: Fabiano Arruda/G1 MS)
Produtores rurais vaiaram a presidente Dilma Rousseff (PT) e o governador do estado, André Puccinelli (PMDB), durante solenidade de entrega de 300 ônibus escolares, no Jóquei Clube, em Campo Grande, nesta segunda-feira (29). O grupo protestou contra a demarcação de terras feita pela Fundação Nacional do Índio (Funai) em Mato Grosso do Sul.

A maioria do grupo ficou atrás do setor da imprensa, na parte descoberta. Eles repetiram as vaias durante o discurso de diversas autoridades ao longo do evento. O protesto foi organizado pelos 69 sindicatos rurais do estado e pela Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul) e outras entidades que representam os produtores rurais. Segundo a Famasul, cerca de 3 mil produtores de Mato Grosso do Sul e também do Paraná participaram.
Durante a entrega de chaves dos ônibus escolares aos prefeitos, em que não havia discursos, Dilma Rousseff foi vaiada pelos produtores, que gritavam “demarcação, não” e “sim à produção”. O governador chegou a interromper a solenidade para pedir que eles parassem de vaiar, “em respeito a presidente”. Em seguida, os manifestantes chegaram a vaiar novamente, mas depois pararam.

Presidente Dilma Rousseff em Campo Grande MS (Foto: Fernando da Mata/G1 MS)Dilma Rousseff durante visita em Campo Grande.
(Foto: Fernando da Mata/G1 MS)
No momento em que a presidente foi ao microfone para o discurso, que durou cerca de uma hora, ela foi vaiada novamente. “Gente: acho bom ver vocês gritarem mesmo porque democracia é isso. Não tenho problema nenhum [com as vaias]”, disse.

Ao final do evento, boa parte dos manifestantes se posicionou na saída do Jóquei. Com faixas e apitos, eles fizeram mais barulho, mas viram Dilma de longe. A comitiva presidencial evitou passar em frente dos manifestantes. Do lado de fora do hipódromo, a equipe partiu em dois helicópteros para a Base Aérea de Campo Grande de onde seguiu para Brasília (DF).

Carta entregue
O presidente da Famasul, Eduardo Riedel, afirmou ao G1 que entregou um documento à presidente que pede a interrupção da demarcação de terras indígenas no estado. Segundo ele, o objetivo é cessar os conflitos entre produtores e indígenas. Riedel afirmou que são 52 pontos de conflito em Mato Grosso do Sul, a maioria na região sul.

Produtores protestam durante visita da presidente Dilma Rousseff em Campo Grande MS (Foto: Fabiano Arruda/G1 MS)Comitiva presidencial não passou perto de manifesto na saída da solenidade. (Foto: Fabiano Arruda/G1 MS)
"O mais importante foi ter conversado com ela e ter entregado a reivindicação pessoalmente", disse o presidente da federação. “O movimento dos produtores foi legítimo para que encontremos soluções. Não é possível deixar a Funai avançar em todos os processos [de demarcação] sem nenhum contraponto", completa.

O conflito entre produtores e índios é histórico no estado e, os casos mais recentes, envolvem atritos entre os fazendeiros e os guarany-kaiwá. A Funai aponta que em todo o estado existem atualmente 24 terras indígenas regularizadas ocupadas pelos guarany-kaiwá (entre propriedades regularizadas, homologadas, declaradas e delimitadas). O total de terras equivale a 90,4 km² -- cinco vezes o tamanho da Ilha de Fernando de Noronha.

O G1 entrou em contato com a Funai, por meio da assessoria de imprensa, e não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

Carros-pipa vão ser monitorados-Ce

Gestores fizeram, ontem, reunião ordinária do Comitê Integrado de Combate à Seca

Em situação de seca, água vira ouro de tão escassa que é. Mas, quando além de rara, ela é de má qualidade, o que fazer? O Diário do Nordeste denunciou, no último dia 19, que 84,3% dos 128 municípios que hoje recebem a Operação Carro-pipa não sabem qual é a procedência do líquido. Para evitar danos à saúde, gestores se encontraram, ontem, na reunião ordinária do Comitê Integrado do Combate à Seca do Ceará, e informaram que o Exército Brasileiro vai implantar um novo sistema de rastreamento.

O objetivo do novo sistema de rastreamento é evitar que os veículos façam captação de água em locais não cadastrados Foto: miguel Portela (18/11/08)

"O objetivo é evitar que os veículos façam a captação de água em locais que ainda não estão cadastrados", afirmou o coordenador da Operação Carro-pipa, coronel Claudemir Rangel.

Atualmente, conforme o Exército, 105 municípios cearenses estão inscritos no Programa Emergencial de Distribuição de Água, com uma população atendida de 773.129 pessoas e 796 carros-pipa. Após reclamações sobre a procedência do líquido, a 10ª Região Militar informou que a entrega é feita por várias instituições. "Cabe destacar que é atribuição do município fiscalizar as condições estruturais e sanitárias das cisternas dos pontos de abastecimento. Após a captação, a água é entregue nas cisternas previamente definidas nas comunidades atendidas", diz.

O Exército conta, ainda, que, como forma de minimizar possíveis prejuízos, além do laudo, "adiciona cloro, na forma de pastilhas, em cada cisterna dos carros-pipa, quando água captada não é proveniente dos órgãos competentes de tratamento e distribuição", aponta em nota.

O secretário do Desenvolvimento Agrário e coordenador do Comitê, Nelson Martins, afirma que irá conversar com os municípios para que apresentem as fontes que têm água tratada e que podem ser consumidas. "Não queremos que os beneficiados com a Operação Carro-pipa no Ceará corram o risco de receber água contaminada", afirma.

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Ocupação do Cerro-Corá 'fecha cinturão de segurança', diz Beltrame

UPP deve ser instalada em 30 dias, diz secretário de Segurança.
Polícia ocupou comunidade no Rio sem conflitos na manhã desta segunda.

Alba Valéria Mendonça, Mariucha Machado e Renata Soares Do G1 Rio
Bandeira é hasteada no alto da comunidade Cerro-Corá, no Cosme Velho (Foto: Mariucha Machado / G1)Bandeira é hasteada no alto da comunidade
(Foto: Mariucha Machado / G1)
O secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame, disse que a ocupação do Cerro Corá, no Cosme Velho, "fecha o cinturão de segurança" do maciço que liga as regiões da Tijuca e da Zona Sul. Ele explicou ainda que a ocupação aconteceu na manhã desta segunda-feira (29) devido ao emprego das forças de segurança na visita da presidente Dilma Rousseff e a abertura do Maracanã, no sábado (27), e porque no domingo a região é muito visitada por turistas e ciclistas.
"O planejamento da instalação das UPPs segue o que foi previsto em 2008. A única exceção foi o Conjunto do Alemão. A UPP do Cerro-Corá faz parte do processo de ocupação do São Carlos, que ocorreu em 2009. Por causa das chuvas de 2010 havia a possibilidade de uma remoção na região. Não iríamos instalar a UPP num lugar onde não houvesse necessidade", acrescentou Beltrame.
Ele destacou que a comunidade, embora não tão conflagrada quanto outros locais, poderia servir de refúgio de traficantes de áreas próximas já ocupadas como São Carlos e Santa Marta.
Ainda segundo Beltrame, a UPP do Cerro Corá deverá ser instalada num prazo de 30 a 45 dias e deve contar com um efetivo de 150 homens.
Ele disse também que com esta unidade a cobertura da Zona Sul fica completa, já que o Bope só sairá da favela Tavares Bastos, no Catete, em dois anos, e a favela Santo Amaro está sob a responsabilidade da Força Nacional de Segurança.
Ao final da coletiva o secretário não quis falar sobre sua possível entrada na política como vice-governador na chapa de Pezão. "Sou da Secretaria de Segurança e minha força está aqui.”
Bandeiras hasteadas
As bandeiras do Brasil e do estado do Rio de Janeiro foram hasteadas, por volta das 10h30, no alto da favela . A comunidade foi ocupada às 5h30 por cerca de 400 homens da Polícia Militar. A PM entrou na comunidade às 5h e, depois de meia hora, sem disparar um tiro, realizava varredura e revistava a população.
Segundo a polícia, em um mês deve acontecer a implantação da UPP na comunidade, que vai contar com a atuação de 190 policiais.
Bandeiras do Brasil e do Rio de Janeiro são hasteadas pelo Bope após operação de ocupação, no alto da comunidade Cerro-Corá, no Cosme Velho, Rio de Janeiro. (Foto: Fábio Teixeira/Parceiro/Agência O Globo)Bandeiras do Brasil e do Rio foram hasteadas pelo Bope (Foto: Fábio Teixeira/Parceiro/Agência O Globo)
'Orgulhosa'
A moradora Ana Lúcia Nunes, que vive na comunidade há 40 anos e teve a bandeira hasteada em sua casa, comemorou. "É importante, fiquei orgulhosa de ter a bandeira na minha casa. Eu não esperava. Vai ser bom ter a UPP aqui também", afirmou Ana.
Homens do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), do Batalhão de Choque, e do Batalhão de Ação com Cães permanecem na comunidade.
Segundo o coronel Frederico Caldas, relações públicas da PM, a ação representa o fechamento do cerco na Zona Sul da cidade, que é um importante ponto turístico do Rio.

“A vinda do papa e o aumento o fluxo turístico explica a nossa entrada. O que acabou contribuindo para a ocupação foram os delitos ainda que estavam ocorrendo na região. O serviço de inteligência mostrava que os marginais estavam se refugiando aqui. Agora, eles perderam do território”, afirmou o coronel Frederico Caldas, destacando que trinta minutos foram suficientes para fazer a ocupação.
Apreensões
Até as 9h30, o Bope havia apreendido 3 kg de maconha,100 balas de fuzil, rádios transmissores e carregadores. O material foi encontrado por homens do Bope dentro de uma mochila em um terreno baldio. Por volta do mesmo horário, ninguém havia sido preso.

Duas comunidades vizinhas, Guararapes e Vila Cândida, também foram ocupadas. As três favelas ficam no morro entre as duas galerias do Túnel Rebouças.
Segundo o major Busnello, do Bope, que comandou a ocupação nas comunidades, o terreno está completamente dominado. "A comunidade agora passa para a segunda fase, que é a instalação da nossa base", afirmou o major, ressaltando que é fundamental que a população colabore e envie informações para o disque-denúncia ou para as redes sociais do Bope (twitter e facebook).
A ação é uma mudança nos planos da Secretaria de Segurança Pública, que após a ocupação da Barreira do Vasco e do Caju, em março, anunciou que o Conjunto de Favelas da Maré seria o próximo local a receber uma unidade pacificadora. O Bope permanecerá na comunidade até a instalação da UPP.
Bope conduziu a imprensa internacional na ocupação da comunidade do Cerro-Corá. (Foto: Mariucha Machado / TV Globo)Bope conduziu a imprensa internacional na ocupação da comunidade do Cerro-Corá. (Foto: Mariucha Machado / TV Globo)
A favela fica próxima ao acessos ao Cristo Redentor, em rota que terá aumento de visitantes e deve ter a passagem do Papa na Jornada Mundial da Juventude, em julho. No início de abril, uma van com um grupo de turistas alemães foi assaltada na Estrada da Paineiras e o fato teve repercussão mundial.
Até as 10h, não havia registro de troca de tiros no local e moradores circulavam tranquilamente pela comunidade. "Aqui é muito tranquilo, é um recanto de turistas. Aqui, à noite, as pessoas se reúnem para um pagodinho. Eu nasci e fui criada na comunidade. Moro aqui há 54 anos", contou a professora Marisa Jorge.
Mais de 30 UPPs
Inspiradas em experiência de Medelín, na Colômbia, o programa do governo do estado que deu origem às UPPs começou dezembro de 2008, com a instalação da primeira unidade, no Santa Marta, em Botafogo, Zona Sul. Desde então, 32 UPPs já foram implantadas, com mais de 8 mil policiais, e a previsão é de que, até 2014, sejam mais de 40 unidades, e equipe de 12,5 mil.
A última ocupação foi em 3 de março, nas comunidades do Caju e Barreira do Vasco, que tiveram a UPP instalada em 12 de abril, como parte de uma estratégia para entrar no Conjunto de Favelas da Maré, uma das regiões de maior atuação do tráfico.
As UPPs em operação abrangem 222 comunidades e beneficiam mais de 1 milhão de pessoas das áreas pacificadas. Até 2014, serão beneficiadas outras comunidades, abrangendo mais 860 mil moradores das Zonas Norte e Oeste do Rio, Baixada Fluminense e outras cidades com grande concentração urbana. Além disso, a Polícia Militar criou um banco de talentos para identificar policiais com formação em outras áreas de conhecimento, que possam agregar mais qualidade ao serviço prestado às comunidades.
Polícia Militar ocupa a comunidade Cerro-Corá (Foto: Editoria de Arte/G1)

domingo, 28 de abril de 2013

Julgamento do mensalão não valeu nada?

Votação de recursos pelo STF pode livrar José Dirceu, João Paulo Cunha e Delúbio Soares da prisão e desmoralizar o julgamento do mais emblemático caso de corrupção do Brasil

por Izabelle Torres
O mais rumoroso caso de corrupção já julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) viverá nos próximos dias um capítulo de incertezas e embates, capaz de mudar o desfecho da ação penal que condenou gente graúda à cadeia. A publicação do acórdão do mensalão e a apresentação dos recursos pela defesa dos acusados devem forçar os ministros a rediscutirem as penas impostas a 12 dos 25 réus enquadrados por lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. A nova análise dos casos pode causar uma reviravolta no resultado, livrando condenados da prisão e reduzindo substancialmente as penas impostas. Esse é um cenário que, se consolidado, vai abalar o simbolismo de um julgamento considerado o marco contra a cultura da impunidade no Brasil. As possibilidades mais estarrecedoras dessas mudanças envolvem as chances de o ex-ministro José Dirceu e seus parceiros, o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) e o ex-tesoureiro Delúbio Soares, não irem para a prisão.
Os três integrantes do núcleo político do esquema dependem apenas de mais um voto para que sejam reduzidas as penalidades que receberam e, a partir de então, serem enquadrados no regime semiaberto, aquele em que o preso fica em liberdade durante o dia, permanecendo no presídio somente à noite e nos fins de semana. Pelo placar atual, Dirceu, João Paulo e Delúbio ficariam presos em regime fechado, pois foram condenados a cumprir pena superior a oito anos de detenção.
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O presidente do STF, Joaquim Barbosa, sabe do impacto negativo que essa mudança nas condenações iniciais pode provocar à imagem do Judiciário. Por isso, desde a semana passada, ele tem feito discursos para outros integrantes da Corte, alegando que o STF não deve reconhecer os embargos infringentes. Trata-se dos recursos capazes de provocar a nova discussão das sentenças que tiveram pelo menos quatro votos pela absolvição. Barbosa argumenta que uma lei de 1990 proibiu esse tipo de recurso no Supremo e a Corte apenas deixou de atualizar o próprio Regimento Interno. O presidente chegou a cogitar a votação de um artigo modificando as normas internas, mas foi alertado que alguns ministros, e advogados dos condenados, poderiam reagir, acusando-o de casuísmo para prejudicar os réus. Barbosa desistiu, mas seguiu pregando nos bastidores sobre a importância de cada voto durante o julgamento. Ele tem lembrado aos colegas que os ministros aposentados Carlos Ayres Britto e Cezar Peluso foram defensores de penas duras e que a nova composição da Corte pode interferir diretamente nesse resultado. De fato, além de desrespeitar a decisão de ministros da própria corte, a reviravolta representaria uma desmoralização do julgamento.
A maior preocupação é com a postura a ser adotada pelo novato Teori Zavascki. Ele não participou do julgamento inicial, mas se transformou na grande esperança da defesa dos mensaleiros que preparam os recursos. Caso Zavascki vote favoravelmente aos réus, ele terá o poder de empatar o jogo e mudar quase metade das condenações. O ministro sabe da influência que terá no desfecho do mensalão. Por isso, tem evitado receber advogados e conversar com colegas sobre o assunto. Nos últimos dias, seu gabinete recebeu nove pedidos de audiência referentes ao caso, mas a ordem dada por ele foi para protelar os encontros. Não significa, porém, que ele vai se revestir de bom senso e não se envolver no placar do julgamento. Para pessoas próximas, ele afirmou que não sente desconforto para julgar os recursos de uma ação penal que não acompanhou desde o início. Ele, inclusive, já participou da votação que ampliou o prazo para a apresentação dos embargos pela defesa dos acusados. Sua posição foi decisiva para conceder mais prazos para as defesas analisarem o acórdão. E, de acordo com ministros ouvidos por ISTOÉ, Zavascki tende a ajudar a consolidar a maioria favorável aos embargos infringentes, forçando uma possível alteração nas penas dos mensaleiros. Diferentemente do que pensa Barbosa, ele acredita que ignorar o Regimento Interno em pleno curso de um processo julgado pelo STF pode engessar as chances da defesa.
Outro sinal evidente de que Zavascki vai dar o voto decisivo pela diminuição da pena de Dirceu, Delúbio e companhia é que, em votos proferidos desde que assumiu a cadeira de ministro do STF, ele tem defendido as chances de defesa dos acusados. Mesmo em casos evidentes de manobras para protelar o fim das ações. No final do ano passado, por exemplo, Zavascki votou favorável à anulação do julgamento de Vitalmiro Bastos de Moura, condenado pelo assassinato da missionária norte-americana Dorothy Stang, ocorrido em 2005. O ministro considerou o argumento do acusado – já condenado a 30 anos de reclusão pela 2ª Vara do Tribunal do Júri de Belém –, de que houve cerceamento de defesa porque o advogado não compareceu e a defensoria pública teve apenas 12 dias para conhecer o processo. Em duas outras decisões, o ministro defendeu que a regra que beneficia réus em casos de empates também se aplicaria ao julgamento de Recursos Especiais. Seus argumentos foram seguidos por outros ministros e influenciaram o desfecho de ambas as ações beneficiando os réus. No texto do acórdão do mensalão, publicado na semana passada, outros três ministros fizeram referências à possibilidade desse recurso que beneficia os mensaleiros: Celso de Mello, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski. Eles sustentam que os chamados embargos infringentes vão anular argumentos sobre cerceamento da ampla defesa.
Se a reviravolta for consumada realmente, como tudo leva a crer, colocará em xeque o resultado do maior caso julgado pelo Judiciário brasileiro, demonstrando que os quatro meses de discussões e os votos consistentes em favor das condenações dos réus do mensalão podem não ter servido de nada.
Fotos: ANDRÉ DUSEK; Roberto Castro; Orestes Locatel; Adriano Machado/AG. ISTOÉ; JB NETO/ag. estado; Alan Marques/Folhapress; Divulgação

Os jovens criminosos e a maioridade penal

Jovens de 16 anos conquistam novos direitos, mas ainda são tratados como crianças quando cometem crimes. Agora, aumenta a pressão para que recebam penas mais duras quando participam de crimes hediondos ou são reincidentes

Suzana Borin
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Desde 1940, quando a legislação brasileira estipulou a maioridade penal, qualquer jovem com idade inferior a 18 anos é considerado “incapaz”. Em outras palavras, o Estado entende que ele não tem condições de fazer as próprias escolhas nem de assumir as consequências de seus atos. É esse o conceito que tem praticamente assegurado a impunidade a adolescentes criminosos que cometem atos bárbaros e que estimula o crime organizado a recrutar cada vez mais crianças para suas fileiras. Mas será que um jovem de 16 anos em 2013 tem o mesmo amadurecimento e acesso à informação que tinha um adolescente da mesma idade em 1940? Será que o rapaz de 17 anos, 11 meses e 27 dias que covardemente atirou na cabeça do universitário Victor Hugo Deppman, de 19 anos, depois de lhe roubar o celular, não sabia das consequências de seus atos?
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Victor foi morto por um criminoso que já tinha passagem pela Fundação Casa, onde havia cumprido apenas 45 dias por outro roubo. Estava na rua, armado, porque não pode receber uma pena maior. Situações como essa vêm se repetindo em todo o País e a sociedade clama por mudanças. Pesquisa realizada pelo Instituto DataFolha mostra que 93% dos brasileiros são favoráveis à redução da maioridade penal para 16 anos. Querem que o adolescente capaz de cometer atos hediondos seja tratado como adulto. “Precisamos responder com urgência ao desespero da sociedade brasileira”, diz o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Na terça-feira 23, a Câmara criou uma comissão especial para enfrentar um tabu: propor alterações no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), um conjunto de normas aprovadas em 1990 para proteger a infância, elogiado internacionalmente como uma das legislações mais modernas do mundo. O objetivo dos deputados é endurecer as punições aplicadas aos menores infratores. No caso de reincidência e crimes hediondos, como homicídio e estupro, o prazo máximo de internação saltaria dos atuais três anos para oito (leia quadro abaixo). O problema é que desde 2000 já foram criados 12 projetos de lei para alterar o estatuto, mas nada sai do papel. Enquanto isso, a situação só se agrava. Nos últimos dez anos, o número de jovens infratores aumentou 138%. Se em 1990 o ECA era exemplo, hoje está desatualizado. Apenas para contextualizar, no início dos anos 1990 o crack não existia em boa parte do País. “Passou da hora de fazermos reformulações”, afirma o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), que vai comandar a comissão da Câmara. Ele defende o aumento do tempo de permanência na Fundação Casa, onde ficam os menores detidos, de três para oito anos nos casos hediondos. Assim, o infrator poderia ficar preso até os 26 anos – e não mais até os 21. A partir dos 18 anos, ele seria encaminhado para uma área específica, isolada dos menores. No Senado, uma emenda constitucional de Aloysio Nunes (PSDB-SP) propõe reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos. A aplicação da medida seria restrita aos crimes hediondos, não às infrações médias ou leves (furtos e roubo simples). Se medidas como essa estivessem em vigor, o universitário Victor não teria cruzado com o jovem criminoso que o matou na porta de casa.
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Ainda segundo a proposta apreciada pelos deputados, quando for diagnosticada doença mental, o juiz poderia indicar tratamento ambulatorial ou internação compulsória por prazo indeterminado, com reavaliações a cada seis meses. A medida tornaria legal, por exemplo, a situação de Roberto Aparecido Alves Cardoso, o Champinha. Ele vive em um limbo jurídico desde 2003, quando liderou o grupo responsável por assassinar o casal Liana Friedenbach e Felipe Caffé, em São Paulo – a adolescente Liana também foi vítima de estupro coletivo, num crime que horrorizou o País. Na época, Champinha tinha 16 anos, a mesma idade da estudante que matou. Há dez anos, o criminoso está internado na Unidade Experimental de Saúde, alvo de uma investigação do Ministério Público Federal por oferecer tratamento “medieval” aos detentos. O equipamento do governo estadual teria o objetivo de tratar jovens de alta periculosidade com graves patologias, mas não chega nem perto disso. Esse é um problema a ser enfrentado. Especialistas em educação asseguram que não adianta reduzir a maioridade penal nem aumentar as penas se o Estado não for capaz de oferecer condições para que os jovens tenham um futuro digno. “Se um jovem falhou, a sociedade, a família e a escola devem ter falhado também”, diz Cosete Ramos, doutora em educação pela Flórida State University.

Organizações de defesa dos direitos humanos e organismos internacionais de atenção às crianças entendem que a diminuição da idade penal não resolve o problema da violência juvenil. Argumentam que os adolescentes ainda não estão completamente formados e que as mudanças devem ocorrer nas razões sociais que levam ao crime. “Reduzir a maioridade penal não resolve. Ou agimos nas causas da violência ou daqui a pouco veremos o tráfico estar recrutando crianças com 14, 12 ou 10 anos”, diz Gilberto Carvalho, ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República. O promotor Thales Cezar de Oliveira, da Vara da Infância e Juventude de São Paulo, discorda. Segundo ele, os jovens de 16 anos têm total consciência dos delitos que cometem. “Eles sabem que nada vai acontecer se matarem e roubarem, a ficha estará limpa aos 18 anos, quando saírem da Fundação Casa”, diz Oliveira. O promotor acrescenta que, quando pegos, a primeira coisa dita pelos infratores à polícia é: ‘sou de menor’. “É inadmissível a quantidade de pessoas honestas e famílias inteiras sendo destruídas, enquanto apenas discutimos a redução da maioridade penal.”
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O mesmo Estado que patina ao definir uma nova legislação capaz de punir menores que cometam crimes hediondos vem, ao longo dos anos, assegurando novos direitos aos jovens de 16 anos. A Justiça Eleitoral, por exemplo, permite a obtenção do título de eleitor e a participação nas urnas já nessa idade. Ou seja, o Estado entende que o jovem de 16 anos é capaz de formar consciência política e votar para presidente. No Brasil, eles também podem trabalhar com carteira registrada e, com autorização dos pais, casar e ser emancipados. Internacionalmente não há um consenso jurídico ou científico que determine em qual idade uma pessoa deixa de ser criança e está apta a responder como um ser maduro. Na Inglaterra é possível prender um infrator de dez anos. Nos Estados Unidos, é permitido tirar licença de motorista aos 16, mas fica proibido de consumir bebidas alcoólicas antes dos 21.
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Com tantas incertezas, cabe à neurociência dar algumas pistas sobre comportamentos característicos dessa faixa etária, como a impulsividade. Diversas pesquisas apontam que o cérebro demora até os 25 anos para se formar por completo. O córtex pré-frontal é a última parte desse processo, mas responde por toda a nossa cognição: tomada de decisão, capacidade de avaliar riscos, planejamento de estratégias, etc. Só ao longo do desenvolvimento biológico ele aprende até onde é possível empurrar limites e ignorar regras. Por isso, um adolescente tende a fazer escolhas baseado mais na intensidade das emoções do que em análises racionais.

“Eles são mais reativos, levam menos em conta as consequências de seus atos”, afirma o neurocientista André Frazão Helene, do Laboratório de Ciências da Cognição da Universidade de São Paulo (USP). “Mas, aos 16 anos, o cérebro já sabe diferenciar o certo do errado, tanto no sentido do que é moral quanto legalmente aceito.” O amadurecimento biológico, porém, varia de pessoa para pessoa – assim como algumas meninas menstruam aos 10 e outras, aos 15. O córtex pré-frontal também está ligado às relações interpessoais, à capacidade de se colocar no lugar do outro. Seja para compreender uma opinião divergente seja para se identificar com a dor alheia. Para a psicóloga Maria Alice Fontes, especialista em neuropsicologia, o desenvolvimento cerebral explica certas atitudes da puberdade, mas não justifica todas elas. “Não dá para usar o cérebro como desculpa para dizer que o jovem nesta idade não tem nenhum discernimento e, portanto, não pode assumir as responsabilidades pelo que faz”, afirma.
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Discussão
Deputado Carlos Sampaio, relator da comissão na
Câmara que estuda reformulações no ECA: menores
presos por mais tempo nos casos de crimes hediondos
Além do fator biológico, há a influência do ambiente e do contexto em que o ser humano cresce. Primeiro, vale lembrar que muitas transformações históricas e culturais separam os adolescentes de hoje dos da década de 1940, época em que a maioridade foi instituída no País. Mesmo nas metrópoles, um rapaz de 16 anos se divertia descendo ladeiras de rolimã, enquanto hoje quer ostentar o smartphone da moda. O acesso às drogas ou às informações em larga escala também era reduzido. Em segundo lugar, não há como ignorar as condições socioeconômicas e a estrutura familiar de um adolescente que comete um crime. Se o cérebro é fisiologicamente imaturo, o ambiente deveria oferecer o suporte necessário para o desenvolvimento ideal. Quanto se pode esperar de um jovem carente, desprovido de boa educação, com referências de violência doméstica, cercado pelo tráfico? “O debate sobre essa questão esquece, muitas vezes, que o contexto é determinante no comportamento”, diz Martha de Toledo Machado, professora de direito da criança e do adolescente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
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Mesmo com tantas ressalvas, jovens de 16 anos estão conquistando agora um novo e polêmico direito. Nos próximos dias, o Ministério da Saúde deve publicar uma portaria que autoriza o tratamento gratuito para mudança de sexo a partir dos 16 anos. O órgão considera que, nessa fase, um garoto já se reconhece como garota (ou vice-versa) e sofre com o transtorno de identidade de gênero. Embora não possa ser operado antes dos 18, o paciente receberá do Estado acompanhamento psicológico e hormonal para iniciar as transformações estéticas. Ou seja, é tido como suficientemente maduro para tomar uma decisão com implicações, muitas vezes, irreversíveis. Até agora, jovens nessa situação viviam numa espécie de submundo no que diz respeito ao sistema público de saúde. Mesmo depois de passar por uma extensa triagem, avaliação médica e receber o diagnóstico do transtorno, não podiam receber acompanhamento psicológico e tratamento hormonal gratuito por meio do SUS. Atravessavam o turbulento período da adolescência em sofrimento porque a aparência não condizia com a sua identidade sexual. Aflitos, muitos deles recorriam ao mercado negro da internet para adquirir hormônios sem prescrição. “O perigo é que eles acabam dando um jeito de se sentir melhores, se sujeitando a efeitos colaterais e arriscando a saúde”, afirma o psiquiatra Alexandre Sadeeh, da clínica de Transtorno de Identidade de Gênero e Orientação Sexual da USP.
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Foi o que fez Alexander Brasil, 16 anos. Ele nasceu mulher e, aos 4 anos, já chorava quando lhe botavam vestidos ou insistiam que frequentasse as aulas de balé. Por conta própria, começou a tomar testosterona há um ano: os pelos cresceram, a voz engrossou. “Agora me sinto muito mais feliz e confortável com meu corpo”, diz Alexandre. Com as mudanças físicas, trocou de colégio para livrar-se de vez do bullying que quase o fez reprovar de ano no ensino médio. A situação irá melhorar para Alexander e outros garotos em situação parecida com a dele com o tratamento hormonal gratuito para pessoas acima dos 16 anos – essa é uma das etapas a caminho da cirurgia de mudança de sexo, que só pode ser realizada a partir dos 18. A medida reafirma o poder de decisão desses jovens e mostra que o Estado é, sim, capaz de tratar o adolescente de hoje em dia como adulto. Exatamente o que está faltando no âmbito penal.
Fotos: divulgação; João Castellano/istoé
Fontes: Estatuto da Criança e Adolescente, Código Civil, Departamento de Justiça, Legislação Federal sobre Tabaco, Tribunal Superior Eleitoral, Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana (SBRASH)
Fotos: Adriano Machado; GUILHERME PUPO

Menor colocou fogo em dentista no ABC, diz polícia

Cinco suspeitos foram detidos neste sábado, sendo dois de 17 anos. Polícia procura homem identificado como Tiago Pereira

Polícia Civil prende os três suspeitos de atear fogo e matar a dentista Cinthya Magaly Moutinho de Souza durante um assalto na manhã desta quinta-feira (25), em São Bernardo do Campo
Polícia Civil prende os três suspeitos de atear fogo e matar a dentista Cinthya Magaly Moutinho de Souza durante um assalto na manhã desta quinta-feira (25), em São Bernardo do Campo - Tércio Teixeira/Futura Press
O Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) afirmou, neste sábado, que um menor de 17 anos foi o responsável por atear fogo e matar a dentista Cinthya de Souza, de 47 anos, em sua clínica odontológica, em São Bernardo do Campo, no ABC paulista. Ao todo, cinco suspeitos foram detidos. Desses, segundo a polícia, três confessaram participação efetiva na morte de Cinthya - os outros dois suspeitos são menores de idade e estariam envolvidos com a quadrilha. Um sexto elemento, identificado como Tiago de Jesus Pereira, está foragido. Ele aparece de óculos brancos no retrato falado divulgado ontem.

Conforme informações da polícia, foram presos Jonatas Cassiano Araújo, de 21 anos, que foi reconhecido pela própria mãe após a divulgação de imagens de câmeras de segurança de uma loja de conveniência; e Victor Miguel Sousa Silva, de 25 anos, que seria o líder do grupo. Ele já tem passagem pela polícia por roubo.

A prisão dos suspeitos ocorreu por volta das 3 horas da manhã deste sábado na favela Santa Cruz, em Diadema, na Grande São Paulo. Em um imóvel, segundo os policiais, estavam Jonatas e dois menores, incluindo o que ateou fogo na dentista. Em outra casa - localizada a cerca de 50 metros da primeira -, foram localizados Victor e outro adolescente.

Jonatas e o adolescente apontado como o assassino de Cynthia pintaram o cabelo de loiro após o crime, na tentativa de não serem reconhecidos.

De acordo com os policiais, as investigações apontam que a quadrilha poderia ser responsável pela autoria de seis a oito crimes cometidos recentemente na região metropolitana de São Paulo e na capital paulista. Com exceção de um caso, o restante foi cometido contra clínicas médicas e odontológicas.
O modus operandi do grupo era o mesmo: eles se apresentavam como pacientes para conseguir entrar nos consultórios, eram violentos, costumavam utilizar isqueiros para ameaçar as vítimas e, após o roubo, fugiam em um carro preto. Um dos assaltos ocorreu no dia 12 de abril, quando foram elaborados os retratos falados dos suspeitos.
No dia do assassinato de Cinthya, segundo a delegada Elisabete Sato, diretora do DHPP, Jonatas ligou para o menor logo após tentar sacar dinheiro da vítima, comunicando que só havia 30 reais na conta dela. Revoltado, o adolescente utilizou o isqueiro que possuía e o álcool que havia no consultório para incendiar a dentista. "A crueldade com que eles relatam a cena do assassinato chocou os policiais", afirma Elisabete.

sábado, 27 de abril de 2013

Minha casa, meu negócio

Num claro conflito de interesses, parlamentares lucram com contratos milionários do maior programa habitacional do governo. Políticos são beneficiados na venda de terrenos e ao colocar suas próprias empreiteiras para tocar as obras

por Josie Jeronimo

De vitrine do governo Dilma Rousseff à vidraça para os órgãos de controle, o programa Minha Casa, Minha Vida se tornou uma fonte de problemas e fraudes. Nas últimas semanas, o jornal "O Globo" denunciou que ex-servidores do Ministério das Cidades integrariam um esquema para ganhar contratos de habitação destinados às faixas mais pobres da população. Os antigos funcionários das Cidades não são, porém, os únicos que lucram com um dos principais programas sociais do governo. Levantamento feito por ISTOÉ indica que a política habitacional criada para ajudar os mais pobres enriquece também deputados e senadores. Os parlamentares se aproveitam de um filão imobiliário que já movimentou R$ 36 bilhões em recursos públicos para a construção de 1,05 milhão de casas e apartamentos para famílias de baixa renda. Os dados do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) – reserva financeira composta por recursos do FGTS e gerenciada pela Caixa Econômica Federal – mostram que parlamentares de diferentes partidos têm obtido vantagens financeiras com o programa de duas maneiras: na venda de terrenos para o assentamento das unidades habitacionais e na obtenção de contratos milionários para obras que são realizadas por suas próprias empreiteiras. Entre eles, os senadores Wilder Morais (DEM-GO) e Edison Lobão Filho (PMDB-MA), filho do ministro de Minas e Energia e presidente da Comissão de Orçamento do Senado, e os deputados Inocêncio Oliveira (PR-PE), Augusto Coutinho (DEM-PE) e Edmar Arruda (PR-PR).
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A CASA É NOSSA
Os deputados Augusto Coutinho, Inocêncio Oliveira e os senadores Wilder Morais
e Lobão Filho (da esq. para a dir.) têm sido favorecidos pelo programa Minha Casa, Minha Vida
O procurador Marinus Marsico, representante do Ministério Público no Tribunal de Contas da União (TCU), não tem dúvidas da irregularidade de tais práticas. Segundo ele, a utilização de financiamento habitacional de programa do governo a empresas de parlamentares constitui, no mínimo, conflito de interesses. “O parlamentar é um ente público. Assim, quando firma contrato com recursos públicos, ele está dos dois lados do contrato, porque ele é responsável por gerir ou fiscalizar essas verbas. Há uma incompatibilidade. Não é possível servir a dois senhores. Ou você é administração pública ou é empresa”, critica Marinus. Na terça-feira 23, a própria presidenta Dilma admitiu a possibilidade de haver irregularidades no programa e foi enfática ao dizer que o governo tem a obrigação de investigá-las.
Os casos levantados pela reportagem, segundo o procurador, podem ser apenas uma mostra de um crime muito maior. É prática corrente colocar empresas e imóveis, como terrenos, em nome de terceiros, o que dificulta a fiscalização. Mas em Pernambuco o vínculo com o parlamentar beneficiado é direto. No Estado, nove mil das 20 mil casas prometidas pelo programa do governo federal já foram entregues. A especulação imobiliária é intensa, como também é grande a oferta de enormes áreas para a construção das casas populares. Apesar disso, a construtora Duarte, uma empreiteira local que abocanhou o contrato para erguer 1.500 casas no município de Serra Talhada, escolheu justamente as terras do deputado Inocêncio Oliveira (PR-PE) para construir as habitações.
A área de 34 hectares fora adquirida pelo parlamentar 30 anos atrás, antes de ser desapropriada pelo Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs). Era parte de uma fazenda, que foi dividida em vários lotes. O lote em questão foi declarado por Inocêncio à Justiça Eleitoral em 2010 pelo valor de R$ 151 mil. No mesmo ano, ele vendeu o terreno à construtora do programa Minha Casa, Minha Vida por R$ 2,6 milhões, de acordo com registros do cartório do 1º ofício de Serra Talhada. Ou seja, uma valorização espontânea de 1.600%. Procurado por ISTOÉ, Inocêncio confirmou o negócio, mas disse ter recebido “apenas R$ 1 milhão”, dando a entender que a empreiteira registrou valor diferente. O parlamentar disse ainda desconhecer o uso da área. “Eu não tenho nada a ver com a Caixa. Vendi para uma empresa particular”, afirma. Coincidência ou não, o negócio foi fechado no fim de 2010, momento em que a prefeitura de Serra Talhada era comandada por Carlos Evandro, do PR, um colega de partido de Inocêncio.
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DE VITRINE À VIDRAÇA
Dilma Rousseff admite irregularidades no Minha Casa,
Minha Vida e diz que o governo deve investigá-las
No Recife, o deputado federal Augusto Coutinho (DEM) também tenta tirar proveito do programa Minha Casa, Minha Vida, seguindo o exemplo de Inocêncio Oliveira. O governo negocia com o parlamentar a compra de uma área de 2.400 metros localizada no bairro de Campo Grande para construção das casas populares. As terras estariam registradas em nome de sua construtora, a Heco. Os valores precisos da negociação não foram divulgados. Coutinho já declarou que não aceita menos de R$ 300 mil para ceder o terreno para o Minha Casa, Minha vida. O caso, no entanto, deve parar na Justiça. A prefeitura, nas mãos do PSB, alega que a área é de propriedade da Marinha.
Outro jeitinho arranjado pelos parlamentares para lucrar com o programa federal é fechar contratos com suas próprias empreiteiras para a construção das unidades habitacionais. Segundo dados da Caixa Econômica Federal, obtidos por ISTOÉ, um dos barões do Minha Casa, Minha Vida é o senador Edison Lobão Filho (PMDB-MA), presidente da Comissão de Orçamento do Senado. Até o fim do ano passado, ele já havia embolsado R$ 13,5 milhões por meio de contratos firmados por sua empreiteira, a Difusora Incorporação e Construção. Um dos empreendimentos populares de Edinho, como ele é conhecido no Senado, financiados pelo Fundo de Arrendamento Residencial, está sendo erguido no município de Estreito, a 700 quilômetros de São Luís.
O município tem atraído investimentos milionários desde que recebeu o canteiro de obras da usina hidrelétrica de Estreito em 2007 – empreendimento de R$ 1,6 bilhão do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A população local cresceu 60%, saltando de 25 mil habitantes para 40 mil. No mês passado, a Caixa Econômica Federal abriu sua primeira agência no município e anunciou investimentos de R$ 57 milhões para construir mil casas.
No Paraná, em pelo menos três municípios, imóveis do Minha Casa, Minha Vida levam o selo da Cantareira Construções. A empreiteira pertence ao deputado Edmar Arruda (PR-PR). Só da Caixa, a Cantareira recebeu R$ 65,5 milhões até o fim de 2012. E a empresa do deputado fechou novo contrato para construir 400 casas no município de Paranavaí, um acerto de R$ 30 milhões. Os recursos, desta vez, virão do Banco do Brasil. Acumulando as funções de representante do Legislativo e presidente do Grupo Cantareira, Arruda percorre municípios do Estado discutindo com prefeitos projetos de ampliação do Minha Casa, Minha Vida. Em um evento na Câmara Municipal de Ivatuba (PR), no fim de 2011, Arruda foi homenageado por anunciar um empenho de R$ 300 mil de uma emenda parlamentar para a cidade. Na mesma reunião, aproveitou para fazer lobby pela construção de 140 casas do programa Minha Casa, Minha Vida. O próprio deputado-empreiteiro, sem nenhum constrangimento, explicou aos vereadores que o município precisaria captar R$ 2,3 milhões com o programa do governo para tirar as habitações do papel. Procurado, ele alegou que já foi sócio da empresa, mas hoje não faz mais parte dela. Embora, na reunião com os prefeitos, ele seja apresentado como presidente do Grupo Cantareira, Arruda diz que a empresa “está em poder da sua família”, como se isso resolvesse o conflito de interesses. Arruda argumenta ainda “que o dinheiro do Programa Minha Casa, Minha Vida não é público e que advém de recursos oriundos de fundos como o FAT e o FGTS”.
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DESPISTE
Deputado Edmar Arruda diz que empreiteira que lucra com casas "é da família"
No Estado de Goiás, a história se repete. Em Nerópolis, município próximo a Goiânia, a Orca Incorporadora constrói o conjunto residencial Alda Tavares. A empreiteira é do senador Wilder Morais (DEM), que assumiu o gabinete de Demóstenes Torres após sua cassação por envolvimento com o bicheiro Carlinhos Cachoeira. Até o final de 2012, só em contratos com a Caixa, a empresa de Morais faturou R$ 42,1 milhões. O empreendimento de Nerópolis está sendo investigado pelo Ministério Público de Goiás depois que moradores relataram que as casas lá são feitas com chapas metálicas. Os choques elétricos são rotina, um dos beneficiados do programa disse que seu cachorro morreu eletrocutado no quarto do filho. A construtora do senador também tem empreendimentos populares em Aparecida de Goiânia. Procurado por ISTOÉ, Morais não retornou as ligações. Questionada pela reportagem, a Caixa também não se manifestou. O ex-superintendente da Caixa Econômica Federal José Carlos Nunes diz que os métodos de escolha dos terrenos e empresas para o Minha Casa, Minha Vida ainda não são uniformes. “Tudo fica a critério da Caixa, que escolhe quem quer”, critica Nunes.
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sexta-feira, 26 de abril de 2013

Pivô de esquema cita ex-auxiliar de Mercadante

Ligações mostram proximidade entre Félix Sahão e Olívio Scamatti, apontado como chefe da máfia que fraudou licitações em 78 prefeituras de São Paulo

Fachada da Polícia Federal de São Paulo
Operação foi deflagrada pela Polícia Federal e pelo Ministério Público (Fotoarena)
Interceptações telefônicas da Operação Fratelli – deflagrada pela Polícia Federal e Ministério Público – indicam relações próximas de Félix Sahão, ex-assessor do ministro da Educação, Aloízio Mercadante, com o empreiteiro Olívio Scamatti, apontado como chefe da Máfia do Asfalto, organização criminosa que fraudou licitações em 78 prefeituras da região noroeste do estado de São Paulo.
Filiado ao PT, Félix trabalhou no gabinete de Mercadante no Senado entre 2005 e 2010 e atendia prefeitos em busca de recursos de emendas parlamentares. Os grampos da PF captaram uma conversa, de 13 de agosto de 2010, às 10h45, na qual o empreiteiro, preso há uma semana, sugere a seu interlocutor, César, que em Brasília procure uma mulher chamada Rosângela. "Ela trabalha com o Félix do Mercadante", diz Scamatti. Cinco minutos antes, ele caiu no grampo com a própria Rosângela e apresentou-se a ela como "amigo do Félix".
Félix, professor universitário, hoje sócio da Nova TV, de Catanduva, foi prefeito da cidade por dois mandatos, entre 1997 e 2004. No ano seguinte, Mercadante o nomeou assessor. Félix ficou no cargo até 30 de junho de 2010, quando saiu para candidatar-se a deputado federal – recebeu 42.577 votos, mas ficou na suplência.

Os arquivos da Justiça Eleitoral mostram que duas empresas de Scamatti estão entre as maiores doadoras da campanha do ex-assessor de Mercadante. A Demop doou 50.000 reais. A Scamvias, mais 50.000. A PF sustenta que a Demop e a Scamvias são as principais beneficiárias do esquema de corrupção.
A PF não acusa Mercadante nem Félix de envolvimento com o grupo. Mas as citações ao ex-assessor do petista constam dos autos e revelam sua ligação com Scamatti.
Outro lado – "(As doações) estão registradas, portanto absolutamente legais, de acordo com as regras do nosso país, e a Demop não era investigada", afirma Félix. "Quando o Aloízio me convidou para trabalhar no gabinete, eu já o conhecia da política, da militância do PT. Fui coordenador do Sindicato dos Professores. Ele me pediu para trabalhar com lisura e transparência."
Sua função, diz, era atender políticos. "Eu ficava numa sala do gabinete do senador e atendia muita gente, prefeitos e vereadores. Dava orientação, passava um pouco da minha experiência na administração, sempre de portas abertas. Todos ficavam à vontade e não tinha conversa reservada. Era tudo muito republicano, como o Aloízio queria", conta o ex-assessor. "Ele mesmo não tinha tempo para dar esse atendimento, estava empenhado com demandas maiores do país."
Félix conta como encaminhava as solicitações: "A gente priorizava a saúde. Os prefeitos buscavam emendas para equipamentos hospitalares, medicamentos, construção de postos médicos, ambulâncias. A gente dividia as emendas em valores maiores para a saúde, depois a agricultura. Vinha (recurso) do Ministério das Cidades. Daí para frente eu não tinha mais ingerência. A fiscalização (sobre o uso do dinheiro das emendas) não era meu papel."
Félix diz que não sabe quem é a mulher chamada Rosângela, citada por Scamatti no grampo, e que "não é capaz de se lembrar" se algum dia recebeu o empreiteiro no gabinete de Mercadante. Afirma que não lembra como conheceu o dono da Demop. "Não tenho condição de te responder isso".

(Com Estadão Conteúdo)

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Brasil absorve 87% da exportação de carros argentinos

A presidente Dilma Rousseff reuniu-se com Cristina Kirchner nesta quinta-feira para tratar, entre outras coisas, do acordo entre Brasil e Argentina do setor automotivo

Dilma e Cristina Kirchner durante encontro do Mercosul, em Brasília
Dilma e Cristina Kirchner vão conversar nesta quinta-feira à tarde (Ueslei Marcelino/Reuters)
A Associação de Fabricantes de Automóveis da Argentina (Adefa), anunciou na quarta-feira que o Brasil está absorvendo 87% das exportações de veículos do país vizinho. Segundo dados da Adefa, no primeiro trimestre deste ano a Argentina fabricou 176 mil unidades, 7,4% mais do que no mesmo período de 2012. Destas, 90 mil foram exportadas, a imensa maioria ao mercado brasileiro. O volume exportado pela Argentina nos três primeiros meses representou 7% a mais do que no mesmo período do ano passado. Em março, as exportações cresceram 43,1%.
Analistas argentinos destacam que a saúde da indústria automotiva do país depende, em grande parte, das compras brasileiras dos veículos fabricados no país. Segundo eles, a Argentina foi amplamente beneficiada com a decisão do governo brasileiro de prorrogar o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) até dezembro deste ano.
Nesta quinta-feira a presidente Dilma Rousseff desembarca em Buenos Aires para uma reunião com a presidente Cristina Kirchner na Casa Rosada, o palácio presidencial à tarde. O encontro em Buenos Aires estava previsto para 7 de março. Mas, foi cancelado devido ao velório do presidente venezuelano Hugo Chávez.
A estadia em solo portenho, que vai durar menos de 24 horas, tem como objetivo a discussão de uma série de assuntos pendentes na agenda bilateral. De acordo com o comunicado oficial do Itamaraty, a agenda bilateral da reunião "é composta por projetos de cooperação em ciência, tecnologia, inovação e sustentabilidade, incluindo iniciativas em energia nuclear, defesa, empreendimentos hidrelétricos, construção de satélites, indústria naval e educação." Além disso, as presidentes discutirão "a defesa da integração regional".
Contudo, um dos temas que deve ser discutido é a revisão do acordo automotivo entre os países, que vence no fim de junho. No acordo vigente ainda hoje, assinado nos termos da Associação Latino-americana de Integração (Aladi), em 2006, e não do Mercosul, consta um dispositivo que tornaria o acordo bilateral neste setor livre de qualquer barreira tarifária a partir de 1º de julho de 2013, como são os outros contratos estabelecidos no âmbito do Mercosul.
Negociadores brasileiros e argentinos estão com reuniões pendentes desde o segundo semestre de 2012 para definir os parâmetros do novo regime automotivo Brasil-Argentina. Na avaliação argentina, a perda de validade de tal documento poderia implicar numa queda de arrecadação que o país não está disposto a aceitar.
O acordo atual prevê que o comércio de veículos entre os vizinhos se baseie no chamado índice flex: um coeficiente de proporção das exportações e importações que significa que, para cada 100 dólares importados, cada país tem direito de exportar 195 dólares sem qualquer imposto. Com o livre-comércio, a Argentina teme acabar importando muito mais do Brasil do que o contrário. Em março Cristina Kirchner já havia mostrado sua intenção de renovar os termos atuais do contrato e manter a situação como está - a balança pendendo muito para o lado argentino.
O encontro das duas presidentes promete ser embalado pelos problemas existentes entre os dois países, como as barreiras protecionistas do governo Kirchner, que limitam a entrada de produtos do Brasil. As medidas estão em crescimento desde 2009.
Balança comercial - A inúmeras barreiras comerciais que o governo argentino têm imposto provocaram uma queda nas exportações do Brasil para a Argentina. Em 2012, as vendas brasileiras para a Argentina despencaram 22%. No primeiro trimestre deste ano, o mercado argentino comprou 10% a menos do Brasil. O primeiro trimestre marcou pela primeira vez em uma década a volta do superávit comercial para o lado argentino da balança, em 87 milhões de dólares.
Além dos conflitos comerciais, acumulam-se os problemas que as diversas empresas brasileiras estão tendo na Argentina. Esse é o caso da Vale do Rio Doce, que cancelou o mega investimento de 6 bilhões de dólares de uma mina de potássio na província de Mendoza.
Os analistas argentinos afirmam que o governo Kirchner provocou o fim da denominada "paciência estratégica" brasileira. Segundo o ex-secretário de Indústria, Dante Sica, diretor da consultoria Abeceb, o caso da Vale pode ser a "gota d'água" que faltava para provocar uma mudança do "velho formato" no qual estava embasada a relação bilateral: "poderia começar uma nova etapa entre o Brasil e a Argentina, na qual os métodos e mecanismos de intercâmbio bilateral e de investimentos teriam que ser redefinidos".
Segundo Sica, depois da partida da Vale, o anúncio de retirada da Deca, que estava instalada na Argentina desde 1995, "parecem dar sinais que reforçam os rumores sobre possíveis decisões em uma direção similar de outras empresas brasileiras, que um tempo atrás pareciam sólidas no país, mas que agora poderiam retirar-se da Argentina".
(com Estadão Conteúdo)

quarta-feira, 24 de abril de 2013

PF pede quebra de sigilo do 'faz-tudo' de Lula

Pedido será encaminhado nesta semana à Justiça Federal de Minas Gerais; inquérito quer desvendar o caminho dos recursos distribuídos no mensalão

Freud Godoy deixa a sede da Polícia Federal em São Paulo (SP) após prestar depoimento, em 2006
Freud Godoy disse que suas contas já foram devassadas pelos órgãos de controle (Fernando Donasci/Folha Imagem)
A Polícia Federal (PF) vai pedir a quebra do sigilo bancário de Freud Godoy, segurança e assessor pessoal do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A medida faz parte do inquérito instaurado para desvendar o caminho percorrido pelos recursos distribuídos no esquema do mensalão e é também um desdobramento do depoimento prestado pelo empresário Marcos Valério Fernandes de Souza à Procuradoria-Geral da República em setembro do ano passado. Valério envolveu o ex-presidente Lula no esquema e afirmou que o mensalão bancou despesas pessoais do petista.
Nesta terça-feira, Valério prestou novo depoimento à PF em Brasília. O operador do mensalão deixou a sede da polícia por volta das 16 horas. O inquérito aberto vai rastrear repasses do mensalão para o ex-presidente. A PF também deve ouvir o auxiliar de Lula nos próximos dez dias, em São Paulo.
O pedido de quebra de sigilo de Godoy será encaminhado ainda nesta semana à Justiça Federal de Minas Gerais. No ano passado, Valério disse aos procuradores ter passado dinheiro para Lula arcar com "gastos pessoais" no início de 2003, quando o petista já havia assumido o Planalto. Os recursos foram depositados, segundo Valério, na conta da empresa de segurança Caso, de propriedade de Godoy, ex-assessor da Presidência e uma espécie de "faz-tudo" de Lula. O ex-presidente nega ter recebido dinheiro do esquema.

Em 22 de fevereiro, o procurador da República Leonardo Augusto Santos Melo solicitou à PF que detalhasse o destino dos recursos do mensalão. No ofício encaminhado à Superintendência da PF em Minas, o procurador transcreveu trechos do depoimento de Marcos Valério. Uma das grandes dificuldades da investigação será driblar a possível ausência de arquivos bancários anteriores a 2008. Normas do Banco Central indicam a obrigação de armazenamento pelo período de cinco anos, no mínimo.
Além de Freud, a PF quer ter acesso aos dados bancários de outras 25 pessoas físicas e jurídicas que também receberam dinheiro das empresas de Valério, condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a quarenta anos de prisão por envolvimento no mensalão.
Ao todo, cerca de 200 pessoas e empresas foram beneficiárias dos negócios do operador do esquema. Parte dos dados já está sendo periciada por uma equipe da Polícia Federal em Minas.
CPI dos Correios – No depoimento no ano passado, Valério afirmou ter havido um repasse de aproximadamente 100 000 reais para a empresa de Godoy. Ao investigar o mensalão, a CPI dos Correios detectou, em 2005, um pagamento feito pela SMP&B, agência de publicidade de Valério, à empresa de Freud Godoy. O depósito foi feito, conforme informou a CPI, em 21 de janeiro de 2003, no valor de 98 500 reais.
O operador do mensalão não detalhou, em setembro passado, quais seriam esses "gastos pessoais" do ex-presidente. O dinheiro teria sido gasto no primeiro mês de governo quando "ainda não se sabia como usar o cartão corporativo", disse Valério no depoimento. Na tentativa de embasar a acusação, Valério entregou cópia do cheque destinado à empresa Caso e emitido pela SMP&B Propaganda.
Dinheiro para campanha – Freud Godoy afirmou que o dinheiro serviu para o pagamento de serviços prestados durante a campanha eleitoral de 2002 por sua empresa. Esses serviços, admitiu Godoy à época da CPI, não foram formalizados em contrato e não houve contabilização das despesas. O "faz-tudo" de Lula afirmou, em resposta às acusações feitas por Valério, que suas contas foram devassadas pelos órgãos de controle.

(Com Estadão Conteúdo)

terça-feira, 23 de abril de 2013

Terrorista cita guerras dos EUA como motivo de atentado em Boston

A saúde de Dzhokhar Tsarnaev passou de 'grave' para 'regular' nesta terça-feira

População se reúne durante um minuto de silêncio em homenagem às vítimas do atentado Maratona de Boston em Copley Square, perto dos locais do bombardeio
População se reúne durante um minuto de silêncio em homenagem às vítimas do atentado Maratona de Boston em Copley Square, perto dos locais do bombardeio - Mario Tama/Getty Images
Dzhokhar Tsarnaev, co-autor do atentado em Boston que permanece internado em um hospital, contou aos investigadores que seu irmão Tamerlan e ele realizaram o ataque para protestar contra as guerras dos Estados Unidos no Iraque e no Afeganistão, publicou nesta terça-feira o jornal americano The Washington Post. Com ferimentos na garganta, o jovem de 19 anos responde às perguntas por escrito e através de gestos. Ele também tem lesões na cabeça, no pescoço, nas pernas e numa das mãos.
Dzhokhar e Tamerlan, de origem chechena, passaram nos últimos anos por um processo de auto-radicalização - a mudança teria ocorrido por meio de páginas na internet e em função da rejeição ao comportamento americano em relação ao mundo muçulmano. Segundo Dzhokhar, os dois perpetraram os atentados por motivos religiosos e atuaram sozinhos - não tinham contatos com grupos terroristas nacionais ou internacionais.
Segundo funcionários próximos à investigação citados pelo Post, Dzhokhar se referiu especificamente à guerra do Iraque - país do qual os EUA retiraram suas últimas tropas em dezembro de 2011 - e do Afeganistão - onde os soldados americanos permanecerão até o final de 2014, de acordo com um plano do presidente Barack Obama.
Acusados - De acordo com o escritório da promotoria dos Estados Unidos, a saúde de Dzhokhar está agora em condição "regular" no centro médico Beth Israel Deaconess, uma melhora em relação ao estado "grave" apontado inicialmente. Indiciado na segunda-feira pelo "uso de armas de destruição em massa contra pessoas e propriedades", ele pode ser condenado à morte ou à prisão perpétua.
Tamerlan morreu em um tiroteio com a polícia na noite da última quinta-feira. Segundo Dzhokhar, seu irmão foi o mentor do atentado realizado na semana passada durante a Maratona de Boston com bombas fabricadas com panelas de pressão. Três pessoas foram mortas, entre elas uma criança de oito anos. Um total de 282 pessoas foram atendidas em diferentes hospitais de Boston após os atentados, segundo dados da Comissão de Saúde Pública da cidade.
Viúva - O advogado de Katherine Russell, viúva de Tamerlan, disse que ela vai cooperar com os investigadores. Ela "fará tudo o que puder" para ajudar na investigação, afirmou Amato DeLuca, defensor da jovem americana de 24 anos, nascida em Rhode Island e convertida ao islamismo.
Segundo o advogado, Katherine, que mudou seu sobrenome para Tsarnaeva, ficou "em choque absoluto" ao saber da participação do marido e do cunhado no atentado. DeLuca afirmou que a viúva de Tamerlan não sabia dos planos dos irmãos para colocar bombas na chegada da Maratona de Boston de 15 de abril. Segundo o advogado, sua cliente soube do fato pela imprensa.
Katherine, que usa o véu muçulmano, refugiou-se na casa de seus pais em Rhode Island, longe dos meios de comunicação e segundo seu advogado está profundamente consternada pelo ocorrido. Tamerlan Tsarnaev e sua esposa tiveram uma filha. Segundo a imprensa americana, o casal pode ter enfrentado problemas relacionados a maus-tratos.
(Com agências EFE e Reuters)

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Exército terá 600 militares contra terrorismo nas Confederações

Mais 250 atuarão contra armas químicas, bacteriológicas e nucleares.
Tropa vistoriou as 6 cidades-sede dos jogos buscando vulnerabilidades.

Tahiane Stochero Do G1, em São Paulo
Armas químicas nucleares  (Foto: Batalhão DQBN/Divulgação)Brasil tem única tropa da América do Sul autorizada
para casos de armas químicas e bacteriológicas
(Foto: Batalhão DQBN/Divulgação)
O Exército terá 600 militares especializados em combate ao terrorismo atuando nas seis cidades-sede da Copa das Confederações, que começa em 15 de junho com a partida entre Brasil e Japão, em Brasília.

Outros 250 homens, treinados para identificar, conter e prevenir ataques com armas químicas, bacteriológicas, nucleares e radiológicas, serão usados em varreduras e descontaminações buscando prevenir qualquer incidente durante os jogos.
Segundo o coronel Richard Fernandez Nunes, que integra o Centro de Coordenação de Prevenção e Combate ao Terrorismo, criado pelo Exército para centralizar as atividades ligadas ao tema durante o evento, o planejamento sobre como as tropas serão empregadas em Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Fortaleza, Recife, Salvador e Brasília, será finalizado em maio.
Em cada uma das sedes da Copa das Confederações haverá tanto um grupo específica para terrorismo e quanto um para defesa química, bacteriológica e nuclear (DQBN, como o termo é como conhecido no meio militar).
“Nesta semana (de 15 a 19 de abril), grupos de 10 homens que atuam nestas áreas visitaram as seis cidades-sede da Copa das Confederações para um reconhecimento inicial, conversar com os órgãos de segurança e de defesa civil para identificar vulnerabilidades, locais que devem ter atenção ou requerem inspeções específicas para prevenir qualquer incidente. Eles farão relatórios que nos trarão dados importantes sobre como iremos dividir as ações com as polícias nestes locais”, disse Nunes ao G1.
exército terrorismo (Foto: Brigada de Operações Especiais/Divulgação)Tropa do Exército treina para combate a terrorismo
em Goiânia (Foto: Brigada de Operações Especiais)
O G1 divulgou no último dia 17 que o atentado na maratona de Boston, nos EUA, que deixou 3 mortos e 176 feridos, preocupou o governo em relação ao tema.

Por um acordo entre os Ministérios da Justiça e da Defesa, a coordenação das atividades de terrorismo na Copa das Confederações, na Copa do Mundo de 2014 e nas Olimpíadas, de 2016, está nas mãos do Exército.

Os militares serão responsáveis ainda pelas ações de contra-terrorismo (pronta-resposta a possíveis ataques), enquanto que a Polícia Federal fará o monitoramento de suspeitos e o levantamento de inteligência para prevenção. Apesar das polícias Civil e Militar de alguns Estados realizarem treinamentos simulando ações contra o terror, elas só irão ajudar quando forem convocadas.
“Em cada cidade-sede haverá um centro de coordenação em que será decidido como iremos dividir as tarefas. Para as polícias dos estados, a atuação em alguns locais é mais rotineira, eles conhecem melhor a região, estão acostumados com o ambiente. O que faremos é atuar de forma conjunta e distribuir capacidades”, explica o oficial.
“Nenhuma agência ou órgão do país é capaz de dar conta sozinho da questão de terrorismo. É uma operação interagências, todos trabalharão integrados”, define.
O risco existe quando há um nível de ameaça e também há vulnerabilidade. Vamos evitar as ameaças e sanar as vulnerabilidades. Ninguém quer que ocorra. Mas se algo ocorrer, estamos preparados"
Richard Nunes
Coronel do Exército
Armas químicas e nucleares
O Brasil possui a única unidade da América Latina certificada pela Organização Internacional para Proibição de Armas Químicas com capacitação para atuar em casos de ataque com agentes químicos, bacteriológicos, nucleares e radiológicos.

O batalhão DQBN do Exército, localizado no Rio de Janeiro, distribuirá ao menos 120 soldados em três cidade-sede dos jogos: Rio, Belo Horizonte e Recife. Cada uma terá 40 homens do ramo. Na capital fluminense ficará ainda um contingente de reserva.
Uma companhia deste batalhão, sediada em Goiânia (GO), empregará outros 50 homens em Brasília. Os mesmos soldados, após o evento de abertura da Copa das Confederações, seguem para Fortaleza. Já uma tropa da Marinha empregará 60 soldados especializados em Salvador.
Armas químicas nucleares (Foto: Batalhão DQBN/Divulgação)Na Rio+20, realizada em 2012, sala de reunião de
presidentes é vistoriada contra agente nuclear
(Foto: Batalhão DQBN/Divulgação)
Já os militares de combate ao terrorismo, treinados no Comando de Operações Especiais, em Goiás, serão agrupados em destacamentos de 80 a 100 cada um nas seis cidades-sede. Um contingente de reserva ficará em Brasília.
“Como os grandes eventos realizados até então no Brasil eram em uma só cidade, a Copa das Federações, com seis cidades atuando de forma simultânea, será um teste de coordenação para a Copa do Mundo, em que teremos jogos em 12 capitais”, explica o coronel.
Desde 2012, o Exército aumentou o ritmo de treinamento dos soldados especializados.  O curso de DQBN, que era realizado a cada dois anos para oficiais e para praças, passou a ser realizado anualmente, e o número de profissionais formados passou de 12 para 24 por vez.

“Até as Olimpíadas de 2016 vamos aceleramos o ritmo dos cursos para duplicar o número de homens que sabem manusear os equipamentos, que são extremamente complexos e capazes de localizar áreas infectadas com material químico ou nuclear e também identificar qual é o agente”, diz o oficial.
Armas químicas nucleares (Foto: Batalhão DQBN/Divulgação)Curso de preparação contra contra armas químicas
no Rio (Foto: Batalhão DQBN/Divulgação)
Mais de R$ 60 milhões foram gastos também para a aquisição de laboratórios e equipamentos com sensores que permitem localizar e descobrir agentes químicos e bacteriológicos dos mais diversos tipos, como a ricina, substância tóxica que pode matar entre 24 e 72 horas e que foi encontrada em cartas endereçadas ao presidente dos EUA, Barack Obama, após os ataques de Boston.

“Já tínhamos estas tecnologias. O que estamos fazendo é adquirindo mais, para termos disponíveis em todas as sedes da Copa das Confederações, e também obtendo materiais novos para descontaminação. Substâncias como a ricina, que são em pó, são mais fáceis de se localizar, porque há um indício da presença. O mais complicado é com o nuclear, é que algo invisível aos olhos. Mas nossos equipamentos são de precisão”, garante Richard.
O pior cenário de um ataque terrorista, segundo o oficial, seria um caso com o uso de qualquer arma química, bacteriológica ou nuclear. “O risco existe quando há um nível de ameaça e também há vulnerabilidade. Vamos evitar as ameaças e sanar as vulnerabilidades. Ninguém quer que ocorra. Mas se algo ocorrer, estamos preparados para isso”, diz.

Lula e Rosemary: silêncio cada vez mais revelador

Ex-presidente fez 27 pronunciamentos em 148 dias - mas nada sobre Rose

Gabriel Castro e Marcela Mattos, de Brasília
Rosemary Nóvoa de Noronha e Lula
Rosemary Nóvoa de Noronha e Lula (AE e Reuters)
Nos oito anos que passou no Palácio do Planalto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sempre teve como característica o hábito de falar constantemente e sobre tudo. Em tempos de crise, chegou a ser aconselhado por assessores diretos e marqueteiros a manter relativa distância dos microfones. Mas, quase nunca, a recomendação foi seguida. É quase unânime a avaliação de aliados que convivem com Lula há décadas que o silêncio nunca lhe agradou, ainda que o tema seja dos mais espinhosos, como o mensalão, que quase lhe custou o mandato. Porém, há cinco meses, um assunto é proibido ao redor do ex-presidente: Rosemary Noronha.
A edição de VEJA desta semana detalha a atuação de Rosemary, ou Rose, como era conhecida, nas entranhas do poder. A mulher que chefiava o escritório da Presidência da República em São Paulo e acompanhava Lula em viagens internacionais usava a proximidade com o petista para negociar favores.
Na época do estouro da Operação Porto Seguro, a Polícia Federal desmontou uma quadrilha que traficava influência nos altos escalões do governo federal. Paulo Vieira, ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA), comandava o grupo.
Rosemary Noronha deve a Lula sua ascensão no poder público. Intimamente ligada ao petista, ela tinha privilégios e integrou, diversas vezes, comitivas presidenciais no exterior. Apesar da grande expectativa a respeito do que o petista teria a dizer sobre o episódio, Lula silenciou desde a operação Porto Seguro, deflagrada em 23 de novembro. Foram 27 pronunciamentos, entre discursos e entrevistas. Mas, em 148 dias, nada explicou sobre as graves acusações envolvendo a mulher que era sua amiga íntima e que foi indicada por ele para chefiar o escritório da Presidência em São Paulo.
Nesse período, Lula deu ordens a secretários do prefeito paulistano Fernando Haddad (PT), despachou com ministros do governo Dilma Rousseff, recebeu prêmios, deu palestras, se reuniu com líderes mundiais, prestou consultoria a empresas brasileiras. Sobre Rose, uma frase discreta, a contragosto, quando questionado se tinha sido surpreendido pelas revelações da Polícia Federal: "Não fiquei surpreso, não".
Lula avalia que não tem nada a ganhar comentando o episódio. Ele afirma, reservadamente, que o silêncio evita que o caso seja associado a ele e contribui para que o escândalo perca força no noticiário.
A postura revela o quanto o ex-presidente se sente desconfortável com a revelação de que a antessala do poder era usada para negociações escusas. Mesmo titubeante, Lula não evitou tecer comentários sobre outros escândalos, como o mensalão, o dossiê dos aloprados ou a morte do prefeito Celso Daniel, um fantasma que assombra o PT. Mas, a cada nova revelação sobre as andanças de Rose, pode se supor o que Lula tanto teme.

domingo, 21 de abril de 2013

Seca, corrupção e incompetência

Uma das maiores estiagens da história castiga 12 milhões de pessoas que vivem no semi-árido brasileiro, enquanto R$ 9 bilhões repassados pelo governo para combatê-la se perdem na ineficiência - e até desvios de dinheiro - do poder público

Josie Jeronimo e Izabelle Torres. Fotos: Yan Boechat
“Tinha o coração grosso, queria responsabilizar alguém pela sua desgraça. A seca aparecia-lhe como um fato necessário.” O romance Vidas Secas de Graciliano Ramos captou a alma de sofrimento do sertanejo no fim da década de 30, quando o Nordeste sofria com uma das oito maiores secas registradas no século XX. Setenta e cinco anos depois, 12 milhões de brasileiros de 1.415 municípios do semi-árido brasileiro ainda estão presos à imagem de terra arrasada, vendo os corpos ressecados de seu gado pregados no chão.
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TRISTE REALIDADE
No município de Jardim, no Ceará, fazendeiro
perdeu 300 cabeças de gado em razão da seca
Algumas regiões sofrem um ciclo de estiagem que já persiste há mais de um ano. O desenho da paisagem permanece o mesmo, mas estudos de migração populacional realizados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostram que a figura dos retirantes, eternizada pelos personagens de Vidas Secas, quase não existe mais.
Programas sociais como o Bolsa Família e de socorro e incentivo a pequenos produtores do semi-árido tiveram sucesso em fixar a população em terras com clima de deserto. De acordo com o pesquisador Helder Araújo, do Ipea, há dez anos a taxa de migração interna era de 5,7%. Hoje é de 4,5%. Alguns municípios do Nordeste que tiveram sucesso com empreendimentos de irrigação, como Petrolina (PE) e Barreiras (BA), até atraíram moradores de outros estados. Mas este cenário positivo não se repete nas obras de infraestrutura. Todos os anos, o governo federal coloca à disposição das autoridades locais aproximadamente R$ 9 bilhões para combate à seca, em programas de gestão hídrica, construção de barragens, canais e ampliação de perímetros irrigados. E todos os anos a maior parte desse dinheiro fica retido nos cofres da União, pois os projetos municipais e estaduais não têm qualidade mínima para atender as exigências – algumas razoáveis, outras puramente burocráticas – de Brasília. Desde julho do ano passado, 34 relatórios sobre a situação das regiões atingidas pela estiagem foram devolvidos aos prefeitos por falhas técnicas e o repasse de recursos foi adiado.
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EM SERRITA, PERNAMBUCO, O ÚLTIMO RECURSO:
para alimentar o gado, família tira o espinho do mandacaru
Outra parte do dinheiro se perde em desvios ligados a conhecidos esquemas de corrupção. A mais ambiciosa obra em áreas de estiagem no Brasil – a transposição do Rio São Francisco – é um bom exemplo da situação. Em 2009, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva empreendeu uma caravana para visitar as obras da transposição, orçada em R$ 4,5 bilhões. Quatro anos depois, o custo do empreendimento subiu para R$ 8,4 bilhões e a transposição continua no papel. Segundo auditoria oficial, cinco dos 14 lotes licitados da obra apresentam fraudes na aplicação dos recursos públicos.
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Neste ambiente, as ações emergenciais cumprem uma função dupla. São obviamente eleitoreiras e humanamente indispensáveis. O governo federal já investiu R$ 800 milhões na compra de cisternas, recipientes que comportam até 16 mil litros de água e podem abastecer uma família por seis meses. Sem critérios claros para a distribuição das cisternas, elas se tornaram até um instrumento para a especulação imobiliária. No Distrito de Rajada, Zona Rural de Petrolina (PE), um terreno de 30 metros quadrados acumula três cisternas, uma fartura que é sinônimo de privilégio e desperdício. Em determinadas regiões do Maranhão, não é possível instalar porque as casas não têm telhados de cerâmica, revelou um técnico da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco, em reunião com a bancada de deputados maranhenses. “O Maranhão foi contemplado com 4.300 cisternas, mas apenas duas mil foram instaladas. A população é tão pobre que as cisternas serão devolvidas para o ministério”, conta o deputado Simplício Araújo (PPS-MA).
Mesmo numa emergência tão grande, a vida não deixa de ser como sempre foi. Quem pensa que a palavra dificuldade sempre rima com solidariedade pode se surpreender. Não faltam denúncias de troca de favores entre chefes políticos locais. Em Delmiro Golveia (AL), o prefeito Luís Carlos Costa se negou a contratar um empresário selecionado pela Defesa Civil porque ele faria parte do grupo político adversário. Em Petrolina, a população denunciou a existência de pelo menos sete carros-pipas fantasmas. Eles constavam na prestação de contas da prefeitura, mas não apareciam nas comunidades.
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RETRATOS DE UM FLAGELO:
em Salitre, no ceará, açude seca (acima), enquanto árvore assume aspecto de um cacto
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Na construção das barragens – método de armazenamento da água da chuva – os exemplos de corrupção e mau uso do dinheiro público se repetem. Por conta do alto nível de evaporação, o retorno em gestão de recursos hídricos não representa sequer 20% do dinheiro investido para a construção das estruturas. Somente este ano, o Ministério Público de Alagoas, Pernambuco e Ceará abriram seis ações para investigar desvios de recursos na construção de barragens. O Tribunal de Contas da União (TCU) também investiga o sumiço de R$ 800 mil destinados a obras da adutora do Agreste, entre Caruaru e Santa Cruz do Capiberibe (PE). A Polícia Federal, por sua vez, descobriu esquema que desviou R$ 48 milhões em convênios.
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VIDAS SECAS
Moradores do município pernambucano de Serrita perderam quase todo o gado,
em decorrência da avassaladora estiagem. Para sobreviver, dependem
quase exclusivamente da água fornecida pelo Exército
A dificuldade do País para enfrentar a seca é histórica e se arrasta por anos. As ideias se sucedem, os planos se multiplicam, mas raras vezes se consegue levá-las adiante de forma coerente. A miséria pode ser amenizada, e é bom que isso aconteça. Mas a seca, desde o início de século XXI, mostra um drama que se repete, como se viu há poucos dias. Apresentado há cinco anos, o projeto 2.447/07, que institui a Política Nacional de Combate às Secas, passou um longo período esquecido. Na semana passada, deputados nordestinos tentaram sensibilizar os colegas para tratar do assunto. Mas a proposta não foi votada sob um argumento cuja lógica é difícil de ser desafiada: a demora para a discussão foi tão grande que já era tarde demais para se fazer alguma coisa. Para o professor de engenharia florestal da Universidade de Brasília, Eraldo Matricardi, a falta de orientação à população é o principal obstáculo ao fim dos grandes transtornos por longos períodos de estiagem. Para ele, técnicas simples de sobrevivência, que possuem baixo custo e seriam de grande utilidade, nem sequer são repassadas aos moradores de re­giões atingidas. “O poder público não se preocupa em ensinar estratégias fáceis, como colocar garrafas enterradas para evitar a mortalidade das plantações. Técnicas simples de irrigação também não são ensinadas e as populações continuam dependendo dos projetos megalomaníacos dos governos”, avalia o professor.
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ESCASSEZ DE COMIDA:
Galho da árvore vira opção de alimento no sertão do Ceará
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