O ex-diretor da estatal Paulo Roberto Costa entrega à Polícia Federal detalhes e nomes de políticos da base aliada do governo envolvidos naquele que pode ser o maior escândalo de corrupção da história da República
Na noite de
sexta-feira 5, a presidenta Dilma Rousseff e o ministro da Casa Civil,
Aloizio Mercadante, convocaram uma reunião emergencial no Palácio da
Alvorada, em Brasília. O encontro, em clima de elevadíssima tensão,
destinou-se a discutir o depoimento à Polícia Federal do ex-diretor de
Abastecimento e Refino da Petrobras, Paulo Roberto Costa, considerado o
principal arquivo-vivo da República e detentor dos segredos da maior
estatal do País sob o jugo petista. Há poucas semanas, Costa dizia que
não haveria eleições neste ano se ele revelasse tudo o que sabe. Desde a
sexta-feira 29, ele começou a cumprir sua ameaça. O teor das
revelações, vazadas até agora, em regime de delação premiada é
nitroglicerina pura. Tão bombástico que um assessor palaciano definiu
assim o estado de espírito dos petistas reunidos no Alvorada: “Estão
todos atônitos. A crise é séria”, afirmou. O depoimento de Paulo Roberto
Costa evidencia a existência de caixa dois de campanha no financiamento
de políticos aliados do governo Dilma.
O DELATOR
Paulo Roberto Costa começou a depor no dia 29 na PF,
em sessões que duraram até quatro horas
Segundo Costa, o PT e seus aliados montaram
uma espécie de mensalão 2.0 na Petrobras. O dinheiro desviado, segundo
ele, irrigava as contas de governadores, 12 senadores, do presidente do
Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o da Câmara, Henrique Eduardo
Alves (PMDB-RN) e pelo menos mais 50 deputados integrantes do PMDB, PP e
PT, partidos da base de apoio à presidenta Dilma Rousseff no Congresso.
Também foi citado por Costa o ministro de Minas e Energia, Edison
Lobão. Participariam do esquema os senadores Fernando Collor (PRB-AL),
José Sarney (PMDB-AP) e a governadora do Maranhão, Roseana Sarney. O
deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), um dos pontas de lança do movimento
“Volta,Lula” no Congresso, também teria sido mencionado pelo ex-diretor
da Petrobras. “Todo dia tinha político batendo na minha porta”, afirmou
Paulo Roberto Costa na delação premiada, com a intenção de dar a
dimensão do estreito relacionamento com grandes empreiteiras e
parlamentares de diversos matizes. Os políticos receberiam, segundo
Costa, 3% do valor dos contratos da Petrobras exatamente no período em
que ele comandava o setor de distribuição da estatal, entre 2004 e 2012.
Ainda em seu depoimento, Paulo Roberto Costa reconheceu pela primeira
vez que as empreiteiras contratadas pela Petrobras eram obrigadas a
fazer doações para um caixa paralelo que abasteceria partidos e
políticos que apóiam Dilma. Haveria, de acordo com ele, um “cartel de
empreiteiras” em todas as áreas da estatal. O ex-diretor da Petrobras
ainda mencionou uma conta de um operador do PMDB em um banco europeu.
Por causa da citação aos políticos, que detém foro privilegiado, os
depoimentos serão enviados à Procuradoria Geral da República. Mas os
procuradores afirmam que só irão receber a papelada ao término da
delação. A expectativa é de que novos nomes de políticos possam
aparecer.
CORRUPÇÃO
Na sede da Petrobras, Costa diz que recebia pedidos
diários de políticos e donos de empreiteiras
A rede de corrupção na Petrobras era ampla.
Os desvios envolveriam desde o funcionário do terceiro escalão até
pesos pesados da cúpula da empresa, durante a gestão de Paulo Roberto
Costa na diretoria de Abastecimento. Não se sabe ainda o montante do
desvio, mas só na construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco,
que custou R$ 40 bilhões e foi a obra mais cara da Petrobras tocada por
Costa, o esquema criminoso movimentou pelo menos R$ 1 bilhão, o que já
faz deste o maior escândalo da República recente. Segundo a Polícia
Federal, os contratos eram superfaturados e o sobrepreço era repassado
pelas empreiteiras ao doleiro Alberto Youssef. Ao doleiro, ainda de
acordo com a PF, cabia a distribuição do suborno aos políticos.
Potencialmente
devastador, o conteúdo dos depoimentos pode até alterar novamente o
rumo das eleições presidenciais. Com viagem marcada para o Rio de
Janeiro na sexta-feira 5, o ministro da Secretaria de Comunicação Social
da Presidência (Secom), Thomas Traumann, teve de permanecer em
Brasília, a pedido da presidenta Dilma, para pilotar o desenrolar da
crise. Dilma se preparava para um comício eleitoral em Porto Alegre.
Diante do novo quadro, voou às pressas para Brasília. Também participou
do encontro no Alvorada o ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso. Na
reunião, ficou acertado que o Planalto entraria em contato com
integrantes da base de sustentação de Dilma para que afinassem o
discurso que seria adotado no fim de semana para rebater as acusações.
Dentro dessa estratégia, o vice-presidente da República, Michel Temer
reuniu-se com lideranças do PMDB de diversos estados, em São Paulo, na
noite de sexta-feira 5. O temor no governo é o potencial do abalo na
campanha eleitoral de Dilma faltando menos de um mês para as eleições.
Os beneficiários diretos seriam, obviamente, a candidata do PSB, Marina
Silva, e o do PSDB, Aécio Neves. A preocupação do Planalto é de que a
eleição seja liquidada no primeiro turno ou que Dilma seja alijada da
segunda etapa da disputa presidencial.
ACUSADOS
Os presidentes da Câmara, Henrique Alves (acima), e do Senado,
Renan Calheiros (abaixo) estão entre os parlamentares
citados por Paulo Roberto Costa
Segundo a PF, os depoimentos de Paulo
Roberto Costa foram longos. No primeiro dia, sexta-feira 29, a delação
teria durado quatro horas. “Estou exausto, mas aliviado”, teria dito
Costa a um advogado do Paraná. As falas do ex-executivo da Petrobras
foram todas filmadas numa sala da Custódia da PF em Curitiba. No final
de cada dia, os depoimentos são lacrados, criptografados pelo Ministério
Público Federal e remetidos à Procuradoria Geral da República.
O depoimento de Paulo Roberto evidencia a existência de caixa dois de campanha
no financiamento de políticos aliados do governo Dilma
no financiamento de políticos aliados do governo Dilma
Alvo da Operação Lava Jato, Paulo Roberto
Costa resolveu abrir o bico porque estava desesperado com a
possibilidade de ser condenado a mais de 30 anos de prisão. O estopim
foi a decisão de PF de promover buscas e apreensões em empresas de suas
filhas, de seus genros e de um amigo dele no Rio de Janeiro. Numa das
empresas alvo da devassa, os agentes da Polícia Federal identificaram
indícios fortes de que o ex-diretor da Petrobras teria mais contas
abertas fora do País. Há três meses, a Suíça transmitiu às autoridades
brasileiras que Costa e seus parentes possuíam US$ 23 milhões em contas
secretas naquele país. Essa foi uma das razões que levou o juiz Sérgio
Moro a decretar em 11 de junho a prisão do ex-diretor da Petrobras.
O DOLEIRO
Alberto Youssef, preso, era o encarregado de distribuir a propina para políticos
Um dos negócios mencionados por Costa
envolvendo Renan Calheiros é a combinação feita com o doleiro Alberto
Yousseff para que o Postalis, fundo de pensão dos Correios, comprasse R$
50 milhões em debêntures emitidos pela agência Marsan Viagens e
Turismo. Yousseff, segundo investigação da PF, era um dos investidores
dessa agência. O doleiro teria encontrado Renan em Brasília, em março
deste ano, para tratar da comissão que caberia ao PMDB no negócio. A
transação, porém, não teria ocorrido por causa da inesperada prisão da
dupla Yousseff e Paulo Roberto Costa. Mas o esquema estava armado. O
fundo de pensão Postalis é controlado por PMDB e PT desde o início do
governo petista. Um notório apadrinhado de Renan, o presidente da
Transpetro, Sérgio Machado, também mantinha estreita relação com Paulo
Roberto Costa, segundo as investigações da PF. O nome de Machado
aparecia por quatro vezes em anotações na agenda do ex-executivo da
estatal. Próximo ao número de celular do presidente da Transpetro,
aparecia uma menção a “curso c/Sérgio Machado, 5%”, ao lado do valor R$ 5
mil e da inscrição “dois meses”.
NO MINISTÉRIO
O ex-diretor da Petrobras envolve também o ministro
das Minas e Energia, Edison Lobão
Reportagem de ISTOÉ havia antecipado em
abril deste ano que o esquema de Yousseff e Paulo Roberto Costa operava
nos Correios. O elo entre o doleiro e a estatal seria a JN Rent a Car,
cujo nome fantasia é Renacar. Esta empresa de aluguel de carros, sediada
em Londrina (PR) e pouco conhecida no mercado, embolsou, em oito anos,
mais de R$ 77,5 milhões em contratos com os Correios. No inquérito da
PF, a JN aparece fazendo transações financeiras com a MO Consultoria, do
doleiro Youssef. De 2005 até 2013, a locadora de veículos multiplicou
seus ganhos nos Correios em até 20 vezes, com a ampliação e renovação
automática de contratos que receberam nada menos que dez aditivos. O
proprietário da JN Rent a Car é uma figura conhecida do meio político e
policial: trata-se de Assad Jannani, irmão e um dos testas de ferro do
ex-deputado José Janene (PP), réu do mensalão que morreu em 2010 de
enfarte e que era um dos parlamentares mais próximos de Youssef. Agora,
um novo elo com a estatal é confirmado, desta vez por intermédio de
Renan.
Segundo o ex-diretor da Petrobras, havia um cartel de empreiteiras em
todas as áreas da estatal. Elas utilizavam um operador do
PMDB que tinha uma conta num banco europeu
todas as áreas da estatal. Elas utilizavam um operador do
PMDB que tinha uma conta num banco europeu
CAMPANHA
Dilma com Lula e Lobão nos tempos em que era ministra:
escândalo deve virar arma da oposição contra a presidenta
Paulo Roberto Costa entrou na Petrobras em
2003 pelas mãos do ex-presidente Lula. Paulinho, como era conhecido, era
considerado uma das pessoas mais próximas do ex-presidente da estatal
José Sérgio Gabrielli. Delação premiada ou colaboração com a Justiça é a
figura jurídica que prevê a redução de pena quando um réu fornece
informações que possam esclarecer outros crimes. O acordo de Paulo
Roberto Costa com a PF prevê que ele seja colocado em liberdade tão logo
encerre os depoimentos. O trato precisa ser chancelado pelo Supremo
Tribunal Federal, em processo que tem como relator o ministro Teori
Zavaski. Confirmado o acerto, depois de solto, ele ficará um ano, em sua
casa no Rio de Janeiro, usando uma tornozeleira eletrônica, sem pode
sair para a rua. Até duas semanas atrás, o ex-executivo reclamava que
estava sendo submetido a regime disciplinar muito rigoroso nas
dependência da PF em Curitiba. Depois que começou a fazer suas
revelações, o tratamento ficou mais brando.
O doleiro Youssef teria um encontro com Renan Calheiros
para tratar de uma negociação nos correios
para tratar de uma negociação nos correios
PT ATINGIDO
Deputado Cândido Vacarezza teria sido um dos beneficiários
do esquema de corrupção na Petrobras
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