A dura missão do general Carlos Alberto dos Santos Cruz, comandante da mais importante operação da ONU no mundo. Ele tem a tarefa de dar fim ao maior conflito armado desde a Segunda Guerra Mundial, com quase seis milhões de mortos
Por Yan Boechat (yan@istoe.com.br) (textos e fotos), enviado especial ao Congo
As primeiras
horas da manhã da quinta-feira 17 de abril estavam especialmente quentes
na densa floresta que serve de fronteira natural entre a República
Democrática do Congo e Uganda. Antes de se embrenhar pela vereda de
terra entre as árvores, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz retirou
o colete à prova de balas e o capacete. ?Se algo acontecer, é preciso
ser ágil?, explicou. ?O caminho é perigoso, as emboscadas são comuns.? O
general tinha usado esse equipamento de mais de 15 quilos, capaz de
segurar balas de fuzil AK-47, durante todo o trajeto de 40 quilômetros
entre o batalhão da ONU na cidade de Beni e a trilha que o levaria a uma
base rebelde conquistada pelo Exército congolês uma semana antes.
Santos Cruz vestia a farda camuflada das
Forças Armadas brasileiras. No ombro esquerdo, a bandeira do Brasil. No
direito, a palavra ?comandos?, que em todo o mundo militar carrega o
mesmo significado: ali está um soldado das tropas de elite, um cara
durão, preparado para sobreviver na adversidade. Três pequenas estrelas
costuradas nas pontas do colarinho o distinguem como um general de
divisão. Além do FAL, o fuzil usado pelo Exército brasileiro há quase
três décadas, Santos Cruz levava uma pistola Glock 9mm no coldre colado à
coxa direita.
À medida que avançava, o acesso no terreno
úmido da floresta tropical a poucos quilômetros ao sul da linha do
Equador ia se estreitando. O sol logo desapareceu sob a copa das
árvores. Santos Cruz teve a sensação de que estava na Amazônia. ?É igual
ao Brasil, não muda nada?, disse. Na longa marcha até a principal base
conquistada do grupo inimigo, a paisagem dava ideia de como havia sido o
combate: troncos perfurados por tiros, árvores derrubadas pelo impacto
das RPGs, o chão coberto por um tapete metálico de cápsulas deflagradas.
Cartazes escritos à mão indicavam a localização de minas e explosivos.
Um pouco mais adiante, covas rasas ao lado da trilha ainda exalavam o
cheiro forte dos corpos recém-enterrados pelos vencedores. ?Muitos foram
queimados, outros enterramos aqui mesmo, é menos trabalho?, explicou um
soldado congolês ao lado do amontoado de terra fofa onde as moscas
tentavam encontrar caminho para chegar aos restos putrefatos dos
inimigos.
Foram três horas de uma caminhada tensa.
Com os rebeldes ainda a poucos quilômetros dali, o risco de uma
emboscada não recomendava pausas para descanso. A tropa só parou ao
chegar a Medina, um vilarejo improvisado no meio da floresta que o grupo
radical islâmico ADF usava como uma de suas maiores bases no Congo.
Logo começaram a surgir da floresta centenas de soldados. Sujos e
cansados, carregando colares de munição e armamento pesado, eles
saudavam Santos Cruz. Pela primeira vez, viam naquele front de batalha
um militar tão graduado da ONU. O general brasileiro apertou a mão dos
oficiais que combateram os rebeldes islâmicos. Aos soldados, distribuiu
cigarros congoleses baratos, comprados a US$ 1 o maço.
?Force Commander?
No Congo, a patente de Santos Cruz importa
menos que seu cargo na hierarquia militar da ONU. Ele é o
comandante-geral da Monusco, a maior e mais importante missão das Nações
Unidas no mundo, com um contingente de mais de 22 mil homens de 20
diferentes países e orçamento anual de quase US$ 1,5 bilhão. É uma
missão histórica, em que o conceito de manutenção da paz foi alterado
para imposição da paz. Não se trata apenas de semântica. Os capacetes
azuis, pela primeira vez desde 1948, têm autorização para caçar, prender
e matar aqueles que o Conselho de Segurança considerar inimigos. Na
prática, isso significa que os soldados das Nações Unidas podem dar o
primeiro tiro, tornando-se, assim, uma força de agressão ? a primeira
desde a criação da organização.
O militar brasileiro foi indicado e
responde ao secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, e ao
Conselho de Segurança. No Congo, ele divide o comando da missão com um
representante civil, o alemão Martin Kobler. São os dois que têm, ao
menos oficialmente, a última palavra em qualquer decisão, militar e
civil. A guerra no Congo dura quase 20 anos e já deixou cerca de 5,5
milhões de pessoas mortas. Nenhum outro conflito armado matou tantos
seres humanos desde a Segunda Guerra Mundial.
Apesar de ser o primeiro brasileiro a
comandar forças militares de agressão desde a campanha da FEB na Itália,
um ano e pouco atrás, em Brasília, onde mora, Santos Cruz estava mais
preocupado com caminhões-pipa no Nordeste brasileiro do que com
guerrilheiros africanos. O general foi compulsoriamente para a reserva
em 2012, ao ser preterido para ascender à patente de general de
exército. Com a carreira militar encerrada, trabalhava na divisão
militar da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da
República, em Brasília, cuidando de assuntos como a participação do
Exército na distribuição de água potável em regiões afetadas pela seca.
?Eu havia abandonado a farda, estava lá, engravatado, num gabinete da
Esplanada, quando recebi, em março de 2013, uma ligação de Nova York?,
contou ele à ISTOÉ no mês passado, enquanto comia com as mãos uma coxa
de galinha frita na cantina do quartel-general da ONU em Goma, a capital
da província do Kivu do Norte, onde estão concentrados 95% dos
capacetes azuis no país. ?Foi uma surpresa , mas não demorei três
segundos para aceitar aquele convite inesperado.?
ATIVO
Santos Cruz viaja pelo menos três vezes por semana a regiões
isoladas do leste do Congo; em casa, gosta de assistir
aos telejornais da rede de tevê Al Jazeera
Santos Cruz é um homem que ri pouco.
Natural da cidade de Rio Grande, no litoral gaúcho, o general aparenta
ter bem menos que os 62 anos que vai completar no dia 1º de junho.
Mantém seus 74 quilos com uma rotina de atleta. Corre dez quilômetros,
dia sim, dia não, e segue um programa rígido de exercícios físicos. O
sotaque forte dos gaúchos se foi faz tempo, assim como o hábito de tomar
chimarrão. O militar deixou o Rio Grande do Sul aos 15 anos, quando foi
aceito na Escola Preparatória de Cadetes do Exército, em Campinas, em
1968. ?O que ficou foi a paixão pelo Internacional de Porto Alegre?, diz
ele. Toda vez que seu time vence o Grêmio, Santos Cruz liga para um
irmão torcedor do rival.
Em Goma, o general brasileiro vive em uma
confortável casa de dois quartos, próxima do quartel-general da ONU, que
divide com um alto funcionário civil das Nações Unidas. Dois
brasileiros fazem a escolta pessoal do general e um grupo de seis
soldados das forças especiais uruguaias, equipados com fuzis FAL e uma
caminhonete com uma metralhadora Mag instalada na carroceria, completam o
time da segurança. Se ele está em casa, os uruguaios fazem patrulha em
frente ao seu portão. Se ele se desloca, lá estão os mesmos soldados
cercando seu veículo. O general não dá um passo sem que ao menos oito
homens estejam acompanhando seus movimentos.
Carlos Alberto dos Santos Cruz, casado, três filhos e avô de um menino, fez uma carreira típica no Exército brasileiro. Poucos anos depois de graduar-se na Academia Militar das Agulhas Negras, em 1974, seguiu para o que parece ser a obsessão dos militares nacionais: a Amazônia. Lá se tornou um especialista em guerra na selva. Nas duas décadas seguintes, sempre esteve, de uma forma ou de outra, próximo da floresta. Comandou pelotões de fronteira na região Norte e um batalhão de infantaria em Mato Grosso. Não à toa, dos seis brasileiros que lhe prestam assistência direta no Congo, quatro são especialistas em guerra na selva ou têm experiência na Amazônia.
Carlos Alberto dos Santos Cruz, casado, três filhos e avô de um menino, fez uma carreira típica no Exército brasileiro. Poucos anos depois de graduar-se na Academia Militar das Agulhas Negras, em 1974, seguiu para o que parece ser a obsessão dos militares nacionais: a Amazônia. Lá se tornou um especialista em guerra na selva. Nas duas décadas seguintes, sempre esteve, de uma forma ou de outra, próximo da floresta. Comandou pelotões de fronteira na região Norte e um batalhão de infantaria em Mato Grosso. Não à toa, dos seis brasileiros que lhe prestam assistência direta no Congo, quatro são especialistas em guerra na selva ou têm experiência na Amazônia.
Agressividade
A grande virada na carreira do general veio
em 2006, quando foi apontado como o chefe militar da missão da ONU no
Haiti. Foi por conta de sua ação enérgica na tomada da favela Cité
Soleil, um enclave de criminosos em Porto Príncipe, a capital do país,
que o general brasileiro chamou a atenção dos burocratas das Nações
Unidas. Quase 40 dias de batalha ? com baixas civis duramente criticadas
por organizações humanitárias ? garantiram a tomada do local pelas
tropas da Minustah, majoritariamente brasileiras. Ao final do período em
que liderou a missão, a ONU pediu ao Brasil que mantivesse Santos Cruz
no comando da operação por pelo menos mais um ano. O Exército, no
entanto, recusou o pedido e o general gaúcho retornou ao País. ?A
atitude agressiva e a determinação em agir e correr riscos foram
determinantes para que seu nome fosse lembrado em Nova York. Ele está
aqui no Congo por causa do Haiti e não pela influência política do
Brasil no Conselho de Segurança?, diz um experiente analista de
inteligência das Nações Unidas.
No amplo complexo militar e civil que a ONU
montou em Goma para ser o quartel-general de sua missão no Congo,
Santos Cruz é um dos poucos oficiais a andar armado o tempo todo. A
pistola 9mm sempre está ao alcance da mão e, por onde se desloca,
carrega o fuzil FAL de fabricação argentina que pegou emprestado do
batalhão uruguaio instalado na cidade. Mesmo em seu escritório ? uma
sala simples, de cerca de seis metros quadrados, instalada em um
contêiner ?, invariavelmente o fuzil está encostado na parede, ao lado
de sua cadeira. ?Ele gosta de manter essa imagem, mostrando aos soldados
que, mais que um general, é um soldado como todos eles?, diz o major
Pethias Mdoka, do Exército Malaui, que atuou diretamente com o
brasileiro no último ano.
Santos Cruz chegou ao Congo em julho de
2013, num momento de fragilidade da missão. Após quase 15 anos atuando
no país, a ONU tinha sofrido sua maior derrota e humilhação havia poucos
meses. Em novembro de 2012 um grupo rebelde supostamente financiado por
Uganda, o M23, derrotou o Exército congolês, invadiu Goma e forçou os
capacetes azuis a se refugiarem nos quartéis, deixando a população civil
à mercê dos invasores. Foi a partir dessa derrota que as Nações Unidas
decidiram criar uma força especial de ataque, a Force Intervention
Brigade (FIB), e dar carta branca para o ataque. Santos Cruz recebeu a
missão de expulsar o M23 de Goma, retomar a cidade e reconquistar a
confiança da população e da comunidade internacional na ONU.
A grande batalha
Na longa planície que liga Goma ao vilarejo
de Kibati, o primeiro foguete disparado por um lançador Katiuscha de
fabricação russa caiu cerca de 400 metros abaixo da trincheira escavada
no topo do pequeno morro em que Santos Cruz observava a movimentação das
tropas. O segundo, 400 metros atrás. ?Foi uma ação típica de ajuste de
tiro da artilharia. Eles sabiam que estávamos lá e tentavam nos
acertar?, contou o general. A terceira explosão aconteceu a menos de 30
metros. Deitados na trincheira, os militares puderam ouvir os estilhaços
voando sobre suas cabeças. Em seguida, o M23 passou a atingir a
periferia de Goma, logo atrás da elevação onde estava Santos Cruz. ?Foi
naquele momento que decidi atacar e ordenei que nossos helicópteros e
nossa artilharia abrissem fogo contra eles.?
Naquela tarde do dia 21 de agosto de 2013,
pela primeira vez na história, a ONU abandonou sua política de isenção e
neutralidade e partiu para o ataque, apoiando o Exército congolês tanto
com artilharia e fogo aéreo quanto com homens no solo. ?Foi uma batalha
intensa, com centenas de mortos e com características muito semelhantes
àquelas da Segunda Guerra Mundial?, disse o general. Da trincheira,
observando o avanço das tropas e os disparos de artilharia, vieram-lhe à
cabeça velhos filmes da Segunda Guerra. ?E de repente eu estava lá,
como um dos personagens, participando daquele filme?, contou ele.
Logo no primeiro dia de combate, com
foguetes e morteiros explodindo a poucos metros da base de comando,
Santos Cruz começou a forjar a imagem do general que gosta de estar no
campo de batalha. ?Ele mostrou que não é um político, que não aceita
ficar no escritório e trata os soldados de igual para igual?, disse à
ISTOÉ o general tanzaniano James Mwakibolwa, que atuou na defesa de
Goma. Ao longo de toda a campanha contra o M23, o general brasileiro
esteve no front. Hoje, ao menos três vezes por semana, vai de
helicóptero às áreas mais remotas do leste do Congo para ver de perto
como estão sendo conduzidas as operações contra as dezenas de grupos
armados que permanecem ativos na região. Para muitos na ONU, Santos Cruz
se expõe em excesso. ?Esse não é o papel de um general, de um ?force
comander?. Ele é um alvo muito valioso e parece fazer isso apenas para
criar uma imagem de durão?, critica um oficial indiano. Já Santos Cruz
tem uma explicação mais singela. ?Eu poderia dizer que vou ao front por
questões estratégicas, para incentivar meus homens ou mesmo para dar a
impressão à população local de que a ONU se importa com ela?, disse o
general pouco antes de embarcar em um helicóptero Orix a caminho de uma
vila atacada em meados de abril por um grupo rebelde. ?Tudo isso é
verdade, mas o que me leva mesmo ao front é o fato de que eu gosto muito
de estar lá, de estar perto dos soldados. Eles me dão coragem e me
rejuvenescem.?
A batalha de Goma durou sete dias e forçou o
M23 a recuar. A cidade estava liberada e em dois meses o grupo rebelde
financiado por Uganda, um dos mais bem armados da região, foi derrotado.
?Santos Cruz chegou ao Congo com uma atitude absolutamente distinta da
de todos os outros comandantes que estiveram por lá na última década,
uma atitude muito proativa. É claro que essa não é a solução para todos
os problemas, mas, sem dúvida, trouxe mudanças?, diz Jason Stearns,
autor do aclamado ?Dancing in the Glory of Monsters: The Collapse of the
Congo and the Great War of Africa? (Dançando pelos Monstros: o Colapso
do Congo e a Grande Guerra da África), ainda não publicado no Brasil.
A guerra do Congo é um conflito complexo,
com muitos atores e interesses econômicos e geopolíticos variados. Seu
início tem raízes no genocídio perpetrado pela etnia hutu contra os
tutsis, em Ruanda, há 20 anos. A matança desestabilizou toda a região
dos Grandes Lagos Africanos, no centro do continente, e dragou para a
guerra seis países ? Ruanda e Uganda, de um lado, e Congo, Tanzânia,
Zimbábue e Angola, do outro. O Congo foi o palco de todas as batalhas do
que ficou conhecido como a Grande Guerra Africana.
Oficialmente, o conflito terminou com um
acordo de paz em 2002. Com o país destruído, com a absoluta ausência do
Estado e uma diversidade de riquezas em uma vasta área sem controle e
lei, dezenas de grupos armados passaram a dominar regiões inteiras do
país. Desde então, o leste do Congo vive uma guerra sem-fim, com
milícias lutando entre si, contra o próprio Exército congolês e contra
exércitos estrangeiros, como as Forças Armadas de Ruanda, que ainda
caçam os hutus responsáveis pelo genocídio de 20 anos atrás. Os civis
são as maiores vítimas. Estima-se que até hoje entre 5,5 milhões e seis
milhões de pessoas tenham morrido. Outros três milhões vivem em campos
de refugiados. Dezenas de milhares de mulheres foram vítimas de estupros
coletivos, que se tornaram uma arma de guerra.
Diante de um cenário tão complexo, Santos
Cruz sabe que não será por meio de armas, tanques e helicópteros que a
situação será resolvida. ?A saída sempre é política e passa pelo
fortalecimento do Estado?, disse ele. ?Minha missão aqui é proteger os
civis e desarmar os grupos rebeldes, que, na verdade, são apenas
criminosos que se aproveitam da ausência do Estado. O problema não é
étnico ou ideológico, como pode ter sido no início, há duas décadas.
Hoje a razão desse conflito é econômica, porque esse é um dos países
mais ricos do mundo.?
O Congo possui vastas reservas minerais.
Estima-se que em seu subsolo esteja guardado algo como US$ 24 trilhões
em ouro, cobalto, cobre, diamante e coltan, um mineral amplamente
utilizado na produção de notebooks e celulares e do qual o país é o dono
da maior reserva do mundo. Quase todos os grupos rebeldes que atuam no
leste do país exploram essas riquezas e usam nações vizinhas para
exportá-las para os Estados Unidos, Europa e Ásia. ?Não resta muito a
Santos Cruz além de ser o homem corajoso desse show?, observou Fidel
Bafilemba, um dos coordenadores da organização Enought Project, que
acompanha de perto a crise congolesa há vários anos. ?Não há muito o que
ele possa fazer sem que a comunidade internacional tome a decisão de
parar de importar as riquezas minerais do Congo a preços baixíssimos,
como ocorre hoje.?
A posição de Fidel não é muito diferente da
de outros integrantes de entidades que atuam no país. A organização
Médicos Sem Fronteiras, que mantém no Congo sua maior operação no mundo,
também é bastante crítica ao novo papel que a ONU vem tendo no
conflito. ?A decisão de abandonar o papel de neutralidade está
comprometendo todo o serviço humanitário que tem sido desenvolvido aqui
nos últimos anos?, diz Bertrand Perrochet, chefe da missão belga da
Médicos Sem Fronteiras no Congo. ?A população não sabe mais se um
helicóptero branco da ONU vai distribuir medicamentos ou balas.?
No início da tarde do sábado 19 de abril, o
general Santos Cruz embarcou na caminhonete Land Cruiser blindada que
tem à sua disposição para saborear um típico churrasco gaúcho no
batalhão do Uruguai, o Urubatt. O quartel-general do contingente de mais
de 700 soldados uruguaios fica nas proximidades do aeroporto de Goma e é
uma espécie de segunda casa para o general e para os seis brasileiros
que atuam diretamente como seus motoristas, auxiliares administrativos e
seguranças. Nos 15 dias em que a reportagem de ISTOÉ acompanhou a
rotina do militar brasileiro, Santos Cruz só foi capaz de soltar uma
gargalhada nas duas vezes em que esteve no Urubatt. Ali parece ser o
único lugar em que ele consegue relaxar. ?Eu respeito muito as ONGs, mas
acho que muito mais poderia ser feito. Milhões e milhões são gastos
aqui, mas não há coordenação, não se vê esse dinheiro sendo aplicado
diretamente na melhoria do país.? Ele trata as críticas que recebe como
meras especulações. ?Ainda não houve um caso concreto de problemas pela
cor dos veículos ou helicópteros.?
Santos Cruz é presença constante nas festas
mensais promovidas pelo batalhão do Uruguai e que atraem tanto
militares quanto civis a serviço da ONU. Batizadas de Tango Bar, as
noitadas são agitadas e a pista de dança, quase sempre animada com
música latina, é incrementada pela sirene vermelha de um caminhão
estacionado ao lado do bar montado para atender a clientela sedenta por
momentos de descontração. Na última festa, organizada no dia 12 de
abril, Santos Cruz vestia calça jeans, uma camisa social branca e um
colete de lã vermelho. Aproveitou a pista de dança para descontrair.
Nas próximas semanas, Santos Cruz será
oficializado pelo Conselho de Segurança da ONU como o escolhido para
liderar a missão no Congo por mais um ano. Apesar de não confirmar, ele
já foi consultado por Nova York se aceitaria ficar mais 12 meses à
frente da Monusco ? e aceitou. ?Quando voltar para o Brasil, vou andar a
cavalo?, conta ele, um praticante do Concurso Completo de Equitação,
espécie de triatlo hípico responsável por matar quase uma dezena de
cavaleiros no mundo todos os anos. ?O concurso completo é o esporte que
mais se aproxima de uma batalha militar, você corre riscos o tempo todo e
eu preciso disso para viver.?
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