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domingo, 28 de agosto de 2011

Os padrinhos e suas obras irregulares

No universo das obras irregulares espalhadas pelo País há um emaranhado de ligações entre empreiteiras e políticos influentes. As empresas dependem de apoio no Congresso para encaminhar emendas de seu interesse e fazer lobby junto ao governo. Em contrapartida, são as primeiras a abrir generosamente seus cofres em época de eleição. Depois de eleitos, os parlamentares tornam-se grandes articuladores em defesa dos repasses de recursos. Levantamento feito por ISTOÉ com base em 161 processos abertos pelo Tribunal de Contas da União, referentes à manutenção das rodovias nacionais, mostra que pelo menos seis deputados e senadores – padrinhos de obras com irregularidades graves – engordaram caixas de campanha graças a doações das empreiteiras responsáveis por esses projetos.

O deputado Edson Giroto (PR-MS) é um exemplo dessas relações contaminadas. Depois de atuar como secretário de infraestrutura em seu Estado, foi eleito com a bandeira que criou condições para a construção do Terminal Intermodal no Mato Grosso do Sul, além da promessa de levantar ainda mais recursos em Brasília. Orçada em R$ 26 milhões, a obra foi enquadrada pelos auditores por sobrepreço e falhas na fiscalização realizada pelo Ministério dos Transportes. Enquanto as empresas envolvidas tentavam se explicar e sanar as irregularidades, Giroto recebeu em sua campanha no ano passado doação de R$ 163 mil da Consegv Planejamento, uma das empreiteiras contratadas. Indagado por ISTOÉ sobre suas relações com a construtora, Giroto preferiu não se pronunciar.

Em Goiás, o esquema de troca de favores também funciona. O orçamento inicial para as obras da BR 060, no trecho Goiânia-Jataí, é estimado em R$ 48 milhões. Segundo o TCU, o prejuízo ao erário causado pelas irregularidades passa de R$ 34 milhões. Os recursos para a BR 060 contam com o apoio e a influência do líder do PTB na Câmara, deputado Jovair Arantes. Coordenador da bancada, ele tem assinado ofícios endereçados a ministros pedindo recursos para a estrada e frequentemente vai aos ministérios fazer os pedidos pessoalmente. Mas não vê nada de mais em seus movimentos. “Trata-se de uma articulação normal para conseguir recursos”, diz. Na verdade, Arantes se beneficia com essa atuação. No ano passado, recebeu da empresa Egesa Engenharia R$ 100 mil para sua campanha à Câmara. “Eles doaram porque sou amigo desse pessoal. Sou grato pela ajuda e não nego minhas amizades”, reconhece.

Outro parlamentar que tem atuado na Esplanada a favor de empreiteiras é o senador Jorge Viana (PT-AC). Uma obra que Viana defende com afinco é o anel rodoviário no corredor fronteira-norte na BR-364, no Acre. Orçado em mais de R$ 1 bilhão, o projeto apresentou falhas, como pagamentos indevidos e movimentação irregular da conta do convênio. Duas das empreiteiras contratadas fizeram doações ao comitê da campanha do petista ao Senado. A construtora Etam repassou R$ 100 mil e a Marts, R$ 5 mil. Viana pressiona pela continuidade das obras apadrinhadas, desde o tempo que governou o Acre. Cinco inquéritos foram abertos pela Polícia Federal para apurar denúncias envolvendo as obras na rodovia BR-364. Viana não entra em detalhes, diz apenas que as contas de sua campanha foram aprovadas pela Justiça Eleitoral.

O senador Benedito de Lira (PP-AL) também tem ligações cordiais com empresas que compõem a lista de responsáveis por irregularidades. Discreto na atuação parlamentar, o político alagoano é frequentador assíduo de gabinetes ministeriais na tentativa de angariar recursos para a BR-101 Sul. Não por coincidência, Benedito foi o único da bancada a receber doação direta de R$ 200 mil da construtora Constran, uma das responsáveis pelas obras. Os trechos alvos da auditoria do TCU apresentaram orçamento base de R$ 29,8 milhões e superfaturamento de 43% desse valor. Em Minas Gerais, a adequação de trecho rodoviário na BR-135, com orçamento inicial de R$ 488 milhões, também chama a atenção. O TCU encontrou irregularidades nos procedimentos de licitação e superfaturamento em diversos trechos. A obra é defendida pela bancada mineira há anos. Em 2009, recebeu R$ 22 milhões em emendas coletivas. Pelo menos duas das empresas que participam dos consórcios retribuíram parlamentares na campanha do ano passado. As empresas Engesolo e Fidens doaram juntas R$ 400 mil para o comitê do deputado Eduardo Azeredo (PSDB-MG) e R$ 120 mil para o de Rodrigo de Castro (PSDB-MG). Azeredo garantiu à ISTOÉ que não tem nada a ver com a conduta das empresas.

O superfaturamento nas obras tem sido o principal problema no rol dos 161 processos abertos pelo TCU nos últimos anos para analisar obras comandadas pelo DNIT. “As falhas geralmente já vêm incluídas nos editais, que trazem preços muito superiores ao valor real”, conta André Mendes, secretário de fiscalização de obras do tribunal. A atuação do TCU na fiscalização do uso de recursos públicos em rodovias pode ser prejudicada pelo Congresso. O dispositivo da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2012 vincula a validade das conclusões dos auditores ao parecer de um ministro da Corte. Na prática, significa que, até a decisão de um dos ministros, não haverá punições. A mudança na legislação foi interpretada como uma brecha para permitir a continuidade de obras com irregularidades graves. E mais: com a garantia de que as construtoras vão ganhar tempo antes da suspensão dos pagamentos. A troca de favores, portanto, vai bem além das eleições. E quem paga a conta é o contribuinte.

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