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sábado, 19 de julho de 2014

Por que o ataque criminoso

O que pode ter levado ao disparo do míssil que derrubou o avião da Malaysia Airlines no leste da Ucrânia, matando 298 pessoas

Mariana Queiroz Barboza (mariana.barboza@istoe.com.br)
As tensões entre Rússia e Ucrânia, que começaram com protestos de rua em novembro, já resultaram na renúncia de um presidente, na anexação da Crimeia pelos russos e em intensos combates que, há quatro meses, desestabilizam o leste do país. Mas, na quinta-feira 18, um elemento novo e surpreendentemente cruel foi adicionado à disputa: a queda de um avião da Malaysia Airlines – a mesma responsável pelo voo MH379 que desapareceu em março –, numa área controlada por rebeldes separatistas da autoproclamada República Popular de Donetsk (RPD). A aeronave foi abatida muito provavelmente por um míssil terrestre originário de um sistema chamado Buk, que tanto o Exército russo quanto o ucraniano possuem. Desenvolvido pela antiga União Soviética, ele atinge alvos numa altitude entre 11 mil e 30 mil metros. Os rebeldes negam ter um sistema antimísseis tão sofisticado e admitem que o aparato que têm à disposição é incapaz de lançar um míssil acima de 4 mil metros, mas há relatos da mídia estatal russa (não confirmados por outras fontes) de que, no fim de junho, os rebeldes de Donetsk capturaram uma instalação antiaérea ucraniana. Quem, afinal, atacaria um avião comercial insuspeito, com 298 pessoas a bordo, que trafegava num espaço aéreo sem restrições?
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Para a Ucrânia e para os Estados Unidos, não há dúvidas de que foram os rebeldes. Petro Poroshenko, presidente da Ucrânia, apressou-se em classificar o fato como um “ato terrorista”, em referência aos separatistas da região. O presidente americano, Barack Obama, classificou a tragédia como um “ultraje de proporções indizíveis.” De acordo com o jornal ucraniano Kyiv Post, em conversas interceptadas pela agência de segurança nacional, um dos líderes da RPD, Igor Bezler, teria assumido a um oficial da inteligência militar russa a derrubada de um avião, 20 minutos depois da queda do MH17. A gravação dá a entender que eles pensavam ser uma aeronave militar ucraniana e ficaram surpresos ao perceber que era um transporte civil. O líder separatista, então, descreve os escombros, os corpos de mulheres e crianças, e itens encontrados, como toalhas e remédios. Em outro trecho, um militante identificado como Nikolay Kozitsin sugere que havia espiões a bordo e afirma: “Eles não deveriam estar voando. Há uma guerra acontecendo.”
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DESESPERO E DOR
Familiares de passageiros do avião da Malaysia Airlines se desesperam
com a confirmação da derrubada da aeronave
Especialistas dizem que não é incomum aviões sobrevoarem zonas em conflito. O MH17 estava a 10 mil metros. “Ele seguia uma rota autorizada e conhecida e, até aquele momento, os combatentes na área não haviam demonstrado a capacidade de atirar mísseis a esse alcance,” disse à ISTOÉ Kevin Ryan, diretor de Defesa e Projetos de Inteligência do Centro Belfer para Ciência e Assuntos Internacionais, da Universidade de Harvard. Já na quinta-feira 17, as companhias aéreas que trafegam na tradicional via L980, que liga a Europa à Ásia, redirecionaram seus voos para evitar o espaço aéreo ucraniano. Desde abril, a Organização da Aviação Civil Internacional, ligada à ONU, alerta as empresas sobre o espaço aéreo que cobre a Crimeia por causa de disputas entre a Rússia e a Ucrânia. Na semana passada, Kiev acusou Moscou de participação na derrubada de outros dois aviões, um AN-26 e um caça SU-25 ucranianos – o que foi considerado “absurdo” pelo Ministério da Defesa da Rússia. A derrubada do MH17 seria o primeiro desastre relacionado ao conflito na região envolvendo um avião comercial.
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Ao fazer essas acusações, a Ucrânia assume que o Kremlin desempenha papel ativo no apoio aos separatistas. Embora a Rússia negue, seus rivais suspeitam que o país forneça armamentos e veículos militares aos rebeldes, e enfatizam que os principais líderes dos militantes têm nacionalidade russa. “Não é um acidente que a Rússia tenha enviado pessoas-chave à Ucrânia para desestabilizar não só o país, mas a região toda”, disse à ISTOÉ Kristina Wilfore, cientista política e ex-diretora do escritório na Ucrânia da ONG americana National Democratic Institute. “Putin poderia encerrar esse conflito num dia ao dizer aos separatistas apoiados pela Rússia no leste da Ucrânia que parem e ao deixar de enviar dinheiros e armas.” Na quarta-feira 16, os EUA e a União Europeia anunciaram uma nova rodada de sanções mais duras contra a Rússia por seu engajamento no conflito separatista e evidências de que seu suporte aos rebeldes cresceu no último mês. Caças russos também teriam sido responsáveis por um ataque que matou 11 pessoas na cidade de Snizhne, na região de Donetsk, na terça-feira 15.
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DESTROÇOS
A queda do avião da Malaysia Airlines deixou corpos e destroços espalhados
por um raio de 15 quilômetros na região da cidade de Grabovo, leste da Ucrânia
A agência russa RIA Novosti, em contrapartida, disse que, no dia anterior à queda do MH17, o Exército ucraniano deslocou sistemas de defesa aérea para as proximidades da cidade de Donetsk. Não seria o primeiro incidente envolvendo as Forças Armadas do país, já que, em 2001, a Ucrânia derrubou um avião da Siberian Airlines, que ia de Tel Aviv, em Israel, a Novosibirsk, na Rússia, de forma acidental, matando as 78 pessoas a bordo. Um míssil foi disparado durante exercícios militares enquanto a aeronave sobrevoava o Mar Negro. Outra agência russa, a Interfax, sugeriu que Putin seria o alvo, porque o voo da Malaysia Airlines seguia uma rota semelhante à do jato que o levava de volta a Moscou. Ainda é incerto como as investigações serão conduzidas nas próximas semanas e os constrangimentos diplomáticos que produzirão numa região tão disputada. Representantes da Força Aérea ucraniana relataram dificuldades para chegar ao local dos destroços. Uma caixa-preta ficou com os separatistas, que prometeram entregá-la à Rússia, e a outra foi encontrada por equipes de resgate. Um cessar-fogo humanitário foi negociado para colaborar com as investigações.
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