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domingo, 19 de janeiro de 2014

Contas inativas regulares foram fechadas

Em nota oficial, a Caixa Econômica Federal nega que poupanças inativas tenham sido encerradas e contraria parecer do Banco Central. Ministério Público vai abrir ações criminal e cível e a oposição cobra explicações

Claudio Dantas Sequeira e Mário Simas Filho
Na sexta-feira 10, o Banco Central enviou à Caixa Econômica Federal o ofício 005/2014. Trata-se do resultado da inspeção sobre a operação que encerrou 525.527 poupanças e transferiu R$ 719 milhões para o balanço da CEF em 2012. O documento de três páginas e um anexo contradiz as notas oficiais emitidas pela Caixa e pelo próprio BC no domingo 12, informando que apenas contas irregulares e com problemas cadastrais haviam sido encerradas. Na sua nota, a CEF afirmou que é categoricamente falsa a informação de que contas sem movimentação foram encerradas, reiterando que nenhuma conta inativa havia sido cancelada. Como nos pareceres anteriores, publicados na última edição de ISTOÉ, no resultado da inspeção o Banco Central afirma que contas poupança inativas foram encerradas (leia documentos 1,2,3 e 4), que a Caixa transferiu indevidamente os saldos para o resultado e que nem os titulares nem o BC foram informados sobre a operação. Segundo o documento, que lista oito irregularidades e três deficiências identificadas durante a investigação, houve “encerramento de contas de depósitos que não apresentavam inconformidade cadastral”. O relatório também afirma que foram constatados “alguns casos de contas encerradas cujos clientes apresentavam CPF\CNPJ regularizado e alguns casos de contas encerradas de clientes que possuíam outras contas com informações cadastrais regularizadas junto à Caixa”. Ainda de acordo com o BC, numa amostra das poupanças analisadas pelos auditores foram identificadas 54 contas de depósitos cujos titulares “apresentavam CPF/CNPJ regular junto à Receita Federal”. O relatório, no entanto, não especifica a quantidade de contas analisadas.
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A Caixa agora terá dez dias para responder ao ofício do BC, informando que providências foram adotadas sobre cada um dos itens listados. Após a análise das respostas fornecidas pela Caixa, o Banco Central decidirá se abre ou não processo administrativo contra os responsáveis pela operação. A estratégia adotada pelo governo logo que a operação de encerramento irregular das poupanças se tornou pública foi a de procurar manter o caso no campo administrativo e debater apenas as questões técnicas. A presidenta Dilma Rousseff cobrou explicações, ficou irritada com o que chamou de “crise criada” pelos órgãos de controle do governo e teria considerado o caso como apropriação indébita. No domingo 12, a Caixa anunciou que irá acatar todas as recomendações do BC, que no balanço de 2013, a ser divulgado no início de fevereiro, irá expurgar R$ 420 milhões lançados indevidamente em 2012 e que nenhum correntista será prejudicado.
Apesar dos esforços para tratar o encerramento irregular das poupanças apenas na esfera administrativa, na quarta-feira 15 o governo escalou a Advocacia-Geral da União para avaliar o caso e buscar uma resposta jurídica para os processos que deverão surgir. A decisão de recorrer à AGU foi tomada logo depois que o Ministério Público Federal anunciou que vai promover investigações tanto no âmbito criminal como no cível. Dois procuradores já foram selecionados para comandar essas apurações: Vinicius Fermino e Paulo José Rocha Júnior. Ainda nesta semana eles terão acesso a todos os relatórios feitos pelo Banco Central e pela Controladoria-Geral da União, bem como aos documentos fornecidos pela Caixa. Com todos esses dados, poderão convocar dirigentes da CEF para esclarecimentos a fim de analisarem os indícios de crime e quais os possíveis enquadramentos.
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INVESTIGAÇÃO
Dois procuradores do Ministério Público Federal foram escalados para
comandar as apurações: Vinicius Fermino (à esq.) e Paulo Rocha (acima)
“É evidente que esse caso terá um desdobramento jurídico. Não há dúvida de que se trata de crime de apropriação indébita”, avalia o economista Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor do Banco Central. “Ainda que todas as contas tivessem algum problema cadastral, o banco tinha que ter feito uma chamada pública, com ampla divulgação nos meios de comunicação, para que os clientes regularizassem sua situação.” O advogado Luiz Fernando Pereira, que defende poupadores na ação sobre os planos econômicos que tramita no Supremo Tribunal Federal, também entende que os responsáveis pela operação na Caixa poderão ser processados pelo crime de apropriação indébita. “Trata-se de um caso clássico”, afirma. “O banco não pode se apropriar do recurso só porque o cliente deixou na conta sem movimentá-lo por mais de cinco anos e por algum problema de cadastro.”
Na semana passada, o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) também analisou o caso. De acordo com a advogada Mariana Alves Tornero, um detalhado estudo da legislação brasileira foi feito e o Idec, assim como os técnicos do Banco Central, concluiu que a Caixa errou ao incorporar em suas receitas créditos de cadernetas de poupança encerradas. “Caderneta de poupança é um contrato bilateral, que não pode ser cancelado unilateralmente”, diz Mariana. Ela explica que mesmo em casos de poupanças com mais de 25 anos de inatividade o dinheiro nunca poderia ser incorporado à receita do banco. “Foi uma apropriação indevida. O dinheiro nunca deveria ter ido para a Caixa. Mesmo nos encerramentos de contas feitos dentro das normas, a lei determina que o saldo vá para o Tesouro e depois para a Receita da União”, afirma.
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"Trata-se de um crime de apropriação indébita.
O banco tinha que ter feito uma chamada
pública, com ampla divulgação, para que
os clientes regularizassem sua situação"

Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor do Banco Central
No Congresso Nacional, o caso do encerramento irregular das poupanças trará trabalho para os governistas tão logo se encerre o recesso parlamentar. Na semana passada, líderes da oposição como o senador Aécio Neves (PSDB-MG) e Agripino Maia, presidente nacional do DEM, começaram a articular a convocação dos presidentes da Caixa, Jorge Hereda, e do Banco Central, Alexandre Tombini, e do ministro da Fazenda, Guido Mantega, para explicarem a manobra contábil, que inflou em 12% o lucro do banco em 2012. A princípio, a convocação deverá ser feita pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Candidato à sucessão de Dilma, Aécio classificou o episódio como “extremamente grave”. “Uma apropriação indevida, um verdadeiro confisco na poupança de inúmeros brasileiros sem que eles fossem adequadamente comunicados”, disse. O PSDB também entrou com pedido para que o Ministério Público avalie se a operação configura crime de gestão temerária. “Houve, no mínimo, uma esperteza”, afirmou o senador tucano.
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Fotos: ROBERTO CASTRO/Ag. Istoé; Daniel Ferreira/CB; ANDRE DUSEK

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