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sábado, 20 de março de 2010

Lula agora vai dizer que sabia

Depois de ISTOÉ revelar os depoimentos de três ex-ministros ao STF confirmando que o deputado Roberto Jefferson o informou do Mensalão, o presidente decide responder ao questionário da Justiça com a mesma versão.Hugo Marques.Por muito tempo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva negou que tivesse tomado conhecimento do Mensalão do PT. Ele sustentava que o esquema não existiu. No dia 3, no entanto, ISTOÉ revelou que os ex-ministros Márcio Thomaz Bastos, da Justiça, Aldo Rebelo, da Articulação Política, e Walfrido dos Mares Guia, do Turismo, confirmaram na Justiça Federal que Lula foi informado sobre a existência do Mensalão pelo ex-deputado Roberto Jefferson (PTB), no início de 2005. Na reunião estavam Jefferson, Walfrido, Rebelo, o então líder do PTB na Câmara, José Múcio Monteiro (PE), e o do PT, Arlindo Chinaglia (SP). Diante desta revelação, Lula decidiu tomar uma decisão que vinha adiando havia seis meses. Na condição de testemunha, portanto compromissado com a verdade, ele decidiu responder à juíza Pollyanna Kelly Martins Alves, da 12ª Vara da Justiça Federal de Brasília, e prestar depoimento, por escrito, no processo do Mensalão do PT. Lula irá repetir a versão oficial sustentada por seus ex-ministros, ou seja, de que foi avisado por Jefferson da existência do Mensalão e pediu a apuração da denúncia. Depois de algum tempo, Lula dirá, foi informado por Rebelo de que nada havia sido confirmado. “As respostas ainda serão encaminhadas à Justiça, mas o presidente Lula não vai entrar em contradição com os ex-ministros”, confirma um assessor da Presidência.
O problema é que, a julgar pela versão dos ex-ministros, Lula não acionou a Polícia Federal para investigar a denúncia. A partir dessa revelação, a oposição, agora, quer acusá-lo de ter se omitido. “É evidente que o presidente tem que ser denunciado por crime de prevaricação, pois o Mensalão foi uma denúncia da maior gravidade e ele não informou à Polícia Federal”, diz o deputado Raul Jungmann (PPS-PE). “Fui ministro e sei que a primeira coisa a fazer diante de uma denúncia no Executivo é pedir sindicância interna ou abertura de inquérito.” Para alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), só o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, poderia apresentar uma denúncia contra Lula. “A ação penal pública é divisível e seu titular é o procurador-geral da República”, diz o ministro Marco Aurélio Mello. “Nós só agimos mediante a provocação, que é monopólio do Ministério Público. É o caso de dizer: com a palavra, doutor Gurgel”. Em conversas reservadas, o procurador-geral disse que não vai antecipar a medida que poderá tomar. “Vamos ver o que o presidente vai dizer”, afirma Gurgel.
A expectativa na Presidência da República é de que Lula apresente suas respostas por escrito nos próximos dias. Os juízes federais em todo o País estão colhendo depoimentos e providenciando diligências a pedido do STF. No primeiro ofício enviado diretamente a Lula, no dia 10 de agosto do ano passado, a juíza Pollyanna Kelly informou ao presidente que ele está arrolado como testemunha e pediu que indicasse dia e hora para comparecer à Justiça ou que manifestasse interesse em apresentar as respostas por escrito entre 14 de setembro e 30 de outubro. No segundo ofício, enviado a Lula no dia 12 de novembro, a juíza voltou a solicitar as respostas do presidente até o fim daquele mês. “Solicito, se possível, que as respostas sejam enviadas a este Juízo Federal até o dia 30/11/2009”, escreveu a juíza. Pollyanna Kelly encaminhou a Lula diversas perguntas feitas pelos procuradores da República Raquel Branquinho e José Alfredo. Na lista de perguntas, o MPF questiona quais providências legais Lula tomou ao saber do Mensalão. Até a quarta-feira 17, o ministro-relator do processo do Mensalão no STF, Joaquim Barbosa, não tinha recebido a informação da Justiça Federal com as respostas de Lula.Lula encarregou o subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Beto Vasconcelos, de redigir as respostas. O fato de os ex-ministros terem entrado em contradição no depoimento é o que mais preocupa o governo. Thomaz Bastos disse que Lula pediu a investigação dos fatos relatados por Jefferson, mas admitiu que a Polícia Federal não foi acionada. Ele afirmou que a suposta investigação teria sido “formal”, pois “foi objeto de resposta formal da Casa Civil”. Ao depor na 2ª Vara Criminal da Justiça Federal de São Paulo, em janeiro de 2008, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu negou a versão de Thomaz Bastos. Perguntado se Lula pediu investigação à Casa Civil, Dirceu respondeu: “Não. Eu não era mais o articulador político do governo. Era o ministro Aldo Rebelo. Ele conversou com o ministro Aldo Rebelo.” A atual ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, afirmou que na Casa Civil não há registros sobre esta investigação. Como os ministros prestaram depoimento na condição de testemunhas, as contradições só trazem mais implicações legais ao processo.
As respostas do presidente Lula irão encerrar a fase de depoimentos do processo. O ministro Joaquim Barbosa, no entanto, aguarda a chegada de várias perícias e laudos, além de diligências solicitadas pelos 39 réus do processo. Ministros do STF ouvidos por ISTOÉ temem que muitos crimes imputados aos réus, como formação de quadrilha, prescrevam antes do julgamento. “São 39 réus poderosos, todos com os melhores advogados do País”, lembra um dos magistrados. “Com certeza, vários crimes devem prescrever antes do julgamento.” Barbosa tentou desmembrar o caso e manter no STF somente os cinco réus que são deputados federais e enviar para a Justiça Federal os 34 que não têm foro privilegiado. A tese não vingou e o processo do Mensalão já conta com 69 mil páginas.
As consequências de Lula dizer que sabia
Na nova tática, ao repetir o depoimento de seus ex-ministros, o presidente Lula confirmará que, a despeito do que diz a Lei n0 8112, não acionou a Polícia Federal quando tomou conhecimento do Mensalão. Sendo assim, a Justiça poderá entender que houve comissão por ausência de providências legais e Lula, segundo ministros do STF, corre sim o risco de ser o 40º réu do Mensalão do PT, como vem pedindo a defesa do deputado Roberto Jefferson.

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