Há exatamente um ano, uma turista americana teve 80% do corpo queimado quando, de forma inesperada, um bueiro estourou sob uma calçada de Copacabana, no Rio de Janeiro. Na semana passada, numa rua do Flamengo, a mesma cena se repetiu, desta vez, por sorte, sem vítimas. A explosão levantou labaredas de fogo e chegou a derreter dois telefones públicos. Nesses 12 meses, os cariocas passaram a ver as ruas da cidade como um verdadeiro campo minado. Dois inquéritos civis instaurados no Ministério Público apuraram 58 ocorrências de explosões de junho de 2010 a abril deste ano. Desde então, pelo menos outros cinco bueiros mandaram tampas de 50 quilos pelos ares em ruas movimentadas da cidade.
O MP aciona a Companhia Distribuidora de Gás e a Light, duas concessionárias de serviço público responsáveis pelos tubos e transformadores subterrâneos. Mas, até agora, o que tem prevalecido é a incompetência e a negligência por parte das empresas e das autoridades.
A dona dos bueiros, a Light, parece tão perplexa quanto a população. “A quem me pergunta por que isso está acontecendo agora, justamente quando estamos investindo alto na manutenção da rede, respondo sinceramente: não sei”, disse à ISTOÉ o presidente da empresa, Jerson Kelman. Os órgãos públicos não tomaram até o momento nenhuma providência à altura da gravidade do caso. O secretário estadual de Desenvolvimento Econômico e Energia, Júlio Bueno, afirma que a obrigação de fiscalizar a empresa é da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Essa, por sua vez, disse, em nota, que recomendou à Light um plano de modernização da rede, que atualmente está sendo implantado. “Depois de fechado o processo, a área técnica fará um relatório de fiscalização”, diz a nota. A Light poderá ser multada em até 2% do faturamento anual. Essa avaliação, no entanto, só acontecerá em 2012. Até lá, quantas tampas de bueiro ainda irão pelos ares?
Solução para o problema existe, basta ter vontade política para resolvê-lo. “Esse problema tem de ser tratado como prioridade, todos os recursos devem ser usados para resolver a situação em pouco tempo. Tecnologia para isso não falta”, diz Moacir Duarte, especialista em risco da Coppe, programa de pós-graduação e pesquisa em engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. O presidente da Light afirma que a questão é a grande quantidade de equipamentos antigos existentes na rede subterrânea do Rio e também o roubo de cabos. “Nunca se investiu tanto na manutenção e modernização dessa rede, de 5.700 quilômetros, a maior do Brasil”, diz Kelman, que contratou recentemente 200 eletricistas. Segundo ele, este ano estão sendo investidos R$ 88 milhões; em 2010 foram apenas R$ 25 milhões; e em 2009, R$ 14 milhões.
Ainda assim, não se compreende por que circunstâncias há tantos anos conhecidas tenham resultado nessa sequência de explosões somente agora. Explosões de bueiros costumam ser fato extremamente raro, o aceitável numa cidade como o Rio seria um por ano.
O presidente da Light lamenta a negligência de seus antecessores com a manutenção da rede elétrica da cidade e promete renovar tudo
até o fim do ano. “Parece reforma em uma casa velha: quando mexemos em uma coisa, aparece outro problema”, lamenta. Enquanto isso, o número de vítimas só aumenta. Além da turista americana, pelo menos outras seis pessoas tiveram seus corpos queimados em ocorrências desse tipo. Numa cidade cujas calçadas podem ter, na extensão de um quarteirão, até 20 bueiros, essa ameaça não é nada desprezível. “É preciso uma ação heterodoxa, não se pode encarar isso como algo rotineiro”, diz o especialista Duarte. Afinal, o Rio não pode ser um campo minado.
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