Auditoria da SBM Offshore aponta pagamento de 30 milhões de dólares de suborno para fechar contratos de aluguel de plataformas do pré-sal
Fernanda Allegretti, de Amsterdã
DÁDIVA OU MALDIÇÃO? - O navio-plataforma Cidade de
Anchieta, o primeiro a produzir no pré-sal: contrato de arrendamento
sob suspeita
(Agência Petrobras)
Em 10 de abril de 2012, a empresa holandesa SBM Offshore, a maior fabricante de plataformas marítimas de exploração de petróleo do mundo, iniciou uma investigação interna para apurar denúncias de que funcionários de suas subsidiárias pelo mundo corrompiam autoridades para conseguir contratos com governos e empresas privadas, entre 2007 e 2011. Há duas semanas, as conclusões da investigação foram publicadas na Wikipedia, a enciclopédia colaborativa da internet. Os documentos mostram que houve pagamento de propina em Guiné Equatorial, Angola, Malásia, Itália, Cazaquistão, Iraque e no Brasil, onde funcionários e intermediários da Petrobras teriam recebido pelo menos 30 milhões de dólares para favorecer contratos com a companhia holandesa. Os documentos, segundo a investigação, foram divulgados por Jonathan Taylor, ex-funcionário do escritório da SBM em Mônaco, que deixou a empresa em 2012 e pediu 3 milhões de euros para não revelar o esquema. Nos papéis, há nomes, valores, contratos e trocas de e-mails entre dirigentes da SBM e de empresas internacionais. Como a empresa não cedeu, ele tornou o caso público. A SBM confirma a chantagem e a autenticidade dos documentos, que foram enviados para o Departamento de Justiça dos Estados Unidos e para o Ministério Público da Holanda, que abrirá uma investigação para apurar o escândalo nas próximas semanas.
NO
PAPEL - A presidente da Petrobras, Graça Foster, e o diretor
Figueiredo: a empresa tem 9 bilhões de reais em contratos com a SBM
Nos documentos, há referências a pagamentos de propina para obtenção de contratos de aluguel de alguns dos principais navios-plataforma que operam na exploração do pré-sal. Um deles é o Cidade de Anchieta, fabricado pela SBM e alugado à Petrobras por 1,28 bilhão de reais. Ele está ancorado no campo de Baleia Azul, no complexo do Parque das Baleias, na porção capixaba da Bacia de Campos, e foi o primeiro a retirar comercialmente petróleo do pré-sal, em setembro de 2012. Há ainda menções às plataformas Cidade de Saquarema e Cidade de Maricá, que foram encomendadas pela Petrobras à SBM em julho de 2013 por 3,5 bilhões de dólares. E ao Cidade de Ilhabela, que foi fabricado na China pela SBM e está sendo montado no Estaleiro Brasa, em Niterói (RJ), para entrar em operação ainda neste ano. O valor do contrato passa dos 2 bilhões de reais. De acordo com os documentos da investigação, o pagamento das “consultorias” a Faerman facilitou a obtenção dos contratos com a Petrobras, que não tiveram a “devida divulgação”. Além do pagamento em dinheiro, os documentos mostram outros “mimos” a dirigentes das empresas corrompidas, como ingressos para a Copa do Mundo de 2010 e para o Grande Prêmio de Mônaco.
Documentos obtidos por VEJA mostram que a Petrobras tem vinte contratos de aluguel de equipamento com a empresa holandesa, que somam mais de 9 bilhões de reais. O mais antigo é de 2000 e o mais recente, de agosto do ano passado — todos para operação no pré-sal. A SBM é uma das mais antigas empresas holandesas. Sua história remonta a 1672, quando se chamava Smit Kinderdijk e construía navios para a Companhia das Índias. Desde 1969 passou a se dedicar à construção de plataformas para exploração de petróleo. Hoje, é a 54ª maior empresa da Holanda, com receita de 4,8 bilhões de dólares em 2013 — o Brasil é seu principal mercado de exportação, seguido por Angola. Nas últimas duas semanas, desde que o escândalo foi divulgado na internet, as ações da empresa na bolsa europeia caíram 20%.
A Petrobras afirma que tomou conhecimento das denúncias de suborno, mas ainda não foi notificada por autoridades da Holanda. Disse ainda que “está tomando providências para averiguar a veracidade dos fatos”. José Antônio de Figueiredo e Julio Faerman não foram encontrados para comentar as denúncias.
Com reportagem de Alana Rizzo
ROMBO INTERNACIONAL - Ultrapassada, a refinaria vale 15% do que foi pago
Um bilhão perdido no Texas
O escândalo de corrupção da holandesa SBM não é o primeiro a vazar das profundezas por onde transitam os negócios escusos para manchar a reputação da Petrobras. A companhia até hoje não conseguiu explicar o que a levou a investir 1,2 bilhão de dólares em uma refinaria nos Estados Unidos, pequena, ultrapassada e sem condições de processar o petróleo extraído na costa brasileira, que não vale 15% disso. O caso, revelado por VEJA em 2012, está sob análise do Tribunal de Contas da União e do Ministério Público, que investigam suspeitas de superfaturamento.Em 2006, a Petrobras, então sob a gestão de José Sergio Gabrielli, comprou por 360 milhões de dólares 50% da Pasadena Refining System Inc., no Texas. A planta havia sido adquirida um ano antes, desativada, pela belga Astra Oil, por 42,5 milhões de dólares. O que levou a refinaria a ter uma valorização de dezessete vezes em um ano permanece um mistério. Uma disputa entre as duas empresas, em 2009, transformou o caro em absurdo. A Petrobras perdeu na Justiça e foi obrigada a pagar 839 milhões de dólares à Astra pela sua metade. Quando percebeu que não havia o que fazer e o melhor era se livrar da refinaria, a única proposta de compra foi de 180 milhões de dólares. Diante do rombo iminente de mais de 1 bilhão de dólares, a Petrobras desistiu da venda.
O governo e a Petrobras gostariam que o caso permanecesse a profundidades superiores às do pré-sal, mas um desfecho está próximo. “As investigações se encaminham para confirmar que a compra da refinaria de Pasadena é um dos contratos mais escandalosos da Petrobras", afirma o procurador Marinus Marsico, do Ministério Público Federal.
PIETER ZALIS
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