A praça Tahrir, no centro do Cairo, palco de violentos confrontos nos últimos dias, amanheceu aparentemente tranquila nesta sexta-feira em que manifestantes oposicionistas planejam um novo megaprotesto, chamado de "Dia da Partida", com o qual exigem a renúncia imediata do ditador Hosni Mubarak.
Assim como na terça-feira passada, os egípcios estão reunidos na praça Tahrir e em outros pontos da capital para, ao fim das orações do meio-dia, iniciarem os protestos contra o regime. O término das orações varia de acordo com as mesquitas, mas costuma ser por volta das 13h da hora local (9h de Brasília).
Os organizadores esperam mobilizar, mais uma vez, um milhão de pessoas.
Na quinta-feira, em entrevista à emissora americana ABC, Mubarak disse que não deve renunciar pois considera que sua saída imediata traria o "caos" ao país.
O 10º dia de protestos no Egito foi marcado por diversas agressões a repórteres de vários países que cobrem as manifestações e também pelas declarações do vice-presidente, Omar Suleiman, indicando que o filho do ditador, Gamal Mubarak, não deve concorrer à Presidência.
No pronunciamento, Suleiman também prometeu punir todos os responsáveis pelos episódios de violência que assolam o país, e pediu a soltura dos jovens detidos nos protestos antigoverno que não estejam envolvidos nos incidentes violentos.
Esta foi a primeira vez que Mubarak fala à imprensa desde o início da crise. Dias atrás, ele falou à nação pela TV estatal em duas diferentes ocasiões.
Em entrevista de cerca de 20 minutos à repórter da ABC Christiane Amanpour, ele afirmou que "está cansado de ser dirigente" e gostaria de deixar o poder mas não pode, "por temer que o país afunde no caos".
"Não me importo com o que as pessoas dizem de mim. Agora eu estou preocupado com o meu país, me importo com o Egito", disse Mubarak, enquanto violentos protestos contra ele chegam ao décimo dia seguido.
"Estou muito triste com (o que aconteceu) ontem. Não quero ver os egípcios lutando entre si", afirmou.
Os confrontos entre opositores e simpatizantes de Mubarak deixaram ao menos oito mortos nesta quinta-feira na praça Tahrir, palco principal dos distúrbios no Cairo, informaram fontes dos serviços de segurança. Com isso, o número de mortes nos confrontos sobe para 13 em apenas dois dias, além de mais de 1.500 feridos.
Desde o início da onda de violência no país, há dez dias, estima-se que mais de cem pessoas tenham morrido, mas não há uma cifra oficial das vítimas.
As fontes não forneceram detalhes sobre o tipo de ferimentos as vítimas sofreram. A informação foi divulgada pouco depois do início do toque de recolher, às 17h do horário local (13h de Brasília), em meio a uma grande tensão nas ruas do Cairo.
PROPOSTA AMERICANA
Informações publicadas no site do jornal "The New York Times" na noite de quinta-feira indicam que o governo dos Estados Unidos está discutindo com autoridades egípcias uma proposta para que o presidente Hosni Mubarak deixe imediatamente o poder e abra caminho para um governo de transição liderado pelo vice-presidente Omar Suleiman e com o apoio do Exército.
Segundo o jornal, a proposta seria de que o governo de transição convide membros da oposição, incluindo a Irmandade Muçulmana, para iniciar um processo que leve a eleições livres no próximo mês de setembro.
PREMIÊ
Mais cedo, o premiê do Egito, Ahmed Shafiq, reiterou seu pedido de desculpas pelos confrontos dos últimos dois dias na praça Tahrir, no centro do Cairo, entre manifestantes pró e antigoverno e disse não saber quem está por trás da violência. Em entrevista coletiva a jornalistas, Shafiq afirmou ainda que está disposto a negociar com quer for para encerrar a crise.
"A prioridade é descobrir o que aconteceu ontem [nesta quarta-feira]", disse Shafiq, que prometeu uma investigação "completa e profunda" sobre os confrontos. "Para saber se foi planejado, acidental, liderado por uma pessoa, um grupo... Lidaremos de acordo com a lei e logo com quem for responsável pelo que aconteceu ontem e que causou este caos".
JORNALISTAS
Ainda na quarta-feira uma equipe de jornalistas da CNN já havia sido atacada no Egito. Hoje, no entanto, repórteres de vários países foram alvo de ataques, o que rendeu críticas e condenações de governos ao redor do mundo.
Entre os agredidos e detidos estavam repórteres do "The New York Times", "Washington Post" e da emissora de TV Al Jazeera, com sede no Qatar.
Em Berlim, o secretário-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), Ban Ki-moon, condenou os atos de "intimidação e restrições".
"Deixe-me ser absolutamente claro: isto é revoltante e totalmente inaceitável, e deve parar agora", afirmou após se encontrar com o presidente alemão Christian Wulff.
Já o diretor do Comitê de Proteção aos Jornalistas (CPJ), Joel Simon, disse que "este é um dia negro para o Egito e um dia negro para o jornalismo".
"O Egito está tentando criar um vácuo de informação que o coloca na companhia dos piores [países] opressores do mundo", acrescentou.
O CPJ disse que canais de televisão estatais e também os privados que pertencem a defensores de Mubarak estavam retratando os jornalistas estrangeiros como parte de um complô para desestabilizar o Egito.
HILLARY
A secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, condenou em Washington os ataques a jornalistas, diplomatas, ativistas de direitos humanos e manifestantes pacíficos no Egito.
A chefe da diplomacia americana indicou que os ataques violam as normas internacionais de liberdade de imprensa, e, sem culpar diretamente o regime do ditador Hosni Mubarak, há 30 anos no poder, disse que é em momentos críticos que o respeito a tais convenções se faz mais crucial.
"É especialmente em épocas de crise que os governos precisam demonstrar sua aderência a esses valores universais", disse, acrescentando que os correspondentes e enviados especiais da mídia internacional têm o direito de cobrir as manifestações.
Hillary pediu ainda que o vice-presidente egípcio, Omar Suleiman, inclua "uma representação ampla e verdadeira da oposição egípcia" ao formar um governo de transição e afirmou que as autoridades e o Exército precisam proteger os cidadãos egípcios e estrangeiros.
ITAMARATY
Mais cedo, em nota oficial, o Itamaraty criticou a detenção dos jornalistas brasileiros Corban Costa, da Rádio Nacional, e Gilvan Rocha, da TV Brasil, e pediu que as autoridades egípcias tomem medidas para garantir as liberdades civis e integridade física da população e dos estrangeiros no país.
"O governo brasileiro deplora os confrontos violentos associados aos últimos desdobramentos da crise no Egito, em particular os atos de hostilidade à imprensa reportados ontem e hoje", acrescenta o comunicado.
A nota diz ainda que a Embaixada do Brasil no Cairo reiterou que "continuará prestando assistência a turistas e residentes brasileiros que se encontram no país".
Enviados para o Egito para a cobertura da crise no país, os dois jornalistas brasileiros foram detidos, vendados e tiveram passaportes e equipamentos apreendidos.
Desde a noite de ontem (2) até a manhã desta quinta-feira, Corban e Gilvan ficaram sem água, presos em uma sala sem janelas e com apenas duas cadeiras e uma mesa, em uma delegacia do Cairo, indica a Agência Brasil.
Para serem liberados, os repórteres foram obrigados a assinar um depoimento em árabe, no qual, segundo a tradução do policial, ambos confirmavam a disposição de deixar imediatamente o Egito rumo ao Brasil. "Tivemos que confiar no que ele [o policial] dizia e assinar o documento", contou Corban.
No caminho da delegacia para o aeroporto do Cairo, Corban disse ter observado a tensão nas ruas e a movimentação intensa de manifestantes e veículos militares nos principais locais da cidade. Segundo ele, todos os automóveis são parados em fiscalizações policiais e os documentos dos passageiros, revistados.
Os estrangeiros são obrigados a prestar esclarecimentos. De acordo com o repórter, o taxista sugeriu que ele omitisse a informação de que era jornalista.
SUECO
Um jornalista da emissora de TV pública sueca SVT foi "gravemente ferido" a facadas nesta quinta-feira no Egito, anunciou agora à noite o próprio canal.
O jornalista "Bert Sundstroem está muito machucado. Foi hospitalizado no Cairo e dever ser submetido a uma cirurgia", anunciou a emissora em seu site na internet.
"Ainda não sabemos o que aconteceu", acrescentou.
Bert Sundstroem telefonou para a redação pela última vez no início da tarde desta quinta-feira, às 13h no Cairo (9h de Brasília).
Pouco depois, seu produtor chamou-o para uma reportagem ao vivo da praça Tahrir. "Uma voz em árabe respondeu que Bert estava detido, até a comunicação ser cortada", informou o produtor, Robert Wistroem, no site da SVT.
Segundo uma tradução em sueco, publicada no site, a voz não identificada declarou: "O seu homem está detido pelo Exército. Se quiserem recuperá-lo, venham procurá-lo. Foi detido pelo governo egípcio. Está vivo e acordado".
ZERO HORA
Outro brasileiro agredido hoje foi Luiz Antônio Araújo, enviado especial do jornal gaúcho "Zero Hora" ao Cairo.
Araújo foi atacado com chutes, pontapés e socos na manhã desta quarta-feira no centro do Cairo por cerca de 50 defensores do regime do ditador Hosni Mubarak, há 30 anos no poder. Sem dinheiro, foi levado à Embaixada do Brasil no país onde recebeu ajuda e foi conduzido de volta ao hotel.
Do Cairo, Araújo revelou ao repórter Jefferson Puff por telefone que chegou à capital egípcia por volta da meia noite local de ontem (2), em meio aos confrontos que até o fim do dia já tinham deixado três mortos e mais de 1.500 feridos.
Após a madrugada de trabalho, no fim da manhã desta quinta-feira deixou o hotel e foi à representação diplomática brasileira, percorreu sozinho as ruas do centro do Cairo, e quando chegou ao viaduto 6 de outubro, onde estão organizados os manifestantes pró-Mubarak, foi atacado de forma violenta e passou momentos de tensão
"Me mostraram facas, porretes e pedras. Uns 50 manifestantes me cercaram e começaram a me agredir. Tirei o passaporte brasileiro e comecei a gritar 'Brasília, Brasília' e aí perceberam que tinham um estrangeiro nas mãos", conta.
O repórter diz ter certeza que os agressores eram pró-Mubarak e que após perceberem que ele era estrangeiro o empurraram até uma garagem. "O Exército viu tudo e os soldados não esboçaram reação".
"Fui empurrado como a torcida do Corínthians empurraria um palmeirense no Morumbi", diz Araújo, dando uma dimensão de como foi acuado.
No local para onde foi levado o enviado especial da "Zero Hora" viu três pessoas gravemente feridas. Desta garagem onde os manifestantes se organizam, foi conduzido até a embaixada brasileira, onde recebeu ajuda.
Comentando a atuação dos diplomatas do Brasil, disse que o auxílio recebido foi crucial e que pôde perceber como a embaixada está "sobrecarregada".
"Eles estão sem dinheiro, os bancos estão fechados há dias. Fiquei na embaixada por meia hora e vi que a ajuda que eles podem fornecer é limitada. Além do embaixador, eles têm só mais três pessoas trabalhando", conta.
Araújo disse ainda que um dos diplomatas revelou que neste momento ainda há turistas brasileiros chegando ao Cairo, do Brasil, embora o Itamaraty já tenha alertado que viagens ao país devem ser evitadas.
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