Documentos obtidos por ISTOÉ mostram que o polêmico presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara escondeu da Justiça Eleitoral ser dono de empresas, entre elas um consórcio de imóveis que ele próprio induzia fiéis a comprar em seu programa gospel.
Claudio Dantas Sequeira e Izabelle TorresENROLADO
O presidente da Comissão de Direitos Humanos, Marco Feliciano,
terá de se explicar por ter sonegado informações ao tribunal
"Realize, em nome de Jesus, o sonho da casa
própria. Com apenas R$ 300 por mês você adquire um consórcio que dará
uma carta de crédito de R$ 30 mil.” Era com essa frase que o
deputado-pastor Marco Feliciano (PSC-SP) encerrava, até bem pouco tempo
atrás, seu programa de pregações na tevê. Na tela, o sermão teatral era
substituído pelo apelo comercial, enquanto números de telefones em seis
capitais, inclusive Brasília, surgiam no canto da tevê com o logotipo da
empresa GMF Consórcios. Quando foi questionado por estar se utilizando
da fé alheia para acumular lucros, Feliciano saiu com a desculpa de que
fazia apenas a propaganda de um patrocinador de seu programa televisivo.
Agora se sabe que ele não falou a verdade. A GMF pertence ao próprio
pastor. Foi criada em 2007 com mais três pastores. A atividade econômica
era “comércio de programas de computador e serviços de internet”, mas
mudou para “administração e representação comercial de consórcios de
bens e direitos”. No contrato social, obtido por ISTOÉ, os sócios foram
substituídos por Edileusa Feliciano, sua mulher.
Poderia ser uma questão meramente ética ou ideológica. Uma discussão sobre a mercantilização da fé, de um pastor que se notabiliza por arrancar senhas de cartões de crédito e somas em dinheiro de milhares de fiéis. Afinal, o que esperar de um líder religioso que prega a intolerância sexual e o preconceito racial? Nada disso o impediu de assumir, após uma costura partidária atrapalhada, a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara.
Poderia ser uma questão meramente ética ou ideológica. Uma discussão sobre a mercantilização da fé, de um pastor que se notabiliza por arrancar senhas de cartões de crédito e somas em dinheiro de milhares de fiéis. Afinal, o que esperar de um líder religioso que prega a intolerância sexual e o preconceito racial? Nada disso o impediu de assumir, após uma costura partidária atrapalhada, a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara.
Os negócios tocados por Marco Feliciano e sua mulher, Edileusa, obedecem a um “modus operandi”. Primeiro, as empresas são criadas em nome de pastores que trabalham para a dupla. Em seguida, eles repassam suas cotas para Feliciano. Alguns desses ex-sócios hoje têm seus salários pagos com verba da Câmara. É o caso do pastor André Luis de Oliveira, que recebe até R$ 7 mil do gabinete de Feliciano, mas nem sequer bate ponto lá. Oliveira, na verdade, comanda o templo da Assembleia de Deus Catedral do Avivamento em São Joaquim da Barra (SP). O pastor foi um dos fundadores da GMF Consórcios, ao lado de Joelson Heber Tenório, outro assessor fantasma cujos vencimentos somam R$ 6 mil. Tenório dirige a filial da igreja de Feliciano em Ribeirão Preto. O mesmo acontece com Rafael Octavio, pastor da igreja em Franca, funcionário do gabinete com salário de até R$ 7 mil e ex-sócio na Grata Music, empresa registrada em nome da mulher de Feliciano. Além de agraciar com dinheiro público pastores amigos, eles ainda eram sócios de Feliciano quando este já era deputado, o que pode complicar ainda mais a sua situação.
As suspeitas de sonegação de informações sobre patrimônio e de desvios de recursos públicos podem transformar Feliciano em réu na Comissão de Ética da Câmara. Dependerá da disposição de seus colegas de Parlamento, que até agora fizeram vista grossa aos protestos contra a permanência do pastor na presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Mas, diante das novas denúncias, já há uma movimentação nos bastidores da Casa para não só apeá-lo do cargo como questioná-lo por quebra de decoro na Comissão de Ética. Com posições que agridem garantias e direitos assegurados pela Constituição, Feliciano passou a última semana se defendendo das críticas de organizações civis. O PSC chegou a se reunir para discutir a indicação de outro nome para a comissão, mas no fim optou pelo enfrentamento. A bancada preferiu culpar as legendas que preteriram a comissão, num recado direto ao PT, que por uma década dominou o colegiado.
Ao assumir os trabalhos da comissão na quarta-feira 13, Feliciano retirou da pauta todos os temas considerados relevantes, como a discussão sobre união estável entre pessoas do mesmo sexo. Em mais um capítulo da batalha, 11 parlamentares recorreram ao Supremo Tribunal Federal para tentar inviabilizar a gestão de Feliciano. “Apelamos para o Judiciário para impedir que a comissão se transforme em um centro fundamentalista e retrógrado”, afirma Domingos Dutra (PT-MA), antecessor do pastor no cargo.
Fotos; Celio Messias/Folhapress; Marcelo Piu/Agência O Globo
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