A polícia do Rio de Janeiro, que desde sexta-feira mantém um cerco ao conjunto de favelas do Alemão com veículos blindados e 800 homens do Exército, deu um ultimato neste sábado aos criminosos que se refugiam no local, após uma onda de violência que deixou ao menos 46 mortos na cidade nos últimos dias.
"Nós estamos a postos para invadir o Complexo do Alemão a qualquer momento. É melhor eles se renderem agora e levantarem as armas enquanto é tempo, porque quando a gente invadir vai ser mais difícil. Estamos do lado de fora por pouco tempo," avisou o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Mário Sérgio Duarte, em entrevista coletiva.
"Não existe a menor chance de os traficantes terem êxito nessa guerra do Alemão. Os bandidos têm a chance de se entregar agora. Estamos chegando nos momentos finais para entrar no Alemão... Eles devem se entregar agora e ter o tratamento que a lei lhes garante," acrescentou o coronel, que também fez um pedido aos moradores da comunidade para não saírem às ruas em caso da invasão das forças de segurança.
A Polícia Militar informou que foi preparado um local determinado dentro da favela para que os homens se entreguem, com as armas sobre a cabeça, de forma a impedir a invasão dos policiais.
Criminosos e as tropas da brigada paraquidista do Exército trocaram tiros repetidas vezes desde a ocupação militar das entradas e saídas do Complexo do Alemão, deixando ao menos 10 feridos entre sexta-feira e sábado, incluindo um soldado, um policial e um fotógrafo da Reuters que foi levado ao hospital e passa bem. Dois supostos líderes do tráfico de drogas também foram feridos e presos, informou a polícia.
A operação em torno do Alemão foi iniciada após a fuga em massa de dezenas de homens armados para a comunidade em consequência da tomada na quinta-feira pela polícia, com ajuda de veículos blindados da Marinha e fuzileiros navais, da favela Vila Cruzeiro, outro reduto dos criminosos acusados de comandarem a onda de ataques a veículos e alvos policiais na cidade.
Ao menos 100 carros e ônibus foram incendiados por criminosos desde domingo, e ações da polícia em resposta aos ataques nas ruas deixaram pelo menos 45 suspeitos mortos em confrontos, de acordo com a polícia. Uma jovem de 14 anos também morreu, vítima de bala perdida. Mais de 70 suspeitos já foram presos pelas autoridades por envolvimento com o crime organizado.
Autoridades da área de segurança consideram as ações violentas desta semana uma resposta à nova estratégia implementada na capital com as Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs), que provocou a saída de chefes do tráfico de favelas onde esse tipo de policiamento foi instaurado. Acuado e forçado a deixar algumas áreas da cidade, o crime organizado estaria reagindo.
A implantação das UPPs em 15 das centenas de favelas espalhadas pela cidade é considerada o maior avanço na área de segurança pública da capital fluminense nos últimos anos, e a medida foi inclusive citada pelo Comitê Olímpico Internacional como um exemplo de que a cidade será segura para a Olimpíada de 2016. O Rio também será palco central da Copa do Mundo de 2014.
Diretor de ONG Afroreggae é chamado para mediar conflito
Os traficantes cercados no Complexo do Alemão enviaram mensagens ao mediador de conflitos e coordenador do Afroreggae, José Júnior, para iniciar algum tipo de conversação antes da invasão da polícia. José Júnior está agora no Complexo do Alemão disposto a negociar uma rendição com os traficantes para evitar o elevado número de mortes que se espera em um eventual combate.
Desde 1993, ele criou a ONG que atua na área social cultural em favelas, abrigando e empregando ex-traficantes dispostos a abandonar o crime. Os mediadores atuam para evitar confrontos que prejudiquem a vida de moradores das comunidades.
O comandante-geral da PM do Rio, coronel Mário Sérgio Duarte, disse neste sábado que a polícia vai invadir o Complexo do Alemão "a qualquer momento". Segundo o oficial, a decisão já está tomada e não há possibilidade de se voltar atrás. "Temos toda a superioridade. Não há hipótese de os traficantes serem bem sucedidos. Eles devem se entregar, essa é a hora. Depois que entrarmos, as coisas serão complicadas", afirmou o comandante da PM.
Chacina
A Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados divulgou nota oficial alertando para o riscos de que as operações policiais de combate ao crime organizado no Rio de Janeiro repitam o episódio da “Chacina do Alemão”, a megaoperação ocorrida em 2007 que mobilizou 1,3 mil policiais e resultou na morte de cerca 20 pessoas em um único dia. “Foram feitas atrocidades para nada. O tráfico aumentou lá”, aponta o deputado Chico Alencar (P-SOL-RJ) membro da CDHM.
Observação semelhante fez o diretor de Defesa de Direitos Humanos, Fernando Matos, da Secretaria de Direitos Humanos (SDH), que está no Rio. “Há consciência [por parte das autoridades] de que se houver derramamento de sangue o impacto vai ser tão ruim quanto as imagens de traficantes tomando conta das comunidades.”
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