Em linha com a opinião dos analistas ouvidos pelo site de VEJA, Copom baixa juros básicos do país em 0,5 ponto porcentual
Naiara Infante Bertão
Copom, presidido por Alexandre Tombini (à frente), reduz Selic pela oitava vez (Antonio Cruz/Agência Brasil)
Se para este ano cenário esperado é de queda da Selic, economistas já alertam que, no ano que vem, as perspectivas mudam completamente.
Diante da ausência de sinais claros de que o Produto Interno Bruto (PIB) responde às medidas adotadas desde pelo governo para acelerar a atividade econômica, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anunciou a redução da taxa básica de juros (Selic) pela oitava vez consecutiva. Com a decisão desta quarta-feira, a Selic cai 0,5 ponto porcentual (p.p.), passando de 8,5% ao ano para 8% ao ano – o menor patamar já visto no país. A decisão vem em linha com as expectativas de economistas ouvidos pelo site de VEJA.
Em comunicado enviado ao mecado, o comitê destacou que, neste momento, permanecem limitados os riscos para a trajetória da inflação. Ressaltou ainda que a fragilidade da economia global tem implicado um efeito "desinflacionário" nos preços vigentes no país. Com isso, os diretores optaram por dar prosseguimento ao afrouxamento da política monetária. A redução da Selic para 8% ao ano foi unânime e sem viés. Na última decisão, os diretores do BC haviam cortado os juros básicos em 0,5 p.p.
Na ata da reunião de 30 de maio, que antecedeu a finalizada hoje, o Copom já havia sinalizado que acompanharia os movimentos externos para decidir o que fazer com os juros, deixando a 'porta aberta' para novos cortes. O órgão, no entanto, fez a ressalva de que qualquer movimento seria feito com parcimônia, sinalizando quedas graduais.
Rafael Bacciotti, analista da Tendências Consultoria, explica que o corte de juros em 0,5 p.p. fundamenta-se na piora do cenário internacional, visto que as incertezas, principalmente com a Europa, permanecem altas. Ele apontou também o fato de a recuperação da atividade doméstica estar distante da esperada e, por fim, a inflação mais comedida no país. Estes três fatores, na avaliação dele, dão tranquilidade para o BC dar continuidade ao ciclo de afrouxamento monetário.
Para a Tendências, este não será o último corte do ano. Bacciotti acredita que o ciclo deve se encerrar apenas em agosto, quando as taxas de juros devem chegar a 7,5% ao ano. Pedro Paulo Silveira, economista da TOV Corretora, é um pouco mais destemido na análise. “O mais provável é que ocorram mais reduções de juros nas próximas reuniões. Trabalho com cortes para até 7%, isto é, mais duas vezes de 0,5 ponto porcentual”, diz.
André Perfeito, economista-chefe da Gradual Corretora, defende que o atual momento não é de "pudores monetaristas". Ele defende que o BC terá de ser ousado e jogar a Selic para além do que o mercado acredita ser razoável. “Caso contrário ele só estará perdendo tempo”, dispara. “O Copom tem a urgência e a responsabilidade de evitar a obstrução ainda maior do canal de investimentos por conta de expectativas ruins”, acrescenta o analista, em referência à reticência do empresariado em investir no mercado interno. Na opinião dele, a Selic deve encerrar 2012 em 7% ao ano. Pontua, contudo, que poderia ser mais. “Para ter o efeito necessário nos parece adequado ousadia, ou seja, 6% o mais rápido possível”, destaca.
Dados ruins – Esta quarta-feira foi marcada por indicadores que comprovam o mau momento do Brasil. O índice de vendas do varejo de maio, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), apontou queda mensal de 0,8% – a maior desde novembro 2008, quando se deu o estouro da crise financeira internacional e as vendas recuaram 1,3%. O número supreendeu negativamente o mercado, pois o varejo era o setor de melhor performance na economia em 2012. A inadimplência, por sua vez, subiu 19% no primeiro semestre ante os primeiros seis meses do ano passado, conforme divulgação da Serasa Experian.
Na semana passada, o IBGE revelou que a produção industrial recuou 0,9% em maio ante o mês anterior, o terceiro resultado negativo consecutivo neste tipo de comparação. Já o índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo mesmo instituto, acumula altas de 2,32% no ano e de 4,92% em doze meses até junho – número menor que os 4,99% registrados em maio, na mesma base de comparação. A desaceleração da alta dos preços é, em parte, reflexo da perda de ritmo da economia e abre espaço para juros mais módicos.
Para contornar a crise econômica, o Palácio do Planalto já anunciou, desde o início do ano, várias medidas, entre elas a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de eletrodomésticos, móveis e carros. Divulgou também um pacote de compras governamentais para ajudar setores retraídos. O anúncio desta quarta-feira do menor juro básico da história do país pode ser entendido como uma continuidade desta política.
Pessimismo – Os analistas ouvidos pelo site de VEJA, contudo, são céticos de que a presidente Dilma Rousseff e sua equipe conseguirão salvar o PIB nacional de uma performance pífia neste ano. Como pano de fundo, a Europa segue submersa em dificuldades financeiras, crescente endividamento, dúvidas sobre a força do euro e dificuldade de melhorar as contas públicas. Os Estados Unidos recuperam-se mais lentamente do que o previsto. A China – maior esperança do Brasil, por ser seu principal parceiro comercial – está desacelerando a olhos vistos. No Brasil, os empresários pisam no freio dos investimentos enquanto aguardam maior clareza do cenário internacional. O problema, disse o gerente de política econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, na semana passada, é que a produção não avança justamente por conta disso. "Se conseguirmos alavancar os investimentos, reverteremos situação no segundo semestre, com mais otimismo e com mudança de expectativa. O ano que vem pode ser ano de crescimento mais forte, desde que o investimento mostre vigor mais forte do que agora", considerou. Este cenário complexo, na visão dos economistas, reduz a eficácia das medidas do Planalto.
De olho em 2013 – Se para este ano o mercado prevê um PIB de, no máximo, 2,05% e novas quedas da Selic, alguns economistas já alertam que as projeções mudam completamente para o ano que vem. A expectativa para 2013 é de um quadro inflacionário com maiores riscos, o que deve levar o Copom a iniciar um novo ciclo de alta de juros. Economistas afirmam que esta e, sobretudo, as próximas três reuniões deste ano – 28/29 de agosto, 9/10 de outubro e 27/28 de novembro – começam a focar o cenário de 2013, dada a defasagem dos impactos da política monetária na economia.
Rafael Bacciotti, da Tendências Consultoria, elenca três fatores principais a adicionar risco ao quadro inflacionário do próximo ano. O primeiro é o aumento de preços administrados, especialmente por não se tratar de um ano de eleições e com possíveis reajustes de transporte público. Além disso, o cenário internacional não deve ser fator de forte contenção da inflação como tem sido em 2012. Por fim, a alta dos preços dos serviços deve se sustentar em patamares mais elevados do que a inflação cheia – um reflexo de um mercado de trabalho ainda positivo e da atividade econômica mais forte em 2013. Tudo isso num momento em que o PIB conviverá com taxas de juros reais em patamares historicamente reduzidos.
Alerta – Em seu relatório trimestral, o banco BNP Paribas alerta que, em algum momento do ano que vem, o governo pode ser, inclusive, obrigado a adotar medidas para desacelerar o crescimento, além de retomar a trajetória de alta da taxa básica de juros para 9%. Suas projeções apontam para um Produto Interno Bruto de 2% em 2012 e IPCA a 5,2%.
Sérgio Vale, economista da MB Associados, concorda com o banco francês sobre o aumento da Selic em 2013, mas ressalta que, desta vez, a escalada de juros será menos intensa do que vimos nos últimos anos. “Talvez não precisando chegar a dois dígitos, o que será, de fato, uma mudança estrutural importante para a economia brasileira”, afirma. Em sua visão, o próximo passo será a queda gradual da meta de inflação do país. "O patamar de 4,5% é um absurdamente elevado sob qualquer padrão e terá de ser discutido em algum momento nos próximos anos”, aponta.
Para o economista, a conjuntura externa também deve prosseguir sob o olhar atento do Banco Central. Em sua opinião, a crise internacional permanecerá por um bom tempo com risco de piorar e, provavelmente, o banco se apegará a esse argumento para justificar novas quedas, com Selic testando o patamar de até 6,5% neste ano.
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