Em plena segunda década do século 21, choca o anacronismo representado pela obrigatoriedade do serviço militar, relicário equivalente ao elixir do atraso que mantém vivo o patronato político brasileiro, o voto obrigatório.
Entre os países onde o serviço é obrigatório, podemos pinçar Equador, Colômbia, Cuba, localidades do norte da África, Israel, Rússia e China. Essas nações têm de lidar com problemas internos, como guerras civis e estados de guerra permanentes, disputas de fronteira e projetos hegemônicos de superpotências.
Qual é o sentido de o Brasil pertencer a tal grupo de países? Em julho deste ano, o serviço obrigatório foi abolido na Alemanha, alinhando-a aos Estados Unidos, onde há um registro dos jovens aos 18 anos somente para uso em contingentes emergenciais.
O serviço obrigatório não existe, e nem mesmo há tal cadastro em boa parte dos países europeus, em vários da África subsaariana (incluindo a África do Sul) e da península Arábica, e tampouco na Austrália, na Índia e no Paquistão.
O Brasil enfrentará novos desafios, relacionados ao pré-sal, à atuação na ONU, à defesa dos recursos naturais, das fronteiras secas e da plataforma continental. Tal tarefa não demanda um contingente grande de pessoal desqualificado, mas um grupo de homens e mulheres qualificados e motivados, que disponham de salários e equipamentos adequados.
As Forças Armadas estão sucateadas. Os principais armamentos (aviões, blindados e navios) estão, em grande parte, inutilizados. Alguns exemplos: 132 dos 318 equipamentos da Marinha estão parados; dos 1.953 blindados do Exército, somente metade funciona. Por fim, a Força Aérea tem disponíveis 85 dos seus 208 caças.
Todo esse problema exige um plano urgente de recuperação. As Forças Armadas devem buscar eficiência com um projeto de profissionalização. Saltam aos olhos distorções como esta: nos EUA, há um oficial-general para cada 1.400 soldados, ao passo que aqui existe um para cada 971 homens.
Diante de quadro tão desalentador, qual seria a racionalidade do serviço obrigatório? O serviço militar seria um dos poucos momentos de socialização republicana dos cidadãos de todas as classes sociais no Brasil (se fosse estendido às mulheres). Mas tal papel poderia ser desempenhado com o serviço civil alternativo.
Forças Armadas modernas são compostas por soldadas e soldados qualificados; são intensivas em capital humano e equipamentos, não em trabalho desqualificado.
Em 1910, nossa frota naval, em quantidade e qualidade, perdia somente para a britânica. Mas nossos marinheiros eram analfabetos e desqualificados. Ironicamente, João Cândido Felisberto, um deles, sabia como conduzir uma das naus com esmero. Mas isso foi apenas fruto do acaso.
O Brasil precisa de Forças Armadas modernas e profissionais, onde não prevaleçam Felisbertos, sucateamento e preceitos atávicos.
MARCOS FERNANDES G. DA SILVA é economista da Fundação Getulio Vargas, autor de "Ética e Economia", "Economia Política da Corrupção no Brasil" e "Formação Econômica do Brasil: Uma Reinterpretação Contemporânea".
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