Conselho vai criar proposta de lei para regular o uso de balas de borracha, spray de pimenta e gás lacrimogêneo
Cilene Pereira e Mônica TarantinoA utilização de armas de baixa letalidade no Brasil não é regulamentada por nenhuma lei, uma circunstância que deixa margem ao uso por vezes inadequado e, nesses casos, de difícil punição. No entanto, uma resolução firmada na terça-feira 18 pelo Conselho de Defesa da Pessoa Humana, vinculado à Secretaria de Direitos Humanos, deu o primeiro passo para começar a mudar o panorama por tantas vezes repetido na repressão a manifestantes nas últimas semanas. O documento recomenda que não devem ser usadas armas de fogo em manifestações e eventos públicos e considera que a utilização de instrumentos como spray de pimenta e balas de borracha só é aceitável quando comprovadamente necessário – para resguardar a segurança do agente policial e de terceiros ou quando há ameaças contra prédios públicos e privados, por exemplo. “Elas devem ser o último recurso”, diz o procurador federal dos Direitos do Cidadão, Aurélio Rios, relator do processo que culminou na resolução. “Não pode haver o uso genérico, banal, abusivo.” A resolução afirma ainda que armas não deverão, sob nenhuma hipótese, ser usadas contra crianças, adolescentes, gestantes, idosos e pessoas com deficiência.
EXCESSOS
A atitude do policial está totalmente errada. O spray de pimenta
só pode ser jogado a pelo menos dois metros de distância.
E o gás lacrimogêneo pode levar a sufocamento
Segundo o procurador, o que norteia a postura das polícias brasileiras são regras internas, inspiradas em normas internacionais obedecidas por outras forças policiais, como a Interpol. Em muitos países, a maioria segue os parâmetros determinados pela Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte). É assim nos Estados Unidos e no Brasil.
Estabelecer precisamente em quais circunstâncias e de que maneira a polícia pode recorrer a esses instrumentos é mesmo urgente. Há alguns anos que spray de pimenta, bomba de gás lacrimogêneo e balas de borracha deixaram de ser considerados armas não letais. Passaram a ser classificados como menos letais. Ou seja, embora tenham um risco pequeno de matar, matam se forem manuseados por profissionais despreparados. “Dependendo da distância em que é atirada, a bala de borracha pode perfurar a pele e matar”, afirma Pedro Miranda, proprietário de uma empresa de explosivos e especialista em armas menos letais. De acordo com a organização espanhola Stop Bala de Goma, elas podem causar hemorragia cerebral e perfurações intestinal e pulmonar, entre outros danos. “E o excesso de gás lacrimogêneo em um ambiente mais fechado pode levar ao sufocamento e à morte”, complementa Miranda.
O spray de pimenta, por sua vez, pode causar lesões respiratórias com possibilidade de causar óbito. É por essa razão que uma das regras na sua utilização determina que, dependendo da concentração e da distância, só pode ser espargido a dez, a cinco e a dois metros de distância da pessoa. Situações como a da garota recebendo um jato de spray de pimenta bem próximo e diretamente no rosto, portanto, vão contra qualquer padrão de norma de uso. “No Batalhão de Choque, os policiais trabalham em formação. Quando um deles sai sozinho para atingir alguém, é sinal que é mal preparado”, avalia o coronel José Vicente da Silva Filho, professor do Centro de Altos Estudos da Polícia Militar de São Paulo.
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