Texto estabelece, entre outros pontos, as regras para a instauração de procedimentos administrativos disciplinares contra juíze
Do Portal TerraO presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso, anunciou nesta quarta-feira (1º) o adiamento do julgamento da ação direta de inconstitucionalidade (ADI) que pode culminar em restrições ao poder de atuação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Os ministros começaram a analisar na sessão plenária de hoje a ADI proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que discorda de diversos pontos da resolução 135 do CNJ. Esse texto estabelece, entre outros pontos, as regras para a instauração de procedimentos administrativos disciplinares contra juízes.
Antes da interrupção do julgamento, os ministros analisaram três questionamentos da Associação dos Magistrados. Um deles é sobre o artigo 2º da resolução do CNJ, que traz a classificação do colegiado como um "tribunal". Para a entidade, se fosse mantida esta parte da resolução, abriria-se um espaço para a interpretação de que o CNJ poderia atuar, por exemplo, como uma instância de revisão de uma decisão tomada por um tribunal. O STF entendeu, no entanto, que o CNJ é um apenas órgão administrativo.
Também no rol de contestações da AMB está a alegação de que o Conselho Nacional de Justiça garantiu para si o direito de determinar a aposentadoria compulsória de juízes e desembargadores condenados sem prever que o magistrado pudesse continuar recebendo salário proporcional ao tempo de serviço. O STF entendeu, entretanto, que o trecho questionado não abre espaço para a aposentadoria sem o recebimento de proventos. "É inerente à aposentadoria a percepção de proventos. Do contrário, tratar-se-ia de perda do cargo, o que se mostra possível somente mediante sentença judicial transitada em julgado", disse o relator do caso, ministro Marco Aurélio.
Por fim, o Plenário do STF também analisou questionamento da AMB sobre o fato de o CNJ poder prever sanções administrativas civis e penais no caso de juízes condenados por abuso de autoridade. Para o STF, porém, apenas a Lei Orgânica da Magistratura (Loman) poderia estabelecer essas penalidades, e não um órgão administrativo como o CNJ.
Apesar do julgamento desses três trechos da resolução 135 do CNJ, apenas nesta quinta-feira é que o Supremo Tribunal Federal deverá discutir os pontos de maior crítica ao Conselho Nacional de Justiça, como o poder de investigar diretamente juízes suspeitos de irregularidades sem passar anteriormente pelas corregedorias dos tribunais.
No início de seu voto, o relator do caso, Marco Aurélio, defendeu a "autonomia político-administrativa dos tribunais enquanto instituições dotadas de capacidade administrativa e disciplinar" e disse que o CNJ não pode transformá-los em "meros órgãos autômatos". Para ele, a atuação do Conselho Nacional de Justiça estaria assegurada, por exemplo, caso o órgão verifique que haja demora ou influência de um magistrado no andamento de um processo contra determinado juiz.
"A competência normativa do Conselho Nacional de Justiça, reconhecida pela sempre ilustrada maioria, não surge para elidir a dos tribunais. Esse órgão, a título de uniformizar as regras concernentes ao processo disciplinar aplicável aos magistrados, não pode atropelar o autogoverno dos tribunais, tampouco pode invadir a esfera de competência reservada ao legislador, ao Congresso Nacional", opinou.
Na avaliação do ministro, o CNJ não poderia extrapolar ao criar novas sanções contra juízes alvo de suspeição. "Não incumbe ao Conselho Nacional de Justiça criar deveres, direitos e sanções administrativas, mediante resolução, ou substituir-se ao Congresso e alterar as regras previstas na Lei Orgânica da Magistratura referentes ao processo disciplinar", disse o ministro. Ele lembrou que, ainda que a Loman não descreva todas as questões relacionadas a desvios disciplinares de juízes, apenas o Congresso Nacional, e não o CNJ, pode aperfeiçoar a legislação.
AMB
No início do julgamento, em sustentação oral, o advogado da AMB, Alberto Pavie Ribeiro, disse que a entidade não pretende acabar com o direito do CNJ de atuar em processos disciplinares contra magistrados, e sim garantir que ele atue dentro dos seus limites. Conforme a entidade, esses limites incluem, por exemplo, que as corregedorias dos tribunais, instâncias inferiores que analisam ilícitos cometidos por juízes, possam atuar conforme prevê a Constituição e sem garantir um "cheque em branco" ao CNJ ou o direito de o órgão de controle do Judiciário se transformar em um "super órgão sem qualquer critério previamente definido".
"Havendo vícios nos procedimentos instaurados nas corregedorias, poderá o CNJ avocar (trazer para si a análise do) o processo. E assim fará tanto para absolver quanto para condenar. Não está a AMB pedindo a extinção de qualquer competência disciplinar do CNJ. O regime disciplinar concebido previa a existência das corregedorias estaduais e o conselho com competência subsidiária", disse ele.
OAB
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, que falou durante o julgamento em defesa dos atuais poderes do CNJ, disse que apenas graças ao órgão de controle do Judiciário é que se pôde conhecer o real funcionamento da Justiça, inclusive os desvios disciplinares de alguns juízes. Para ele, está claro que o Conselho Nacional pode atuar ao mesmo tempo em que as corregedorias dos tribunais sem que isso represente uma ilegalidade.
"Não se está aqui em uma luta entre advogados e magistrados. A luta que está aqui é a respeito daquilo que queremos para a Justiça brasileira. O que se busca é competência plena do CNJ", resumiu ele.
Advocacia-geral da União
Defensor dos atuais poderes do CNJ, o advogado-geral da União (AGU), Luís Inácio Adams, disse que a atuação do colegiado não afronta o direito das corregedorias dos tribunais nem corresponde a qualquer "violação funcional" do órgão de controle externo do Judiciário.
"A competência do CNJ é concorrente e vem sendo exercida em compatibilidade com as corregedorias, e não contra as corregedorias. O CNJ surge com poder central para o feito de controle administrativo da atividade jurisdicional. A maioria das reclamações e procedimentos apresentados no CNJ não são tratados diretamente pelo CNJ, mas em parceria às próprias corregedorias locais", destacou o AGU, que condenou ainda o fato de o caso ter se transformado em uma "discussão midiática pautada pelos extremos".
Ministério Público
Em nome do Ministério Público, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, lembrou, por sua vez, que a insuficiência dos órgãos de controle interno e o déficit de atuação das corregedorias locais nos tribunais foram motivos para a criação do CNJ e argumentou que a criação do colegiado e de suas atuais funções não viola os direitos de advogados e juízes investigados.
"Não se mostra razoável atribuir ao CNJ desde a sua instalação o intento de desprezar sistematicamente a autonomia dos tribunais brasileiros. A resolução 135 amplia diversos mecanismos para a garantia da defesa dos magistrados investigados. Não há nenhuma ideia preconcebida na resolução no sentido de desrespeitar ou aviltar a magistratura nacional, o que evidentemente seria inaceitável", disse ele.
Ao defender o poder de atuação do CNJ, o chefe do Ministério Público resumiu: "subordinar a atuação do CNJ (...) à atuação das corregedorias locais seria incongruente em face da própria razão de existir do órgão e da vontade da Constituição Federal de assegurar o controle administrativo, financeiro e disciplinar efetivo".
O Supremo Tribunal Federal deve retomar o julgamento sobre os poderes de atuação do CNJ a partir das 14h desta quinta-feira.
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