Governo francês aumenta carga de impostos
sobre os ganhos dos mais ricos e provoca uma reação inesperada: a
debandada dos abastados para países vizinhos
Pedro Marcondes de Moura
O ator Alain Delon, mito do cinema nas décadas de 1960 e 1970, se
mandou para a Suíça. Chef estrelado do guia “Michelin”, Alain Ducasse
bateu em retirada. Bernard Arnault, dono da marca Louis Vuitton, pediu
cidadania belga. Isabelle Adjani, atriz consagrada, Jo-Wilfried Tsonga,
número 6 do ranking mundial do tênis, Laetitia Casta, modelo
internacional, Charles Aznavour, um dos mais populares cantores
europeus, todos eles têm em comum, além da nacionalidade francesa e da
farta conta bancária, o fato de terem se bandeado para outras nações.
Eles são o que os franceses chamam de exilados fiscais, a casta de
compatriotas ricos que escolheu viver em territórios vizinhos para
escapar da elevada carga tributária. A revolta dos bilionários se
agravou no domingo 9, quando o presidente François Hollande, que assumiu
o comando do país há quatro meses, anunciou uma mordida de 75% sobre os
ganhos de quem recebe acima de um milhão de euros anualmente (o novo
percentual vale pelos próximos dois anos). Para justificar a medida,
Hollande afirmou que a estratégia é reerguer a nação sem desmontar as
bases do sistema de seguridade social. O cenário preocupa: o desemprego
afeta um em cada dez franceses, a dívida pública está perto de 90% do
PIB e a economia desacelera perigosamente.
AUSTERIDADE
Presidente socialista François Hollande mantém promessa de taxar ricos
A debandada dos bilionários acompanhou o crescimento do candidato do
Partido Socialista, François Hollande, na corrida à Presidência. Antes
de sacramentar o retorno da legenda ao poder após um hiato de 17 anos
desde a saída de François Mitterrand, Hollande já alardeava que os ricos
seriam seu alvo preferencial no programa de elevação de impostos. Para o
cientista político francês Stéphane Monclaire, da Universidade de
Paris, taxar os milionários é uma iniciativa mais simbólica do que
efetiva. Estima-se que não mais do que 30 mil franceses estão na faixa
de rendimentos atingida pela guilhotina de 75%. “Os aumentos menores dos
impostos em cima da classe média e dos lucros das empresas é que devem
ampliar a arrecadação”, diz Monclaire. Para os que recebem acima de 150
mil euros, a mordida passará de 41% (percentual até então válido para a
classe média, para os ricos e para os muito ricos) para 45%.
Em meio às incertezas econômicas, os franceses tentam adivinhar quem
será o próximo exilado fiscal. Uma suspeita recaiu sobre a atriz
Emmanuelle Béart, celebridade no país, que precisou negar as informações
de que, por ter residência na Bélgica, pagava tributos por lá. “Eu
moro, trabalho e pago meus impostos na França”, disse Emmanuelle. “Acho
que é indecente o exílio fiscal, especialmente em tempos de crise.” Não
faltam convites para que os endinheirados se retirem. O
primeiro-ministro inglês, James Cameron, declarou recentemente que
estenderia tapetes vermelhos aos vizinhos abonados. O caso mais
emblemático foi mesmo o do empresário Bernard Arnault. Com uma fortuna
estimada em US$ 41 bilhões e o título de homem mais rico da França, ele
controla marcas como Louis Vuitton, Moët Chandon e Givenchy. Um dia após
o presidente Hollande anunciar o novo tributo, um veículo de
comunicação belga divulgou que Arnault pediu cidadania ao país. Mesmo
negando a intenção de deixar de pagar seus tributos na França, o
empresário se tornou uma espécie de vilão. Autoridades socialistas logo
resolveram colocá-lo como o símbolo máximo daqueles que, enquanto os
outros dividem o pão, preferem fugir com a cesta de brioches.
Fotos: BALTEL/SIPA; YOAN VALAT/EPA; Zuma Press/Glow Images; ANTONIOL ANTOINE/SIPA
Foto: Fred Dufour/Pool/REUTERS
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