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domingo, 7 de julho de 2013

Passe livre aéreo

Surdos para os protestos que vêm das ruas, autoridades fazem viagens particulares com dinheiro público e aviões da FAB ao custo de R$ 1 milhão

Mário Simas Filho
Foi uma bofetada na cara dos brasileiros a desfaçatez mostrada pelos presidentes do Senado, da Câmara e do Supremo Tribunal Federal e pelo ministro da Previdência nas últimas semanas. No momento em que as ruas eram tomadas por mais de um milhão de pessoas exigindo decência com o uso do dinheiro público, Renan Calheiros (PMDB-AL), Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e Garibaldi Alves (PMDB-RN) usaram três aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) para voarem, na companhia de familiares e amigos. Renan foi a uma festa de casamento em Porto Seguro. Garibaldi e Henrique Alves viajaram ao Rio de Janeiro para torcerem pelo Brasil na final da Copa das Confederações. No início do mês, Joaquim Barbosa, o presidente do STF, usou dinheiro do Judiciário para pagar a passagem de avião ao Rio de Janeiro, para assistir ao confronto entre Brasil e Inglaterra. Na semana que antecedeu à final da Copa das Confederações, Renan e Henrique Alves adotaram no Congresso o discurso da transparência e da austeridade para poder fazer frente aos gritos que vinham das manifestações em todo o País. O ministro Garibaldi defendia a rigidez nos gastos públicos e o presidente do STF, Joaquim Barbosa, pediu mais ética na política. Os quatro, no entanto, deixaram claro que não entenderam os recados populares e continuam brincando com fogo.
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MORDOMIA
Barbosa, Renan, Henrique Alves e Garibaldi (da esq. à dir.): conforto em
jatos da FAB com capacidade para transportar até 50 pessoas
Oficialmente, a FAB alega razões de segurança para manter em sigilo os custos do passe livre aéreo. Mas, na sexta-feira 5, um oficial da FAB em São Paulo afirmou à ISTOÉ que a mordomia custou aproximadamente R$ 1 milhão. “Deslocar do Nordeste para o Rio de Janeiro um avião com capacidade para 15 ou 20 passageiros custa pelo menos R$ 200 mil. Como não houve um planejamento antecipado, pelo menos dois desses aviões foram deslocados de Brasília para o Nordeste apenas para buscar a autoridade e seus convidados e isso aumenta ainda mais o custo”, disse o oficial.
Sem esperar no aeroporto, sem fila de check-in e sem problemas com o tráfego aéreo, o presidente da Câmara, Henrique Alves, embarcou em área reservada no aeroporto de Natal na noite da sexta-feira 28. Estava acompanhado de um filho, da noiva, Laurita Arruda, dois filhos e um irmão dela com esposa, totalizando sete privilegiados passageiros. A viagem foi confortável, pois dividiram um jato C-99, com capacidade para transportar até 50 pessoas. No domingo às 23 horas, o grupo deixou o Rio de Janeiro a bordo do mesmo avião. “Reconheço que errei e vou ressarcir o valor de cada passagem”, disse o deputado na quarta-feira 3, depois que a mordomia camuflada se tornou pública. Em seguida, novamente Henrique Alves debochou dos brasileiros. Devolveu R$ 9,7 mil. Ou seja, viajou como magnata e pagou como turista de classe econômica em voo promocional. Não se trata, contudo, apenas de uma questão financeira. A devolução do valor irrisório não repara o mal dos recursos públicos no instante em que a sociedade clama por novos costumes políticos.
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TORCIDA
Henrique Alves e a noiva no Maracanã: viagem de primeira
classe com valor de econômica em voo promocional
A farra com os jatos da FAB revela o quanto esses antigos e nefastos costumes estão enraizados nos políticos e como eles têm o habito de misturar o público e o privado, sempre em prejuízo do público. No sábado 15 de junho, o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros, deixou Maceió a bordo de um jato C-99 da FAB com destino a Porto Seguro. Estava acompanhado da mulher e de outras pessoas que a Aeronáutica não revela os nomes. A missão do senador: participar da festa de casamento da filha do líder do governo no Senado, Eduardo Braga. Na madrugada do dia seguinte, Renan retornou com o mesmo avião. Na semana passada, o senador afirmou considerar absolutamente normal a mordomia. Disse que como presidente do Legislativo tem direito a usar os aviões da FAB e que nem mesmo a Força Aérea pode interferir nisso. “Não cabe à FAB determinar o que as autoridades podem ou não, nós é que temos o que dizer para a FAB”, afirmou Renan. O decreto 4244, de 2002, disciplina essa questão e permite o uso dos aviões da FAB pelas autoridades quando houver “motivo de segurança e emergência médica, em viagens a serviço e em deslocamentos para o local de residência”. Renan não reside em Porto Seguro, não está sofrendo ameaças nem declarou necessidade médica de tratar-se à beira-mar. Ele afirma, porém, que estava a serviço na festa de casamento da filha de Eduardo Braga. Na sexta-feira 5, Renan mudou de ideia e afirmou que iria devolver R$ 32 mil aos cofres púbicos. Mesmo assim, é bem provável que os gritos de “Fora Renan” ecoem ainda mais fortes no gramado diante do Congresso.
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Joaquim Barbosa que não perde a chance de alfinetar por razões éticas ministros, deputados e senadores, também prestigiou a seleção no Maracanã, mas seu deslocamento foi pago com dinheiro público. Até a sexta-feira 5, ele não havia feito nenhum comentário a respeito. Já o ministro da Previdência, Garibaldi Alves, planejava usar um voo de carreira para chegar ao Rio no domingo 30. Disse até que tinha comprado a passagem, mas mudou de ideia. Ele estava em Fortaleza e resolveu solicitar um jato da FAB para voar ao Rio. Embarcou com o amigo Glauber Gentil em um Learjet 35, que pode transportar até oito passageiros. Voltou para Brasília em voo de carreira. “Como estava em Fortaleza a serviço, me achei no direito de o avião voar para onde eu quisesse ficar”, afirmou o ministro em verdadeiro descompasso com o que se passa pelas ruas do País. “Já fiz isso outras vezes”, concluiu. Se depender dos recados que vêem sendo dados pelos brasileiros, é muito provável que o ministro esteja com a carreira política próximo da aterrissagem.

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