Condenado a 13 anos de cadeia, Natan Donadon saiu da prisão para ser absolvido na Câmara. Com a decisão de preservar o mandato do colega, os parlamentares submeteram o Brasil a um vexame histórico e criaram precedentes para salvar mensaleiros
Josie JeronimoSALVO
No plenário, o deputado Natan Donadon se ajoelha (acima) após
a absolvição: “Não sou ladrão”, jurou. O parlamentar deixou a Câmara
algemado (abaixo) rumo ao presídio da Papuda, em Brasília
Com bottom de parlamentar, terno bem
alinhado e algemas, o deputado Natan Donadon deixou a Câmara dos
Deputados na noite de quarta-feira 28 do mesmo modo que entrou: como um
inusitado detento com mandato parlamentar. Durante a votação do pedido
de sua cassação, muitos colegas não se preocuparam com sua ficha
corrida, que inclui a condenação pelo desvio de R$ 8,4 milhões da
Assembleia Legislativa de Rondônia, de 1995 a 1998, quando era diretor
financeiro da instituição. O rosto abatido e as lamentações da vida de
presidiário que rechearam o discurso de Donadon comoveram parte do
plenário, naquela altura já contaminado pelo espírito de corpo. O
conforto covarde do sigilo do voto serviu como mais um estímulo para que
centenas de colegas se sentissem ainda mais à vontade para salvar o
mandato do parlamentar, que cumpre pena na Penitenciária da Papuda,
Distrito Federal, há dois meses. No total, foram 233 votos pela
cassação, 24 a menos do que o exigido, 131 pela absolvição e 41
abstenções, sendo o PT o partido que mais contribuiu com as ausências,
(21 no total). O resultado, além de representar uma afronta à sociedade,
no rastro das manifestações populares, sugere a intenção de se
preservar os mandatos de condenados no processo do mensalão.
A salvação de Donadon foi costurada duas
horas antes da votação em plenário. Deputados do PDT, PMDB e PT se
mobilizaram para espalhar entre os colegas a tese de que tirar o mandato
de Donadon significava admitir que o Supremo Tribunal Federal (STF)
estava certo ao decretar o destino político dos réus do mensalão. “Não
vote pela cassação. Nós somos mais importantes do que o Supremo”,
apelava o deputado Nilton Capixaba (PTB-RO), aos colegas. Outro
importante cabo eleitoral de Donadon foi Sérgio Moraes (PTB-RS), que em
2009 cunhou a polêmica frase “Estou me lixando para a opinião pública”.
Demais parlamentares investigados em processos de corrupção – como João
Pizzolatti (PP-SC) – também tentavam convencer os deputados a absolver
Donadon, com o mesmo argumento da briga entre os Poderes. Mas houve quem
também levasse em conta fatores sentimentais. As parlamentares
mulheres, por exemplo, pareciam tocadas com a presença da família de
Donadon em plenário e admitiam ter dificuldades em apeá-lo do cargo.
Assim, somente as bancadas do PSDB, DEM, PPS, PSB e PSD declararam apoio
à cassação de Donadon. “É um constrangimento tomar posição em uma
situação dessas, é um colega. Com certeza, se o voto fosse aberto, seria
outro placar. O parlamentar chega lá, muito abatido, cumprimenta todo
mundo. Não é bom ver ninguém nessa situação”, admitiu o deputado
Capixaba.
Placar da impunidade
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