Quando a Apple lançou a nova geração de iPods no começo do mês, o site brasileiro da empresa resolveu mostrar ao consumidor o que ele estava pagando de fato pelo produto. Ao lado do valor do Nano 8GB, que custa R$ 597, um asterisco alerta: “Inclui R$ 197 em impostos e taxas”. Foi uma maneira sutil encontrada pela companhia para dizer: “Sim, nossos produtos são caros, mas a culpa é do seu governo”. Proporcionalmente ao valor do produto, a taxa brasileira é gigantesca quando comparada a de outros países. No Brasil, os impostos do iPod equivalem a 33% do produto. Na Inglaterra, a 20%.
A discrepância entre os preços de produto idênticos no Brasil e no exterior poderia ocupar toda esta página. De carros a gasolina e de videogames a roupas, os brasileiros quase sempre pagam mais. O vilão do preço alto é velho conhecido dos contribuintes: os impostos. Ainda que a variável mais determinante para a formação do preço, porém, a tributação não é a única explicação para o fenômeno dos produtos caros no Brasil, segundo especialistas. O sistema financeiro, com altas taxas de juros, e até mesmo a economia aquecida, que diminui a possibilidade de descontos, também podem contribuir para diminuir o poder de compra do brasileiro.
Suponhamos o trajeto de um console de videogame até ele chegar ao consumidor final. Fabricado em Taiwan, o produto sai do país asiático a um custo X. Caso fosse vendido no balcão da fábrica, é razoável supor que o preço seria de X mais a margem de lucro. Como precisa atravessar oceanos, o primeiro adicional no valor é o custo do próprio frete. Chegando ao Brasil, o eletrônico paga uma taxa de importação, segundo tabela da Receita Federal. Somam-se em seguida outros impostos, como Pis, Cofins, IPI e ICMS. No fim da conta, um video-game que chegue custando R$ 500, por exemplo, pagaria algo em torno de 150% de taxas sobre seu valor até alcançar as prateleiras – chegando à cifra de R$ 1,25 mil. O preço do console ainda é acrescido da margem de lucro da fabricante e da margem de lucro do revendedor. O PlayStation 3, da Sony, que foi lançado oficialmente no Brasil apenas no mês passado (com atraso de quatro anos), custa R$ 1.999 em seu modelo mais básico. Nos EUA, ele sai por R$ 513.
Ao todo, segundo a Associação Comercial do Paraná (ACP), há 83 tipos de impostos e taxas que ajudam a formar o preço dos produtos no Brasil – na maioria dos casos, eles respondem pela metade do valor cobrado pelo consumidor, de acordo com a entidade. “A tributação brasileira possui efeito cascata. Temos impostos sobre consumo – ICMS, IPI, PIS e Cofins –, sobre a folha de salários – INSS e FGTS, principalmente – e sobre o lucro – como o Imposto de Renda. Quando o produto chega no consumidor, todas essas taxas já estão embutidas no valor final, contribuindo para o encarecimento do produto”, afirma João Eloi Olenike, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT).
Carros
O setor de automóveis é um bom exemplo de que os impostos não são o único motivo do preço alto. Dois aspectos ligados ao segmento podem ser usados para elucidar a formação do preço. “Quando você compara o carro feito aqui com um fabricado em outro país, como no Japão, é preciso lembrar que as plantas brasileiras não são tecnologicamente tão avançadas quanto lá. Isso quer dizer que o Brasil usa um número maior de funcionários por carro fabricado. Esse custo, claro, tem um impacto no preço final”, diz Olivier Girard, da Macrologística Consultores, especializada em infraestrutura de transportes.
Ele também cita outros dois fatores, ligados ao sistema financeiro do país. “O carro financiado sai bem mais caro aqui, porque se embute uma taxa de juros muito mais alta do que em qualquer lugar no mundo. Há, também, a questão da própria captação de recursos por parte das fabricantes e fornecedoras. Elas também vão ao mercado e pagam taxas altas pelas linhas de financiamento disponíveis. Tudo isso é custo”, afirma.
Girard lembra ainda que a economia aquecida faz com que as concessionárias não apliquem descontos nos preços. “Se você tem dez pessoas dentro da sua loja, você tem opção para quem vender. Se você tiver só uma, vai fazer de tudo para que ela compre o carro.”
Eleição
Candidatos ignoram tributação
Mais uma eleição, e mais uma vez a questão dos impostos passou longe da atenção dos candidatos. Como a economia brasileira vive um bom momento, a análise de especialistas é de que os candidatos de oposição relutaram em discutir a questão porque o tema poderia acabar favorecendo a situação. Para presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), João Eloi Olenike, os candidatos ignoram a questão porque não há, entre os eleitores, uma demanda pelo assunto. “Não é a prioridade do eleitor. A população de menor renda desconhece a questão da tributação. Para o candidato, portanto, faz muito mais sentido abordar temas que falam diretamente com o eleitor, como questão de Bolsa Família, alimentação e emprego.” Segundo ele, a melhor maneira para reverter esse quadro numa eleição futura é aumentar a conscientização da população sobre o tema. “Hoje o contribuinte não sabe o quanto está pagando de impostos em cada produto. Ele compra, sabe que é caro, mas não sabe o motivo. Não tem consciência porque não há transparência sobre como funciona o sistema tributário.” Desde 2007, tramita no Congresso o projeto de lei PL-1472, do senador Renan Calheiros, que “estabelece medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços, através do documento fiscal ou em painel eletrônico visível no ato da compra.”
Vantagem
Compra nos EUA paga viagem
Grávida de sete meses e meio, a dentista Nicia Jansen Pereira, de 27 anos, viajou com o marido para os Estados Unidos para comprar o enxoval do bebê. Segundo ela, a diferença no preço dos produtos foi tamanha que pagou pela viagem. Uma babá eletrônica com monitor de sete polegadas saiu por R$ 393 (US$ 229), enquanto um modelo de menor qualidade aqui, com tela de uma polegada, custa R$ 2.340. O carrinho, que custa R$ 1,6 mil no Brasil, saiu por pouco mais de R$ 300 (US$ 180) lá. A cadeirinha para carro, R$ 1.150 aqui, foi comprada em Miami por R$ 256 (US$ 149). “Sobre esses preços ainda pagamos a taxa de imposto, de 6%. Mas com certeza a viagem foi paga só na diferença dos preços. Como a ideia era ir só para fazer as compras, compramos um pacote de viagem mais barato. Além desses produtos maiores, ainda compramos bastante coisa menor, principalmente roupas”, afirma ela.
O impacto da gastança de brasileiros no exterior ficou claro na última semana, quando o Banco Central divulgou o saldo na conta de viagens internacionais – a diferença entre o que os estrangeiros gastam no país e o que os turistas brasileiros gastam no exterior. O déficit atingiu um novo recorde, alcançando a marca de US$ 10 bilhões. Segundo o BC, o resultado ocorre devido ao aumento do gasto do brasileiro lá fora, e não à redução do gasto de turistas aqui, já que essa taxa continua crescendo, mas a nível menos elevado. A expectativa é de que esse movimento continue crescendo e o déficit chegue a US$ 11,5 bilhões no ano que vem.
Outro indicador de que o brasileiro gosta de comprar no exterior é o dado do governo americano de que o turista do país é o que mais gasta nos Estados Unidos. Em 2009, foram US$ 4,8 mil por visitante brasileiro no ano. Em seguida aparecem australianos (US$ 4,7 mil/visitante), japoneses (US$ 4,5 mil/visitante) e franceses (US$, 3,5 mil/visitante).
A jornalista Priscila Seixas foi outra que aproveitou a gravidez para comprar acessórios para o bebê nos EUA. Ela e o marido foram, de férias, para Nova York, e depois passaram em Miami para fazer as compras. “Levamos dicas de pessoas conhecidas que fizeram a mesma coisa. Lá você compra roupas de marcas legais a preço muito barato. Compra cinco peças por dez dólares. Vale muito a pena”, garante.
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