Apenas um dos 19 reservatórios da Região Metropolitana de Fortaleza possui volume considerado bom
Símbolo
de resistência à seca, o mandacaru dá sinais de que está perdendo a
luta contra a pior estiagem enfrentada pelo cearense nos últimos 50
anos. A falta de chuvas prolongada castiga não só o sertão, mas chega
muito perto da Capital. Basta percorrer os municípios da Região
Metropolitana de Fortaleza e Maciço de Baturité para perceber os
estragos causados e os impactos sobre as comunidades não só da sede,
mas, principalmente dos distritos. Poços e pequenos reservatórios
secaram e os açudes da Bacia Metropolitana estão com 30,5% de sua
capacidade. Os dados são da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos
(Cogerh) que, em parceria com o Departamento Nacional de Obras Contra as
Secas (Dnocs), monitora 139 açudes no Ceará.
O
Açude Amanary, em Maranguape, tem uma das piores situações: 8,7% de
armazenamento. No distrito de São João do Amanari, é comum observar
carros-pipas e pessoas com baldes e latas nas mãos em busca de água
Foto: José Leomar
Dos 19 reservatórios, apenas o Gavião, em
Pacatuba, está com 93,4% de seu volume total. O restante possui menos de
50% de água. Na pior situação, o Penedo, em Maranguape, com apenas
2,47% de armazenamento; o Amanary, no mesmo município, com 8,7% e o
Pompeu Sobrinho, em Choró, com 14,16%. Também em situação preocupante, o
Pesqueiro, em Capistrano, com 20,3% de volume; o Castro, em Itapiúna,
com 20,9% e o Sítios Novos, em Caucaia, com 29,79% de água.
No
cenário de escassez, observar carros-pipas e pessoas quase desesperadas
com baldes e latas nas mãos em busca de água é panorama comum. No
distrito de São João do Amanari, em Maranguape, o casal Valcenir Viana e
Antônia Daiane Lima faz o que pode para sobreviver com um pouco de água
no dia a dia. Eles moram quase às margens do Açude Amanary, que está
praticamente seco.
"A água que sobrou é esverdeada e com
mau-cheiro e não podemos usar para beber ou cozinhar. Para isso, a gente
vai até um cacimbão comunitário mais adiante para encher dois baldes
por dia", conta Valcenir, olhando o reservatório. "Quando cheguei aqui,
uns anos passados, isso era pra mim uma imensidão de água e achava que
nunca iria acabar, mas tá acabando", lamenta o vaqueiro.
Abastecimento
Na
sede do distrito, a dona de casa Celeste Soares conta que o
abastecimento também está comprometido. "Temos água nas torneiras, mas
isso só de três em três dias. A luta por água aqui é grande. Muitos já
perderam gado com essa estiagem dos diabos", afirma.
Em Penedo,
cisternas de mil litros estão espalhadas pelas ruas do distrito. Elas
são abastecidas pelos carros-pipa que percorrem as cidadezinhas, levando
um pouco de alento para os moradores. "Aqui é assim, quando a água
chega é uma correria danada. Tem vez que falta por dias e dias. É muito
sofrimento", lastima o comerciante Francisco Soares, enquanto enche duas
latas de água e segue para casa. Ele mora com esposa, filhos e neto e
garante que nunca passou por tempo pior. "É de fazer chorar", reafirma.
Nas
proximidades do Açude Penedo, moradores cavam um poço profundo. Até
agora, muito barro e lama. "Vamos continuar cavando", afirmam.
O
assessor de Desenvolvimento Rural da Associação dos Prefeitos do Estado
do Ceará (Aprece), Nicolas Fabri, aponta que uma das dificuldades dos
municípios da RMF é que eles não são enquadrados como semiárido, um dos
critérios para entrar no Programa das Cisternas, do governo federal.
"Nesses
casos, os prefeitos estão colocando reservatórios da maneira que podem
no meio da rua e de praças dessas localidades para assegurar o
abastecimento", informa.
Para ele, os açudes com 30% de
capacidade ainda não é de entrar em desespero. "Somente aqueles como o
Penedo ou Amanary, quase secos totalmente, trazem preocupação para as
populações da zona rural", frisa.
Ele acredita que a situação dos
açudes monitorados e os investimentos realizados pelo governo do
Estado, nos últimos anos, garantem a segurança hídrica necessária ao
consumo humano, industrial e de outros usos, como é o caso do Eixão das
Águas, até o início da quadra chuvosa de 2014.
"Nossa maior
atenção recaem sobre municípios onde o perigo de colapso total no
abastecimento está bem próximo, como os casos de Canindé e Irauçuba",
destaca Fabri.
Racionamento
Em Aratuba,
Caririaçu, Moraújo, Pacoti, Guaramiranga, Mulungu, Palmácia, Potiretama e
Pacujá já é recomendado o racionamento de água. "Nesses municípios
localizados na serra, onde a fonte principal de abastecimento é o poço, é
preciso, sim, ter cuidado para que a água chegue até à próxima estação
chuvosa", aconselha.
A reportagem tentou inúmeras vezes ouvir a
Cogerh sem sucesso. A pessoa indicada para falar em nome da companhia
não teve hora na agenda para responder as perguntas.
FIQUE POR DENTRO
178 municípios em situação de emergência
Das
184 cidades cearenses, 178 estão em situação de emergência devido à
seca. Segundo o último balanço divulgado pela Companhia de Gestão dos
Recursos Hídricos (Cogerh), pelo menos 18 municípios do Estado podem ter
problemas de abastecimento de água até o fim de 2014.
São eles,
Acopiara, Alcântaras, Antonina do Norte, Beberibe, Canindé, Caridade,
Crateús, Fortim, Irauçuba, Itatira, Milhã, Nova Russas, Parambu,
Pindoretama, Potengi, Quiterianópolis, Salitre e Tauá. Entra na lista
também o distrito de Pecém, em São Gonçalo do Amarante. Seis municípios
não decretaram situação de emergência: Fortaleza, Eusébio, Horizonte,
Itaitinga, Pacatuba e Guaramiranga.
LÊDA GONÇALVESREPÓRTER
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