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segunda-feira, 16 de setembro de 2013

O segredo dos 35 botos

Com inteligência e capacidade de identificar objetos perigosos, animais que sobrevivem na Baía de Guanabara indicam um caminho para evitar a extinção da espécie no Estado

Wilson Aquino
O brasão da cidade do Rio de Janeiro, criado em 1896, tem como suporte dois botos-cinza. Naquela época, eles eram milhares e nadavam livremente por todos os 328 quilômetros quadrados da Baía de Guanabara, no Rio. Hoje, são apenas 35 bravos heróis que impressionam pela capacidade de resistência às condições adversas do ambiente, “cientificamente comprovado como o mais degradado de todos os usados como residência por essa espécie”, segundo o biofísico José Lailson Brito Júnior, da Uerj, Universidade do Rio de Janeiro.
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Desde 1995, o Departamento de Oceanografia da universidade mantém o Projeto Maqua, que estuda a população de botos por meio de foto-identificação das nadadeiras, que funcionam como uma espécie de impressão digital de cada indivíduo. Com idade entre 5 e 18 anos, os animais que restam na baía desenvolveram e adaptaram estratégias de sobrevivência. Uma delas é a ecolocalização. “Aperfeiçoaram-se tanto que são capazes de detectar com precisão até a textura dos objetos. Emitem sinais e captam o eco, que traz informações sobre o ambiente e as coisas ao redor”, afirma o oceanógrafo Alexandre Azevedo.
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A inteligência desse tipo de animal também colabora com a sua sobrevivência. “O supercérebro desse mamífero reconhece os locais, sabe onde estão os perigos e isso permite que sobreviva em ambiente impactado”, diz Brito Júnior, coordenador do Laboratório de Mamíferos Aquáticos e Bioindicadores da UERJ. Espertos, eles se refugiaram na área menos poluída da baía, os 20 quilômetros quadrados da Estação Ecológica (Esec) da Guanabara, um lugar de preservação sem lixo, óleo, redes de pesca e que não permite a entrada de seres humanos, a não ser para fins científicos.
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SOLIDÃO
Único mamífero nas águas da Baía de Guanabara,
o boto já teve a companhia de golfinhos e baleias
Porém, como não há nenhuma barreira que impeça a saída deles da reserva, de vez em quando algum boto curioso atravessa os limites e acaba não resistindo. Além dessas escapadas, os pesquisadores associam as mortes mais recentes à poluição sonora. “Cientificamente não está comprovado, mas há fortes indícios de que o excesso de barulho impede o golfinho de captar as redes dos pescadores”, diz Azevedo, salientando que a maior causa de mortalidade de golfinhos no mundo é a captura acidental. “Elegemos o boto-cinza entre as dez espécies mais ameaçadas de extinção do Estado do Rio justamente para reverter esse declínio populacional”, diz a bióloga Alba Simon, diretora de biodiversidade da Secretaria de Estado do Ambiente (SEA).
Medidas como essa tentam evitar que os botos tenham o mesmo fim de outros mamíferos. Golfinhos e baleias também se banhavam na Baía de Guanabara antes das ondas de poluição. Hoje, o boto-cinza é o único mamífero que consegue sobreviver ali. E não é por opção. Uma das características do animal é a fidelidade territorial, geralmente passando a vida toda no mesmo local onde nascem. Assim, só com um trabalho de despoluição a região poderia ter números como os da Baía de Sepetiba, onde até dois mil indivíduos da espécie se reproduzem. Que a exceção representada por esses 35 indivíduos vire a regra.
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