Em 1982, o oceanógrafo e documentarista Jacques Cousteau comandou uma expedição pela floresta. Passados 25 anos, seu filho Jean-Michel refez a viagem e se diz otimista com o que viu
Juliana Tiraboschi
Aos 7 anos de idade, o francês Jean-Michel
Cousteau, que hoje tem 75 anos, passou por uma experiência que
determinou os rumos de sua vida. “O meu pai me jogou na água com um
cilindro nas minhas costas. Assim, ele começou a me fazer entender que
mesmo a minha vizinhança estava conectada ao oceano”, diz. O pai de
Jean-Michel é o renomado explorador Jacques Cousteau (1910-1997),
oficial da marinha francesa e oceanógrafo, célebre por seus
documentários e inovações em equipamentos de mergulho. Inspirado pelo
pai, Jean-Michel também dedica a vida a estudar e a divulgar a
importância dos ambientes aquáticos. Entre 1981 e 1982, passou 20 meses
viajando pelo rio Amazonas em uma expedição de pesquisa liderada pelo
pai. Vinte e cinco anos depois, entre 2006 e 2007, o arquiteto e
explorador voltou à região e passou mais dez meses refazendo a viagem,
que passou também por partes do Equador e Peru.
Herança
O lendário explorador Jacques Cousteau é homenageado
em viagem do filho Jean-Michel (acima)
“Muitas pessoas que participaram da viagem
de 1982 estavam na segunda expedição. Foi incrível observar as reações
delas às diferenças encontradas”, disse Cousteau em entrevista à ISTOÉ.
Uma delas foi o crescimento populacional: durante esse período, a
população da região amazônica brasileira passou de cerca de 12 milhões
para 20 milhões de pessoas (leia quadro). Para o pesquisador, foi
assustador observar o impacto que esse contingente de moradores causou e
vem causando sobre a floresta. De acordo com as observações de
Jean-Michel, muitos dos migrantes são pessoas pobres, que vêm de favelas
do Rio de Janeiro e de outras cidades e vão para a Amazônia porque
encontram oportunidade e espaço para pescar, cultivar alguns alimentos,
cortar árvores, construir casas e sobreviver. “Não posso culpá-las por
isso, porque às vezes a vida é dura. Mas o que nos preocupa é que a
maioria não sabe nada sobre a floresta, não sabe que os níveis dos rios
variam conforme a estação e não conhece doenças como a malária”, diz.
Para combater a desinformação, Jean-Michel pretende desenvolver um projeto educacional e ambiental na região, nos moldes de outros programas de sua fundação, a Ocean Futures Society. Um deles já foi apresentado para estudantes no Guarujá pela organização, que conta com uma sede em São Paulo. “A maioria dos brasileiros não conhece a Amazônia, então tentamos educar as pessoas com informação, o que vai ajudá-las a tomar melhores decisões”, afirma.
Para combater a desinformação, Jean-Michel pretende desenvolver um projeto educacional e ambiental na região, nos moldes de outros programas de sua fundação, a Ocean Futures Society. Um deles já foi apresentado para estudantes no Guarujá pela organização, que conta com uma sede em São Paulo. “A maioria dos brasileiros não conhece a Amazônia, então tentamos educar as pessoas com informação, o que vai ajudá-las a tomar melhores decisões”, afirma.
Outro problema que chamou a atenção de
Jean-Michel foi o aumento do impacto da indústria petroleira nas águas
da região entre a década de 1980 e meados dos anos 2000. “Peixes estão
se contaminando com essa água, o que contagia os pássaros que se
alimentam deles e as onças que comem as aves.” Há tecnologias para
limpar essa água antes de descartá-la nos rios, mas a indústria não está
fazendo isso. Por outro lado, o explorador se diz otimista com as
políticas de combate ao desmatamento apresentadas pelo governo nos
últimos anos.
Além disso, Jean-Michel preocupa-se com
algumas soluções buscadas para aumentar a produção de energia no Brasil,
como a construção de hidrelétricas na região amazônica, a exemplo de
Belo Monte. “Acho que isso é um grande erro, pois vai inundar milhares
de quilômetros de terras e expulsar a população. A devastação vai ser
monumental, vai afetar a migração de peixes e as terras indígenas. Há
outras abordagens, outras formas de energias renováveis muito melhores”,
diz.
Jean-Michel está no Brasil nesta semana,
até o dia 16, para divulgar o livro “Retorno à Amazônia”, que está sendo
lançado em São Paulo neste sábado e no qual o explorador retrata em 300
páginas as duas expedições. Além disso, uma exposição com as fotos mais
marcantes da publicação será exibida em Manaus, de 16 a 19 de dezembro,
e em Búzios, de 12 de janeiro a 12 de março de 2014.
“A floresta deve ser vista como um negócio”
O documentarista Jean-Michel Cousteau diz que o desmatamento deixou de ser um problema crítico da Amazônia. Ele defende que a floresta seja explorada, mas com limitações.
ISTOÉ – O sr. observou degradação maior em 2006 do que em 1982. Como vê a situação agora?O documentarista Jean-Michel Cousteau diz que o desmatamento deixou de ser um problema crítico da Amazônia. Ele defende que a floresta seja explorada, mas com limitações.
Jean-Michel Cousteau – Eu estou mais otimista hoje. O desmatamento era um problema crítico em 2006, mas está sendo atendido com cada vez mais atenção pelo Brasil. Mais gente está preocupada com isso. A Amazônia deve ser vista como um negócio. Você não pode tirar mais do que a floresta oferece. Se corta uma árvore, tem que plantar outra no lugar. Mas não pode ser da espécie que dá mais lucro. É preciso respeitar a diversidade da floresta.
ISTOÉ – Quais foram as principais diferenças entre a expedição de 1982 e a de 2006?
Jean-Michel – Na segunda tínhamos um equipamento muito melhor e mais moderno. Em 1982, não tínhamos nenhum meio de comunicação na mata com o mundo exterior. Em 2006, podíamos contatar pessoas da equipe em Manaus. Além disso, na segunda vez, passamos muito mais tempo mergulhando, o que nos deu a chance de conhecer criaturas que nunca havíamos visto.
ISTOÉ – O sr. acompanhou os recentes protestos de povos indígenas?
Jean-Michel – Tento acompanhar. Gostaria que as autoridades prestassem mais atenção a essas pessoas e ao que elas podem nos ensinar. Os índios tiveram sucesso vivendo na floresta por milhares de anos, enquanto ignorávamos sua existência.
fotos: Carrier Vonderhaar; REX/TODAY
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