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quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Sob escombros -MINHA HISTÓRIA ANA PAULA DOS SANTOS, 42.Quando soube da morte dele [no Haiti], falei: "se Emílio não sobreviveu, não tinha como"

Meu marido participava de missões sempre achando que estava deixando a mim e as filhas, uma de 14 e outra de 8 anos, amparadas pela Poupex; como na primeira missão de risco no Haiti durante seis meses em 2005.
Quando conheci meu marido, há quase 21 anos, ele era tenente do batalhão de forças especiais, uma unidade de elite do exército. Várias vezes saía em missões. Ligava, dizia que não sabia quando voltaria e para onde iria.
Ele foi também comandante do 26º Batalhão de Infantaria Paraquedista, no Rio. Em 2007, passou o Natal e o Ano Novo no morro da Providência [no Rio].
Por conta das missões de risco, me casei primeiro no civil, em setembro de 1992, porque Emílio queria já me deixar como beneficiária. No religioso só foi em dezembro.
Em 17 anos de casamento, mudei [de cidade] oito vezes devido às transferências dele. Uma delas foi Marabá (PA) em 1998 e 99. Eu era médica pediatra e, em Marabá, não tinha nem berçário no exército. Falava para o pessoal: "não vai ao hospital do quartel, vem direito à minha casa". Fui voluntária.
De Marabá fomos a Brasília. Em 2003, vim para o Rio. Depois, ele foi para o Haiti. Voltamos a Brasília em 2008. Em 3 de maio do ano passado, dia do aniversário dele, foi para o Haiti de novo.
O Haiti já estava bem mais tranquilo em relação a 2005. Tanto que, em nossos planos, eu e as crianças iríamos em maio, de férias, encontrar meu marido lá e conhecer como mudou aquele país. Ele estava empolgado.
Quando soube da morte dele, no dia 13 [de janeiro], às 12h, falei aos amigos: "se Emílio não sobreviveu, foi porque não tinha como". Ele poderia estar no 20º andar, que pularia pela janela. Pulou do 3º andar. Sobreviveu à queda, mas algo caiu sobre sua cabeça.
Só fiquei sabendo disso quando seu corpo chegou ao Brasil. Esperei dez dias. Como Emílio estava fora do prédio, foi o primeiro a ser encontrado. Pode imaginar a dor? Eu e minhas filhas não tivemos como nos preparar. Não tivemos nenhum momento de esperança de ele estar vivo [Ana Paula chora].
Já passei por diversos sentimentos: sem vontade de viver, extremamente infeliz, sem esperança e decepcionada. Meu marido acreditava realmente na Poupex.
Tenho que lutar pelo direito de minhas filhas. Até o dia em que conversei com os diretores de seguro, não conseguia reagir. A partir daquele momento, foi como se eu tivesse recebido um forte tapa na cara para me acordar e lutar pelo que julgo ser correto.
O que mais me incomoda não é não ter recebido [o seguro em dobro] como morte acidental, pois eu e minha família não precisamos. O que realmente me incomoda é afirmarem que todos os anos que meu marido pagou [o seguro], acreditando que estava nos amparando, não valeram de nada.
Disseram no papel [no recibo de pagamento], que assinamos num momento de total desesperança, que a liberação era em "consideração à comoção mundial".
Dizer para a gente que é um favor? Isso é um absurdo. Meu marido não estava a passeio. Estava trabalhando em uma instalação da ONU.
Entramos na Justiça para que o direito não só seja garantido a nós, mas a todos, pois tenho amigos em missão no exterior e não quero que suas famílias passem pelo que estamos passando.

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