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quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Entenda a crise no Mali

País está dividido desde março de 2012, com norte dominado por islamitas.
França enviou tropas para ajudar governo a retomar território.

Do G1, com agências internacionais
Mais presente no noticiário internacional nos últimos dias devido ao aumento da intervenção francesa, o Mali vive uma crise interna desde março de 2012, quando militantes islâmicos tomaram conta do norte do país e o dividiram em dois.
A ofensiva desencadeou um golpe militar, que levou os rebeldes islâmicos a reforçarem sua intervenção, declarando independência unilateral do norte - o que fez com que o Ocidente temesse que a área se tornasse um santuário para extremistas.
A área tomada pelos rebeldes, classificada como estado de Azawad, e um pouco maior que a França em território, e compreende cerca de dois terços da área do país africano.
Desde o início da revolta, os rebeldes passaram a avançar cada vez mais em direção ao sul – no dia 14 de janeiro, eles estavam a cerca de 400 km da capital, Bamako.
Desde o início da crise – a maior desde 1960, quando a colônia se tornou independente da França –, o Mali já enviou quase 150 mil refugiados aos países vizinhos, segundo dados do Acnur, agência da ONU para os refugiados. Também há cerca de 230 mil deslocados internos, segundo o escritório de Assuntos Humanitários da ONU. Os refugiados estão na Mauritânia (54.100), em Níger (50 mil), em Burkina Faso (38.800) e na Argélia (1.500).
Mulheres protestam contra crise no Mali (Foto: Reuters)Mulheres protestam contra crise no Mali (Foto: Reuters)
No início de 2013, os grupos islamitas ligados à rede terrorista da Al-Qaeda levaram a França a entrar no conflito depois que eles avançaram de seu reduto, no norte do Mali, para regiões controladas pelo governo.
A França e seus aliados planejavam dedicar os primeiros meses de 2013 à reconstrução do Exército do Mali, decomposto pelo golpe, pois se acreditava que não haveria nenhuma ofensiva islamita antes de setembro.
Entretanto, a França fez uma repentina intervenção no dia 11 de janeiro, com a mobilização de soldados em Bamako, e fortes bombardeios nos dias seguintes em uma vasta área desértica dominada pela aliança islâmica.
mapa crise mali (Foto: Arte/G1)
O país justificou-se afirmando que a operação impediu que os rebeldes tomassem a capital – o pedido foi feito pelo presidente Dioncounda Traoré após os rebeldes terem tomado a cidade de Konna.
O presidente da França, François Hollande, disse que o objetivo do seu governo é apenas dar apoio a uma missão militar do bloco regional Ecowas para recuperar o norte do Mali, conforme prevê uma resolução de dezembro do Conselho de Segurança da ONU. No mesmo dia, o bloco regional autorizou a mobilização de tropas.
Além da França, Reino Unido e Canadá também se envolveram nos combates, enviando aviões cargueiros para o governo do Mali.
O governo francês está determinado a acabar com o domínio islâmico no norte da sua ex-colônia, devido aos temores de que essa região se torne uma base de lançamento para ataques contra o Ocidente e para uma coordenação com a Al Qaeda no Iêmen, Somália e norte da África.
A França pede um envolvimento mais rápido das forças da Comunidade Econômica dos Países do Oeste da África (Cedeao, siglas em francês). Por ora, alguns países como Burkina Faso, Nigéria e Senegal se comprometeram a contribuir com 500 soldados cada um.
Início
Os primeiros sinais de problemas começaram em janeiro de 2012, quando o grupo rebelde tuaregue Movimento Nacional para a Libertação de Azawad passou a utilizar armas em busca de mais autonomia para o norte do país. Na mesma época, houve um êxodo de refugiados, e a instabilidade na região aumentou.
Em março, o presidente Amado Toumani Touré foi deposto em um golpe de estado realizado por militares que contestavam suas ações em relação aos rebeldes tuaregues – Touré era considerado brando.
No dia 6 de abril, o Movimento Nacional para a Libertação de Azawad declarou a independência da região – o que não foi aceito pelo novo governo pós-golpe. Outros grupos rebeldes, incluindo radicais islâmicos ligados a Al-Qaeda, se juntaram ao movimento, controlando a região.
Dois dias depois, Touré renunciou, pressionado para tentar levar alguma estabilidade ao país. Ele esteve no poder pela primeira vez em 1991, quando derrubou o líder militar Moussa Traore em um golpe.
Após entregar o governo aos civis em 1992, Touré ficou conhecido como o “soldado da democracia”. Em 2002, ele venceu as eleições presidenciais, sendo reeleito em 2007. Na época do golpe, já estava há 10 anos no poder.
Líder do golpe
O capitão Amadou Haya Sanogo foi o chefe dos autores do em Bamako, capital do Mali, que no dia 22 de março derrubou Touré e precipitou a queda do norte nas mãos dos grupos islamitas armados, incluindo a Al-Qaeda no Magreb Islâmico (AQMI).
O capitão Amadou Sanogo fala à imprensa em campo militar de Kati, perto de Bamako (Foto: AFP)O capitão Amadou Sanogo fala à imprensa em
campo militar de Kati, perto de Bamako, em abril de
2012 (Foto: AFP)
O golpe se iniciou em um motim no acampamento militar de Kati, a cerca de dez quilômetros do Palácio Presidencial em Bamako. Sanogo foi um dos poucos que não fugiram do acampamento com o motim.
Em abril, o capitão se retirou do poder, mas permaneceu sendo influente em Bamako, onde seus homens são acusados de muitas violações de direitos humanos. Traoré assumiu o poder interinamente e continua como presidente do Mali até hoje.
Traoré era aliado do presidente deposto, que ficou mal visto no país após o golpe. Isso prejudicou a popularidade do novo presidente. Em maio de 2012, seu escritório foi atacado, e ele buscou tratamento de saúde na França. Quando os rebeldes islamitas fizeram uma nova ofensiva sobre Konna em 10 de janeiro de 2012, Traoré pediu ajuda ao antigo poder colonial, envolvendo a França no conflito.
Em agosto de 2012, o país anunciou a formação de um governo de união. O novo governo foi formado com 31 ministros, cinco deles considerados próximos a Sanogo.
Rebeldes tuaregues
Além do Movimento Nacional para a Libertação de Azawad, o Ansar Dine Islâmico também tem participação intensa na ocupação do norte. Ambos possuem objetivos diferentes, mas se juntaram na captura da cidade de Timbuktu.
O MNLA quer a independência para sua região, que chama de Azawad, que seria o território do povo nômade tuaregue. Azawad  também compreenderia parte da Argélia e de Níger, mas o movimento disse respeitar a autonomia territorial de outros países.
Com o controle do norte, o grupo divulgou uma nota afirmando que iria iniciar a “missão de defender o território de Azawad, para a felicidade de seu povo”.
Entre os membros do grupo estão tuaregues malineses que, durante a rebelião na Líbia, lutaram junto com as forças de Muammar Kadhafi, quando ele tentava se manter no poder.
Depois da queda e morte de Kadhafi, estes tuaregues voltaram para o Mali, bem treinados e carregando armamentos pesados.
Refugiados do Mali sentam debaixo de um caminhão no campo de refugiados 200 km a noroeste de Niamey, no Níger. (Foto: Issouf Sanogo/AFP)Refugiados do Mali sentam debaixo de um caminhão no campo de refugiados 200 km a noroeste de Niamey, no Níger, em maio de 2012 (Foto: Issouf Sanogo/AFP)
Já o Ansar Dine Islâmico é liderado pelo ex-líder tuaregue Iyad Ag Ghali e tem ligações com o braço da Al-Qaeda no norte da África, conhecido como a Al-Qaeda do Maghreb Islâmico.
O grupo diz não lutar pela independência, quer que a região norte do país continue sendo parte do Mali, mas quer introduzir a Sharia (lei islâmica) em todo o país, que é majoritariamente muçulmano.
Já o MNLA é secular e geralmente não se submete às formas mais radicais de islamismo.
Desenvolvimento
Em outubro de 2012, centenas de jihadistas do Sudão e do Saara Ocidental foram ao norte do Mali para lutar ao lado de islamitas armados, na perspectiva do envio para a região de uma força armada estrangeira.
A chegada de reforços ocorreu dois dias depois de uma reunião internacional em Bamako que expressou sua "solidariedade" com o Mali, pedindo-lhe para redobrar os esforços para facilitar o envio de uma força armada oriental-africana apoiada ONU para recuperar a área ocupada por grupos armados liderados pelo AQMI.
Em dezembro, o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou por unanimidade o envio de uma força internacional liderada por países africanos para ajudar o Mali a recuperar seu território.
A força africana, chamada Afisma, deve ter 3.300 soldados de países da África Ocidental, com apoio logístico, financeiro e de inteligência de países ocidentais. O plano original, no entanto, era de que essa força só estivesse instalada em setembro para dar tempo aos preparativos.
Reflexos na África
O conflito levanta uma série de riscos elevados para todo o continente, de uma violenta reação dos islamitas a um potencial desastre humanitário.
Os países do oeste africano devem enfrentar a dura realidade de que uma falta de resposta poderia conduzir a uma expansão da presença dos extremistas e de grupos criminosos capazes de criar maior caos, mas o uso da força militar também envolve riscos complexos.
Mulheres membros de uma milícia de autodefesa no Mali treinam tiro nesta sexta (20). (Foto: Emmanuel Braun/Reuters)Mulheres membros de uma milícia de autodefesa no Mali treinam tiro (Foto: Emmanuel Braun/Reuters)
Alguns países que participam da força prevista para ajudar o Mali a recuperar o controle no norte podem sofrer represálias de extremistas similares em seu próprio território, afirmam analistas.
Ao mesmo tempo, não está garantido que a operação tenha êxito. Ela pode provocar uma avalanche de mais refugiados em direção aos países vizinhos, que já lutam para atender às necessidades de sua própria população.
A posição da Argélia, que compartilha uma longa fronteira com o norte do Mali, desencadeou polêmicas.
Apesar de ser uma potência regional, a Argélia se negou categoricamente a enviar tropas e pediu um diálogo, embora não tenha se oposto à intervenção internacional e tenha autorizado os aviões de guerra franceses a utilizarem seu espaço aéreo.
Este país teve sua própria luta com o extremismo islâmico e foi o berço do AQMI.
Uma das tarefas mais difíceis pode surgir depois que os islamitas forem expulsos de seus bastiões, disse Gilles Yabi, diretor do projeto África Ocidental para o International Crisis Group (Grupo Internacional de Crise).
“O passo seguinte será assegurar que há tropas suficientes para fornecer segurança às diversas cidades que serão recuperadas. Até o momento não está claro se há tropas terrestres suficientes para este tipo de trabalho”, afirmou.
A força provavelmente continuará necessitando de ajuda ocidental, acrescentou.

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