Presidente narrou o que sofreu em cadeia de Minas Gerais em depoimento prestado em 2001 ao Conselho dos Direitos Humanos do Estado
AENo depoimento, divulgado no domingo pelo jornal Estado de Minas, Dilma narra uma série de torturas que sofreu quando esteve encarcerada em Juiz de Fora, em 1972. No relato, ela não soube precisar em qual unidade esteve presa no município da Zona da Mata mineira, sede da 4.ª Companhia da Polícia do Exército (PE).
O município que faz divisa com o Rio é o mesmo onde esteve preso o hoje ministro Fernando Pimentel (Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior), amigo de Dilma desde a época em que militavam no movimento estudantil.
Dilma confirmou ter passado por sessões no pau de arara, além de ter recebido choques e outras agressões que causaram até deformação. "Minha arcada girou para o lado, me causando problemas até hoje, problemas no osso do suporte do dente. Me deram um soco e o dente se deslocou e apodreceu", contou Dilma ao pesquisador Robson Sávio, em 2001, quando era secretária de Minas e Energia do Rio Grande do Sul. "Só mais tarde, quando voltei para São Paulo, o Albernaz (capitão Alberto Albernaz, do DOI-Codi de São Paulo) completou o serviço com um soco, arrancando o dente", relatou. Segundo o Estado de Minas, Dilma teria corrigido o problema ortodôntico antes de se candidatar à Presidência, em 2010.
"As marcas da tortura sou eu. Fazem parte de mim", disse. "O estresse é feroz, inimaginável. Descobri, pela primeira vez, que estava sozinha. Encarei a morte e a solidão. Lembro-me do medo quando minha pele tremeu. Tem um lado que marca a gente pelo resto da vida", declarou.
Bilhetes
Dilma já havia contado detalhes de torturas sofridas quando era detenta da ditadura militar em carceragens do Rio de Janeiro e São Paulo. Mas ainda não havia revelado os suplícios vividos nas celas de Minas, onde nasceu e atuou durante boa parte de sua militância contra o regime militar, com uma série de pseudônimos.
Foi sob um deles, Stela, que Dilma tentou trocar com outros presos bilhetes com o esboço do mapa da ex-Colônia Magalhães Pinto, feito a mão, onde estava preso o companheiro Ângelo Pezzuti, também do Colina. Os bilhetes levaram os agentes da ditadura a pensar que ela estava envolvida em planos de fuga, o que rendeu mais sessões de tortura à então estudante de 22 anos.
"Fui interrogada dentro da Operação Bandeirantes (Oban, em São Paulo) por policiais mineiros sobre processo na auditoria de Juiz de Fora e estavam muito interessados em saber meus contatos com Ângelo Pezzuti, que, segundo eles, já preso, mantinha comigo um conjunto de contatos para que eu viabilizasse sua fuga. Eu não tinha a menor ideia do que se tratava, pois tinha saído de BH no início de 69 e isso era no início de 70. Desconhecia as tentativas de fuga de Pezzuti, mas eles supuseram que se tratava de uma mentira. Talvez uma das coisas mais difíceis de você ser no interrogatório é inocente. Você não sabe nem do que se trata", contou.
Reação
O advogado Márcio Santiago, representante da seção mineira da Ordem dos Advogados do Brasil no Conedh, disse que deve sugerir o encaminhamento da documentação à Comissão da Verdade, formada para apurar os fatos relativos à atuação de agentes do governo e de grupos contrários à ditadura durante o regime de exceção. "Mas esse encaminhamento depende também de negociação entre o governo do Estado e a comissão."
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