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sexta-feira, 22 de junho de 2012

Filtros recursais: celeridade ou limitação da Justiça?

Sob o argumento de que grande parte dos recursos tem o mesmo fundamento para apreciação e caráter meramente protelatório, na última década o legislador tem criado uma série de filtros para impedir a subida de processos aos tribunais superiores. O uso destes mecanismos têm mostrado resultados positivos, do ponto de vista pragmático, no sentido de desafogar os tribunais. Por outro lado, os institutos que vem sendo criados têm tido a constitucionalidade questionada, segundo parte de operadores do Direito e doutrinadores ouvidos pelo caderno Justiça & Direito.
“Os processos estão diminuindo, mas qual é o outro lado desta moeda?” questiona o mestre em direito processual Flávio Quinaud Pedron. Para Pedron, os filtros recursais afrontam o principio constitucional do devido processo legal em suas três partes: isonomia, ampla defesa e contraditório, para ele entendido como a “liberdade argumentativa”. “Os juízes têm o dever de mostrar em suas fundamentações que cada argumento jurídico suscitado foi considerado”, afirma.
Filtragem
Veja os mecanismos que são ou poderão ser usados na tentativa de diminuir a quantidade de recurso para os tribunais superiores:
Repercussão geral
A repercussão geral é um instrumento que possibilita ao STF a seleção dos recursos extraordinários, que são analisados somente a partir de critérios como relevância jurídica, política, social ou econômica. O objetivo é diminuir o número de processos encaminhados à Suprema Corte.
Súmula vinculante
Mecanismo que impede juízes de instâncias inferiores de decidir de maneira diferente do STF nas questões nas quais já se tenha firmado entendimento definitivo.
Recurso repetitivo
Representa um grupo de recursos que possuem teses idênticas, com fundamento na mesma questão de direito. O presidente do tribunal de origem escolhe um ou mais recursos para representar a controvérsia, enquanto os demais têm o andamento suspenso até o julgamento definitivo da matéria.
PEC dos Recursos
A PEC 15/2011 transforma o recurso extraordinário e o recurso especial em ações rescisórias. Assim, as sentenças começariam a ser executadas depois de duas instâncias de decisão. O objetivo é evitar que recursos sejam usados como instrumentos para protelar decisões judiciais dos tribunais superiores.
Agravos “driblam” mecanismo
A manutenção da possibilidade de agravo, previsto no artigo 544 do Código de Processo Civil (CPC), com o objetivo de destrancar o recurso extraordinário ou recurso especial não conhecido pelo presidente do tribunal a quo, tornou-se uma espécie de “drible” ao uso dos filtros recursais.
Até o momento, não há mecanismo significativo para impedir ou limitar o seu livre ingresso, ainda que, em respeito à celeridade e também à praticidade, tenha sido editada a Lei 12.322/2010, que alterou o procedimento do antigo agravo de instrumento. Desde então, o agravo de instrumento passou a ser processado nos mesmos autos, sem a obrigação da formação de instrumento que dê origem a um novo processo.
Assim, a remessa de agravos para as instâncias superiores, ainda que processada nos mesmos autos do recurso extraordinário/especial, continua assoberbando de trabalho os julgadores das cortes superiores. O número de recursos diminuiu, mas o de agravos aumentou proporcionalmente.
Segundo o levantamento do Supremo Tribunal Federal (STF), os agravos de instrumento representam atualmente 50% de todos os processos em curso na corte. De acordo com o STF, somente 12% dos agravos de instrumento distribuídos, em 2010, tiveram o seu seguimento negado por falta de peças.
Para Flávio Quinaud Pe­­dron, mestre em Direito Processual, o novo modelo de agravo obedece a uma lógica processual que visa manter o pensamento da corte. “A diferença é que, salvo em caso excepcionais, os recursos têm de ser decidido em decisão colegiada e os agravos por um único ministro, que em geral mantém a decisão da corte”, afirma.
Pedron questiona também a forma com que são definidos os processos considerados paradigmas de julgamento em bloco dos recursos. “A escolha muitas vezes é feita pela ordem de chegada, aletoriamente ou em razão quantitativa, como valor da causa ou tamanho da pena, em detrimento da importância política ou a controvérsia jurídica. Cria-se a ideia de que existam situações mais ou menos importantes, que o seu direito é mais importante que o meu”, compara.
A favor do uso moderado dos filtros “dentro de uma responsabilidade que não afete a segurança jurídica”, o presidente da seccional do Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), José Lúcio Glomb, diz acreditar que o investimento em modernização do aparelho do Judiciário é uma demanda mais urgente e prioritária. “Acho que o Judiciário poderia ser mais ágil, mas sem colocar em risco uma das garantias fundamentais do cidadão e correr o risco de gerar danos irreparáveis”, diz.
Celeridade
Os filtros recursais partem do principio que, no mérito, tudo o que poderia servir como fundamento de convencimento dos ministros dos tribunais superiores já está exposto nos autos. A despeito das críticas, eles têm representado um avanço significativo no sentido de desafogar os tribunais superiores.
O uso de filtros como a súmula vinculante e a repercussão geral, de acordo com o último levantamento, feito pela Fundação Getúlio Vargas, mostrou que, entre os anos de 2007 e 2010, o número de processos caiu de mais de 110 mil, ao ano, para cerca de 30 mil. Apesar da queda, o número de processos ainda é considerado alto. A Suprema Corte Norte-Americana, por exemplo, recebe cerca de 7 mil processos por ano e julga aproximadamente 100.
Futuro
Para o advogado Gustavo Gomes, há uma tendência gradativa de que cada vez mais se faça mais filtragens de recursos. “Temos de acreditar no Judiciário, que, por sua vez, precisa honrar a grande responsabilidade que lhe é outorgada”.
Para Gomes, no entanto, a aprovação da PEC dos Recursos talvez “seja um passo maior que as pernas” “É melhor usar os mecanismos que já existem. Essa execução provisória pode gerar danos irreparáveis. Cabe ao juiz ter tempo e reponsabilidade para dar o mesmo tratamento para cada caso”, defende.

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