Operação de resgate mobiliza 11 aviões, 2 helicópteros e 4 navios
Além dos equipamentos de Brasil e França, Espanha emprestou duas aeronaves de patrulha
Vitor Hugo Brandalise, Andrei Netto e Ricardo Rodrigues
Aviões e embarcações do Brasil, França e Espanha foram mobilizados para auxiliar nas buscas pelo Airbus A330 da Air France, desaparecido na madrugada de ontem. No total, 11 aviões, dois helicópteros e quatro navios participam do resgate, na tentativa de cobrir uma distância estimada em 1.230 quilômetros de Oceano Atlântico, entre Natal (RN) e o início do espaço aéreo de Dacar, no Senegal. O Departamento de Defesa francês ainda solicitou ao Pentágono que colabore com imagens de satélite. Até a 0h30 de hoje, não havia sinal do Airbus em nenhuma das frentes de resgate. A Aeronáutica informou que as buscas continuarão durante a noite, por radar.
A Força Aérea Brasileira (FAB) destacou seis aviões e dois helicópteros, que sobrevoam o oceano desde as 2h30 de ontem. Durante o dia, os aviões da FAB - entre eles, um Bandeirulha P-95, especializado em patrulha marítima, com alcance de 2.700 km e radar de busca com 170 km de raio; e um Hércules C130, com alcance de 7.400 km, utilizado em 57 países - refizeram a rota que seria realizada pelo Airbus, nos dois sentidos. Nada foi encontrado.
Durante toda a noite, um avião R-99, equipado com radar e equipamentos infravermelhos que detectam calor, continuaria sobrevoando a região, em busca de frequências transmitidas pelo localizador de emergência (ELT) do Airbus. O Hércules C130, aeronave de grande autonomia, também passaria a noite sobrevoando o oceano.
A Força Aérea Francesa concentra as buscas no Golfo da Guiné, na costa africana - para isso, destacou um avião Atlântico 2, de reconhecimento a longa distância. Hoje, outras duas aeronaves, um Falcon e outro Atlântico 2, partem da base aérea de Dacar, e um navio que estava ancorado na costa da Guiné será enviado à região. Dois aviões espanhóis - um deles equipado com radares para detecção de movimento, utilizado na patrulha contra imigração ilegal pela costa africana - também participam das buscas, segundo o Ministério da Defesa da Espanha.
Durante os próximos dias, os aviões da FAB terão por base a Ilha de Fernando de Noronha (PE) e a cidade de Natal (RN), com coordenação do Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo (Cindacta-3) do Recife (PE). Cerca de cem homens participam da operação.
Além dos aviões destacados desde a madrugada de ontem, outras duas aeronaves - um Bandeirante SC-95 e um Amazonas SC-105 -, dois helicópteros - um Blackhawk H-60 e um Super Puma H-34 - e uma equipe de paraquedistas do Esquadrão Aeroterrestre de Salvamento (Parasar) participam das buscas.
A Marinha do Brasil participará da operação com o navio-patrulha Guarujá, que saiu de Natal (RN), a fragata Constituição, que parte de Salvador (BA), e a corveta Caboclo, que estava em Maceió (AL). Os navios, porém, devem chegar ao local somente a partir das 21h30 de hoje. Além das três embarcações destacadas, a Marinha contatou quatro navios comerciais que vão cruzar a área nos próximos dias. Outras duas embarcações - a fragata Bosísio e o navio-tanque Gastão Mota - estão de sobreaviso.
Falta de sinal de balizas intriga os técnicos
Andrei Netto
"Um indício de que um acidente abrupto aconteceu é o fato de que nenhum traço das balizas, equipamentos que emitem sinais captáveis mesmo em condições extremas, indicando a localização do aparelho, foi encontrado até aqui por nenhum dos 24 centros de controle do mundo ou pela rede de satélites em órbita na Terra", afirmou Philippe Hazane, diretor adjunto do Centro Nacional de Estudos Espaciais (CNES), com sede em Toulouse, no sul da França.
O responsável pelo CNES acrescentou que cada baliza tem o próprio sistema de alimentação elétrico, de forma autônoma em relação à aeronave. Além disso, esses equipamentos - criados no começo dos anos 80 num convênio Estados Unidos, Rússia, França e Canadá para ampliar a segurança aérea - podem ser acionados manualmente. Atualmente, o sistema se apoia en cinco satélites geoestacionários que cobrem todo o globo, sem deixar pontos cegos.
Já a Associação de Pilotos da França, entidade que reúne comandantes habituados a viajar entre a Europa e a América Latina considera improvável que o mau tempo tenha causado a queda. A possibilidade de que o avião tenha sido atingido por raios, que tivessem abalado a estabilidade, foi levantada no início da tarde, em Paris, pela companhia aérea e descartada pelos pilotos. "O avião é apenas um ponto de trânsito da descarga elétrica, que segue até o solo ou até outra nuvem", explicou Eric Derivry, porta-voz da Associação de Pilotos da França e comandante da Air France, ao Estado. "Mesmo que causem panes, há equipamentos em sequência que evitam a perda elétrica total."
Para Michel Legrand, piloto de um Airbus A330-200 da Air France e também integrante da associação de pilotos, só turbulências extremamente violentas, combinadas com a destruição parcial da aeronave por tempestades elétricas, podem derrubar um equipamento desse porte. "O A330 é o segundo mais recente projeto da Airbus e dispõe de todos os mecanismos mais modernos para resistir a isso."
Área é de abismos oceânicos
Roberto Godoy
A área onde o Airbus provavelmente caiu é de águas profundas, abismos oceânicos de até 7 mil metros. Essa lâmina d'água bloqueia os sinais emitidos pela caixa-preta e pelos sensores de emergência. Esses equipamentos são blindados, à prova de fogo e de choque. Resistiriam ao impacto da queda e às pressões encontradas a grandes profundidades.
Para resgatá-las nessas condições adversas, será preciso, no entanto, mobilizar sondas automáticas, pequenos robôs de mergulho do mesmo tipo utilizado pela Petrobrás para pesquisar as áreas do pré-sal.
Segundo a Diving Engineering, empresa americana especializada em mergulho crítico de risco, a operação exigiria o apoio de um submarino militar para captar os sinais de localização e definir as coordenadas que seriam então seguidas pelos veículos robóticos, lançados e controlados a partir de navios de superfície. "Todavia, penso que isso terá de ser feito com muita pressa, antes que as baterias da caixa-preta se esgotem"", afirma o especialista da Diving, Calucho Rorce.
Apesar da moderna tecnologia aeronáutica, sobram dúvidas
Falta de alarme dos pilotos chama a atenção e especialistas acreditam em algo repentino, como uma explosão
Bruno Tavares, Eduardo Reina e Marcelo Godoy
A hipótese de uma violenta descompressão da cabine do avião, seguida de uma pane elétrica, é a primeira pista que os investigadores do acidente dispõem. É muito pouco em comparação com outros desastres aéreos, como os do A320 da TAM, em Congonhas. As dúvidas nesse caso são muito superiores. Panes elétricas e descompressão da cabine por si só não derrubam um avião como o Airbus 330 da Air France.
Sabe-se ainda que o A330-200 passava por uma área bastante conhecida pelos pilotos como de instabilidade climática. Não é impossível investigar um acidente em alto mar, mas esse tipo de trabalho requer investimentos altíssimos e tempo, sem que se tenha certeza de que um dia se chegará às causas da tragédia. A seguir, especialistas ouvidos pelo Estado comentam as principais dúvidas surgidas com o acidente.
1. Um raio pode partir um avião? Ele não tem para-raio ou neutralizador de raios?
É praticamente impossível um raio derrubar um avião. Os jatos comerciais têm equipamentos que os protegem contra descargas elétricas, tornando o avião uma espécie de gaiola de faraday - uma blindagem elétrica que impede a entrada de perturbações produzidas por campos elétricos e ou eletromagnéticos externos. A proteção, dependendo da aeronave, não é total, podendo causar danos e até mesmo furos na fuselagem. Os engenheiros de aeronaves também realizam testes com a carcaça dos aviões e verificam que material suporta e distribui melhor um raio. Quando um raio atinge uma aeronave no ar ou no solo, o perigo é pequeno para os passageiros. O chamado "nariz" do avião é o ponto mais vulnerável. É aquela parte preta no bico, onde está o radar. Quando o raio atinge esse ponto, o radar queima e pode inutilizar alguns equipamentos. Até mesmo um buraco é aberto. Mas não leva perigo. Em cada uma das extremidade das asas e no leme existem quatro pequenas antenas que servem para esvaziar a energia estática armazenada no avião durante o voo.
2. Acidentes aéreos provocados por raios são comuns?
Acidentes aéreos que envolvem raios são raros. Mas há risco de explosões quando o raio entra em contato com o vapor do combustível. Essa teria sido uma das causas possíveis do acidente que derrubou o Boeing 707 da Air France em 22 de maio de 1962, em Guadalupe, no Caribe, durante uma tempestade. Estatísticas mostram que cerca de 7 mil aviões são atingidos por raios anualmente. Quando uma descarga atinge uma aeronave, a eletricidade é distribuída pela fuselagem do aparelho e posta de volta no ar. Já se o avião está pousado e há uma forte tempestade elétrica em andamento, os passageiros são orientados a permanecer dentro do avião e evitar andar na pista.
3. Tempestade derruba avião?
Sim. É raro, mas pode acontecer. A aeronave tem condições de suportar tempestades fortes. Há equipamentos que avisam a proximidade de nuvens carregadas - cumulus ninbus -, o que leva o piloto a mudar a rota a ser seguida.
4. Turbulência derruba avião?
Pode acontecer, mas é difícil. Sozinha, ela não seria suficiente para derrubar aviões modernos de grande porte, como o avião da Air France. Turbulências podem ser classificadas em quatro grandes grupos: turbulência em baixa altitude - Low Level Turbulence (LLT); turbulência dentro e próxima a trovoadas - Turbulence in and Near Thunderstorms (TNT); turbulência de céu claro - Clear-Air Turbulence (CAT); turbulência de montanha - Mountain Wave Turbulence (MWT). Dentro dessas categorias existem ainda vários outros tipos de turbulência. De todas essas, a CAT pode não ser identificada por radar. Na história da aeronáutica comercial, turbulências causaram a queda de um MacDonnell Douglas (MD) da companhia aérea Austral (74 pessoas a bordo) em 1997, de um Boeing 707 perto do Monte Fuji, no Japão em 1966 (124 mortos), e de um Fokker na Holanda em 1981 (17 mortos).
5. É possível em condições adversas pousar no mar?
Sim. Mesmo que a aeronave fique sem energia elétrica, há uma espécie de bateria que permite ao piloto mais 30 minutos de navegabilidade até encontrar um local seguro ou mais apropriado para pousar, mesmo que seja um pouso de emergência. No caso do A330-200, o avião conta com gerador em uma pequena turbina externa que é capaz de manter os equipamentos essenciais em funcionamento mesmo com a falha dos demais fontes de energia elétrica do avião.
6. É possível resgatar um avião no mar?
Sim. Mesmo quando o avião se parte, é possível resgatar os destroços em alto mar quando as partes do avião se espalham por quilômetros. Isso ocorreu no caso do Boieng 747 da TWA que explodiu no litotal de Nova York, em 17 de julho de 1996 (230 mortos) e no do MD-11 da Swissair que caiu no litoral do Canadá em 2 de setembro de 1998, matando 229 pessoas. As investigações dos acidentes duraram cerca de quatro anos e consumiram dezenas de milhões de dólares. As aeronaves foram reconstruídas - 98% do MD-11 foi resgatado do mar. Em ambos os casos, curto-circuitos teriam iniciado um incêndio e uma explosão.
7. A caixa-preta pode ser recuperada?
Pode. Uma das grandes dificuldades em acidentes aéreos é localizar a caixa-preta. Ela é composta de duas partes, do tamanho aproximado de uma caixa de sapatos. Pode aguentar impacto de 2,25 toneladas e temperaturas superiores a 1.000°C. Quando submersa, resiste a profundidades de até 20 mil pés - cerca de 6,3 quilômetros. Tem um gravador de dados do voo para 25 horas. A outra parte, um gravador de voz, guarda os últimos 30 minutos de conversas na cabine de comando.
8. Existe uma espécie de GPS no avião que emite sinais de sua localização?
Sim, os aviões modernos são equipados com um sistema conhecido como ELT. Instalados dentro da caixa-preta das aeronaves, eles emitem sinais de alerta em caso de colisão e são capazes de suportar fogo intenso ou pressão em águas profundas. O problema é que esse dispositivo pode ter sido danificado numa eventual explosão ou caso o avião tenha se desintegrado na queda - o que ocorreu com o Boeing 737-800 da Gol, em setembro de 2006, no Brasil, quando 154 pessoas morreram.
9. O avião não deveria estar acima das nuvens, da tempestade e de tudo o que pudesse interferir num voo normal?
Normalmente, mas na área em que houve o acidente com o A330-200, os cumulus nimbus podem chegar a grandes altitudes, ultrapassando 20 mil metros, diferentemente do que ocorre na Europa, por exemplo. Pilotos experientes, como o do A330-200 da Air France, que tinha 11 mil horas de voo, conhecem bem essa região do Oceano Atlântico.
10. O piloto não tem como prever a instabilidade do caminho e refazer a rota?
Sim. Radares meteorológicos informam a tripulação sobre as condições de tempo com um mínimo de seis minutos de antecedência. Eles trabalham independentes do sistema de controle de voo. É um instrumento à disposição do piloto, que deve manejá-lo como bem entender. Diante de nuvens carregadas de energia e gelo, basta virar à direita ou à esquerda.
11. Por que o piloto não conseguiu emitir alerta para o centro de controle de voo?
Não se sabe. Por isso, especialistas acreditam que o problema que derrubou o A330-200 foi repentino e severo como uma explosão. O comunicado automático emitido pelo sistema de segurança do Airbus da Air France mostrou que havia uma pane elétrico e despressurização da cabine. Especialistas em aeronáutica estimam que esse pane pode ter desligado todo o sistema elétrico do avião, o que não permitiu novas comunicações. Essa pane poderia ter sido provocada por fatores climáticos - turbulência, raios, tempestade -, que podem ter danificado o que se chama da "baia eletrônica", um compartimento com 54 computadores que administram todos os sistemas do jato, localizado na "barriga" do avião, na parte frontal.
12. Pode ter havido despressurização da aeronave? O que é despressurização?
Pode. Isso, aliás, foi informado pela mensagem eletrônica do próprio avião. O problema é saber o que causou essa repentina despressurização. Despressurização é a perda da pressão interna da aeronave quando esta voa em grandes altitudes, onde o ar é rarefeito. Dois tipos de despressurização podem ter acontecido no acidente com o voo 477 da Air France. Despressurização programada ou explosiva. A mais provável é que tenha ocorrido a do tipo explosiva, que deixa pouco tempo de reação. De acordo com pilotos, ao perder todos os instrumentos de voo e com despressurização explosiva, o avião pode começar a se desfazer em pedaços. Nesse caso, os passageiros e os tripulantes perdem a consciência rapidamente.
13. Em que situações o avião emite sinais automáticos? Há algum tipo de equipamento que ajuda a localizar aviões acidentados? O avião da Air France tem um desse tipo?
Trata-se do ELT (Transmissor Localizador de Emergência), que entra em funcionamento quando uma aeronave cai. No caso da Air France, o ELT pode estar submerso, junto com a caixa-preta, a até 7 mil metros de profundidade.
14. A experiência do piloto ajuda ou atrapalha em situações adversas no voo?
Com certeza, quanto maior a experiência, melhor e mais rápida é a capacidade do piloto. Em janeiro, o comandante Chesley "Sully" Sullenberger, de 57 anos, foi forçado a realizar um pouso de emergência de um Airbus A320 com 150 passageiros no Rio Hudson, em Nova York (EUA), depois de ser atingido em uma das turbinas por uma ave.
15.Pode ter havido um atentado terrorista para derrubar o avião?
Um dos principais jornais franceses, Le Figaro, levantou essa hipótese ontem, ao entrevistar pilotos da Air France. Autoridades brasileiras, no entanto, consideram essa alternativa improvável, já que um atentado no meio do oceano não teria o impacto na mídia que um atentado tem como objetivo. Mas não seria novidade uma explosão de bomba dentro avião em pleno voo. Foi isso que ocorreu em 21 de dezembro de 1988 com um Boeing 747 da Pan An na cidade escocesa de Lockerbie, matando 270 pessoas.
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