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domingo, 26 de julho de 2009

O inquérito que ameaça Sarney

Um inquérito de três volumes da Polícia Federal ao qual ISTOÉ teve acesso na última semana pode ser decisivo para o destino do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). O relatório de 157 páginas elaborado pelo setor de inteligência da Divisão de Repressão a Crimes Financeiros condensa toda a investigação da chamada Operação Boi Barrica, um conjunto formado por gravações de 150 horas de conversas telefônicas, mensagens eletrônicas interceptadas e declarações de renda recolhidas pela Receita Federal por dezenas de pessoas físicas e jurídicas.
O alvo principal do inquérito é o empresário Fernando Sarney, único filho do presidente do Senado que não se submeteu às urna, mas é responsável pelos negócios da família. No documento, Fernando é tratado como membro de "primeiro escalão" de uma "organização criminosa", auxiliado por Astrogildo Quental, diretor financeiro da Eletrobrás, e Silas Rondeau, ex-ministro de Minas e Energia, ambos ligados politicamente ao senador José Sarney.
As conversas gravadas pela PF mostram que a atuação de Fernando Sarney nos bastidores do ministério e de estatais não se limita à prática de nepotismo. "além de sonegação fiscal e lavagem de dinheiro, temos convicção de que houve tráfico de influência de forma a colocar o que é público a serviço do privado", diz um dos delegados que participaram das investigações. O ponto de partida do inquérito foi a criação da empresa São Luis Factoring e Fomento Mercantil, uma empresa sem funcionários que funciona na sede do Grupo Mirante, a holding de empresas de comunicação da família Sarney, em São Luís (MA). Entre 2002 e 2006, a São Luis Factoring declarou receita bruta de R$ 1,7 milhão. Mas no mesmo período teve movimentação financeira 24 vezes maior, de R$ 41,6 milhões, segundo análise da Receita Federal. Diante da possibilidade do crime de sonegação fiscal, a Justiça Federal autorizou a abertura do sigilo fiscal, bancário e telefônico da empresa e de seus proprietários. Na Justiça, os advogados de Fernando afirmam que não há crime em abrir uma factoring para resolver os problemas financeiros do próprio grupo. Mas, em conversas telefônicas interceptadas em janeiro de 2008, a mulher do empresário, Teresa Cristina Murad Sarney, sócia da factoring, menciona a um interlocutor "aquele dinheiro que a gente sacava na época da campanha". O relatório mostra que a PF descobriu movimentações de R$ 2 milhões que fariam parte de um suposto caixa 2 utilizado na campanha derrotada de Roseana Sarney rumo ao governo do Maranhão em 2006.
Em um pente-fino nas contas da Televisão Mirante e da Gráfica Escolar, a PF descobriu que estas empresas declararam, em cinco anos, R$ 25 milhões em "despesas financeiras", ou seja, a rubrica onde são lançados pagamentos a título de comissão ou deságio pela utilização do serviço de factoring. A polícia diz que a factoring fez movimentações para a família. Ana Clara Murad Sarney, filha de Fernando Sarney, chegou a mandar um e-mail para a mãe com um pedido de movimentação de US$ 1 milhão no Exterior. "Ana Clara participa ativamente das atividades ilícitas da família", registrou a PF no documento.A Lupama Comércio, que pertence a Gianfranco Perasso e Flávio Lima, colegas de faculdade de Fernando, não tem, segundo o relatório da PF, capital social nem sede, mas ficou responsável por um contrato de R$ 250 milhões. A PF monitorou encontro de Gianfranco em Brasília com Silas Rondeau e com Ulisses Assad, diretor da Valec. Silas seria sócio de empresas que operam o esquema, como a PRX Engenharia, segundo documentos obtidos pela PF.
Os agentes interceptaram e-mail que Silas recebeu do vice-presidente da Engevix Engenharia, José Antunes Sobrinho, negociando preenchimento de contratos no setor elétrico. "O grupo pode estar se utilizando de sua influência no meio para obtenção de vantagens", diz o documento da PF. "Sobretudo com a participação de exploração no setor mediante a utilização de pequenas centrais hidrelétricas." O grupo ligado a Fernando também fechou contrato para venda de ações da Energética Corumbá III, tendo como cliente final a Eletronorte. É quando aparece o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, velho aliado da família Sarney. A PF monitorou ligação em que os interlocutores falam em "pressionar" o ministro Lobão para receber o Citibank em audiência. Nos diálogos com Astrogildo, Fernando fala sobre indicações para postos na Eletrobrás."Vou ver se eu consigo com o Lobão, em Brasília, semana que vem", diz ele, sobre uma suposta reivindicação do grupo no Ministério de Minas e Energia.
Foi nesse pacote de 150 horas de gravações que a PF registrou o caso de nepotismo no Senado, divulgado pelo jornal "O Estado de S. Paulo" na última semana. O episódio relaciona diretamente o presidente do Senado aos atos secretos.
Uma sequência de seis diálogos entre 30 de março e 2 de abril de 2008 mostra a facilidade de Fernando para nomear, no Senado, Henrique Dias Bernardes, namorado de sua filha Maria Beatriz.
Na primeira conversa, Beatriz pede ao pai para empregar o namorado na vaga do irmão, que estava deixando o cargo. Fernando diz que não haverá problema e pede à filha para conversar como o ex-diretor do Senado, Agaciel Maia. No último diálogo, Fernando fala com o senador Sarney. Depois de pedir a benção, diz que a nomeação de Henrique já fora acertada como Agaciel e que bastaria o senador falar com o diretor da Casa para finalizar o caso. Sarney responde: "Tá bom. Vou falar com ele". Henrique trabalha meio período na diretoria do Centro Médico do Senado e recebe R$ 2,7 mil por mês.
"Obrigado, papai"Diálogos interceptados pela Polícia Federal mostram a influência de Fernando Sarney em todas as esferas do poder
Senado 31 de março de 2008 Bia (neta de Sarney) fala com o pai sobre a indicação do namorado para um cargo no Senado.
Fernando Sarney: Eu vou falar com o papai ou eu mesmo com o Garibaldi amanhã aí em Brasília, porque é o único jeito de resolver. Bia: Tá bom. FS: E, se for o caso, pra ele já levar tudo do Henrique e já dizer: 'Ó, a pessoa que o Fernando quer botar é essa aqui.'
2 de abril de 2008 O senador José Sarney conversa com o filho Fernando sobre o emprego do namorada da neta Sarney: Alô. FS: Benção, pai.
Sarney: Deus lhe abençoe. Olha, você não tinha me falado o negócio da Bia... FS: Não, não, ela falou comigo sextafeira... Eu falei com o Agaciel. Sarney: Já falou com o Agaciel? FS: Eu falei, falei. Sarney: Tá bom. Eu vou falar com ele... Ontem, foi assinado o negócio da TV de Estreito, a repetidora. FS: Foi? Sarney: É. FS: Beleza, ótimo. Isso é uma boa notícia. Sarney: Tá bom. FS: Ótima notícia, tá, paizão, obrigado.
Banco do Brasil 26 de março de 2008 Fernando Sarney conversa com exsenador Maguito Vilela, à época vice-presidente do Banco do Brasil, indicado pelo PMDB. Maguito Vilela: Eu precisava falar com você na quarta-feira.
FS: Eu lhe prometo o seguinte... Você está no Banco do Brasil, né? MV: Tenho estado muito com o seu pai. FS: Amanhã, eu vou passar em Brasília. Seu eu conseguir passar cedo, eu lhe aviso e a gente já conversa.
Superior Tribunal de Justiça 28 de março de 2008 As conexões de Fernando Sarney também se estendem aos tribunais. Ele conversa com o pai sobre o andamento de um processo. Sarney: Olha, o processo foi distribuído, o novo, para o Galotti. FS: Certo. Sarney: Se puder falar com o seu amigo pra dar uma palavrinha... tá? FS: OK, pra fazer a mesma coisa. Sarney: O que foi feito lá no STJ.
Os CDs que vazaram na Justiça Federal do Maranhão ainda poderão trazer muitas novidades. Candidato ao governo do Rio Grande do Sul pelo PT, o ministro da Justiça, Tarso Genro, diz que o vazamento de informações sob segredo de Justiça é "natural". Uma das poucas pessoas que saíram em defesa de Sarney foi o presidente Lula, que de novo pediu cuidado com a biografia do acusado. Sarney é hoje um dos principais pilares da frágil base de sustentação do governo no Senado, que se ruir pode comprometer o sonho do PT de eleger a ministra Dilma Rousseff à Presidência em 2010. O filho mais velho de Sarney não tem voto. No entanto, sua maneira de agir o coloca como o 82º senador do Brasil. Não por ter apresentado projetos de lei, mas pela capacidade de usar a influência da família para se envolver em práticas que a sociedade repudia.Obrigado, papai"Diálogos interceptados pela Polícia Federal mostram a influência de Fernando Sarney em todas as esferas do poder
Senado 31 de março de 2008 Bia (neta de Sarney) fala com o pai sobre a indicação do namorado para um cargo no Senado.
Fernando Sarney: Eu vou falar com o papai ou eu mesmo com o Garibaldi amanhã aí em Brasília, porque é o único jeito de resolver. Bia: Tá bom. FS: E, se for o caso, pra ele já levar tudo do Henrique e já dizer: 'Ó, a pessoa que o Fernando quer botar é essa aqui.'
2 de abril de 2008 O senador José Sarney conversa com o filho Fernando sobre o emprego do namorada da neta Sarney: Alô. FS: Benção, pai.
Sarney: Deus lhe abençoe. Olha, você não tinha me falado o negócio da Bia... FS: Não, não, ela falou comigo sextafeira... Eu falei com o Agaciel. Sarney: Já falou com o Agaciel? FS: Eu falei, falei. Sarney: Tá bom. Eu vou falar com ele... Ontem, foi assinado o negócio da TV de Estreito, a repetidora. FS: Foi? Sarney: É. FS: Beleza, ótimo. Isso é uma boa notícia. Sarney: Tá bom. FS: Ótima notícia, tá, paizão, obrigado.
Banco do Brasil 26 de março de 2008 Fernando Sarney conversa com exsenador Maguito Vilela, à época vice-presidente do Banco do Brasil, indicado pelo PMDB. Maguito Vilela: Eu precisava falar com você na quarta-feira.
FS: Eu lhe prometo o seguinte... Você está no Banco do Brasil, né? MV: Tenho estado muito com o seu pai. FS: Amanhã, eu vou passar em Brasília. Seu eu conseguir passar cedo, eu lhe aviso e a gente já conversa.
Superior Tribunal de Justiça 28 de março de 2008 As conexões de Fernando Sarney também se estendem aos tribunais. Ele conversa com o pai sobre o andamento de um processo. Sarney: Olha, o processo foi distribuído, o novo, para o Galotti. FS: Certo. Sarney: Se puder falar com o seu amigo pra dar uma palavrinha... tá? FS: OK, pra fazer a mesma coisa. Sarney: O que foi feito lá no STJ.

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