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domingo, 27 de maio de 2012

A derrota do atraso

Ao sofrer dois reveses, a aprovação da lei do Trabalho Escravo e os vetos de Dilma Rousseff ao Código Florestal, a bancada ruralista se vê acuada e perde força política

Izabelle Torres
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PLANO B
Com a aprovacão da PEC do Trabalho Escravo, os ruralistas
agora tentam remediar as perdas elaborando um novo projeto
Nos últimos anos, a bancada ruralista agiu como um trator no Congresso e conseguiu impor sua força na pauta de votações e nos textos de projetos de seu interesse. Formado por 120 deputados, 16 senadores e mais de uma dezena de simpatizantes, o grupo de defensores do agronegócio ditou as regras, argumentando que é responsável pela produção de alimentos do País e banca mais de 22% do PIB brasileiro. A influência foi ampliada graças aos repasses das empresas do setor para financiamento de campanhas eleitorais. Diante de um cenário tão favorável, a bancada acumulou vitórias contundentes, atropelando a ala ambientalista e a onda verde que toma conta de todos os países. Mas tudo começou a mudar na última semana, quando os ruralistas sofreram duas dolorosas derrotas em embates que já consideravam ganhos. Apesar do esforço para obstruir a votação, não conseguiram evitar a aprovação da PEC do Trabalho Escravo, que prevê a desapropriação de terras onde forem encontrados trabalhadores em condições precárias. E, na sexta-feira 25, tiveram de engolir os vetos da presidenta Dilma Rousseff ao novo Código Florestal, que havia sido aprovado de acordo com seus desejos.

Foi justamente durante a votação da PEC do Trabalho Escravo, na terça-feira 22, que a maré começou a mudar para os ruralistas. Depois de impor o adiamento das discussões por oito anos, a bancada se viu acuada pela ofensiva do governo e pressão de entidades não governamentais que defendiam a proposta. Para não se desgastar votando contra o projeto, os parlamentares tentaram no primeiro momento esvaziar a sessão da Câmara que discutia a matéria, numa tentativa de evitar quórum. Não adiantou. Apenas o núcleo linha dura do agronegócio se ausentou, enquanto os mais moderados faziam coro por mais um acordo para adiar a votação, sob o argumento de que o texto não deixava claro o que seria considerado trabalho escravo. Segundo os parlamentares, a falta de definição poderia permitir que fiscais abusassem da autoridade ou cobrassem propinas. Os argumentos foram derrotados e agora a bancada tenta remediar as perdas elaborando um projeto complementar para tentar redefinir o conceito. “Não somos contra a matéria. Nosso temor é de que qualquer autoridade possa interpretar de forma distorcida o cenário e punir um agricultor indevidamente. Era contra isso que estávamos protestando”, diz Moreira Mendes (PMDB-RO), que preside a Frente Parlamentar da Agropecuária.
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TRIUNFO VERDE
A ministra Izabella Teixeira, do Meio Ambiente,
anuncia 32 alterações no texto do Código Florestal
A derrota dos ruralistas foi uma surpresa até para quem acreditava no apoio de última hora à PEC do Trabalho Escravo. “Foi a vitória sobre o setor retrógrado, que defende a qualquer custo o direito da propriedade. Essa foi nossa primeira vitória contra o núcleo duro do ruralismo”, comemorou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP), logo depois que o placar mostrou 360 votos a favor da proposta e 29 contra. A bancada do agronegócio também viu seus planos ruir com a publicação dos vetos do Código Florestal, cuidadosamente elaborados pela presidenta Dilma e a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira.

Depois de impor mais de 30 modificações ao texto negociado pelo governo, os ruralistas conseguiram aprovar o projeto na Câmara concedendo diversas regalias ao setor, como a anistia a desmatadores e a liberação da obrigatoriedade de recuperar áreas de preservação. Mas esbarraram na caneta presidencial e na pouca disposição do Planalto de permitir que a força das motosserras se sobreponha à preocupação ambiental. Dilma decidiu vetar trechos da proposta aprovada pelo Congresso e editou uma medida provisória regulamentando os pontos vetados. Na MP explica-se como vai funcionar a regra de recuperação das Áreas de Preservação Permanente (APPs). Em vez de liberar propriedades de até quatro módulos, foi criada uma regra gradativa para que todos sejam obrigados a replantar nas margens de rios e lagos. A presidenta também cancelou a anistia de multas para quem desmatou. O texto aprovado pelo Congresso beneficiava pelo menos 30 políticos e grandes doadores eleitorais.

A diminuição do poder da bancada do agronegócio começou a abalar a confiança do grupo, sempre disposto a jogar duro para defender os próprios interesses. Agora, o foco dos defensores do agronegócio está em outros dois projetos que tramitam no Legislativo e podem facilitar a vida dos grandes produtores. Os ruralistas querem garantir a possibilidade de venda de terras a estrangeiros, o que inclui a anistia para quem já comercializou terrenos. Simultaneamente, avançam na tentativa de garantir ao Congresso o poder de decidir, sem a influência do Executivo, a demarcação de terras indígenas. Os parlamentares do agronegócio já davam como certa a vitória e a aprovação dos dois projetos. Mas, daqui para a frente, vão baixar o tom. Os ruralistas já não têm terreno fértil no Congresso.
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